David Goodall tinha 104 anos, quatro filhos e 12 netos. O australiano — apesar de ter nascido em Londres — durante toda a sua vida dedicou-se à ciência: foi botânico e ecologista. No início desde mês viajou para a Suíça desde Perth, na Austrália, com o objetivo de se submeter ao procedimento de morte medicamente assistida. Ao fim de um século e quatro anos, Goodall considerou que a sua vida já não merecia ser vivida e esperava que a sua história pudesse levar à legalização da eutanásia noutros países. O cientista recorreu à clínica ‘Life Circle’, em Basileia, onde acabou por morrer esta quinta-feira, um desejo que já tinha há algum tempo.
Numa entrevista à CNN, Goodall confessou que a sua vida deixara de ser agradável “há cinco ou 10 anos”, em parte devido aos problemas de mobilidade e de visão. Goodall passou grande parte da vida no campo e dizia que gostava de ainda ser capaz de o fazer: “Eu adorava ter capacidade de ainda ir para o mato outra vez e ver tudo que está à minha volta”, contava.
Com a minha idade, levanto-me e tomo o pequeno almoço. Depois fico sentado até à hora do almoço. A seguir, almoço e e sento-me de novo. Qual é a utilidade disto?”, lamentava.
A eutanásia é ilegal na Austrália, embora o estado de Vitória tenha planos para a legalizar em 2019. Já a Austrália Ocidental, o estado onde o cientista vivia, encontra-se atualmente a debater o assunto.
Há algumas semanas, Goddall tentou suicidar-se. Acordou no hospital e os médicos mantiveram-no internado, considerando que ele era um risco para si mesmo. Só depois de um relatório psiquiátrico independente pedido pela filha é que a sua saída foi permitida. A propósito deste episódio, Goddall disse que “obrigar alguém a permanecer vivo, mesmo quando já não há nada para viver” é “cruel”.
O cientista era membro da ‘Exit Internationl’, uma instituição que pretende informar e dar orientação a quem pretende submeter-se à eutanásia e esperava que a divulgação do seu caso pudesse levar a mudanças noutros países.
Eu gostava que outros países seguissem a Suíça e disponibilizassem estes recursos a todas as pessoas, desde que cumpram todos os requisitos; não só a idade, mas também capacidade psíquica.”
Também o fundador da instituição, Philip Nitschke, considera, citado pela CNN, que “qualquer adulto devia poder aceder aos fármacos que lhe permitissem morrer pacificamente” e diz que a possibilidade de viajar até à Suíça está aberta a qualquer um, desde que tenha um bom motivo e preencha os critérios necessários.
Goddall foi professor em vários países, como o Reino Unido, Estados Unidos e Austrália. Em 2016 foi condecorado com a Medalha de Ordem da Austrália. A poucos dias de morrer, o homem de 104 anos deixou um conselho às gerações mais novas: “Agarrem todas as oportunidades, desde que isso não cause danos noutras pessoas”.
Esta quinta-feira, os médicos introduziram uma agulha intravenosa com Pentobarbital no braço de Goddall e depois o cientista auto-administrou o fármaco. Dizia que não tinha medo da morte e que lhe daria “as boas-vindas quando ela chegar”.