Ainda não precisou de ir ao supermercado, mas um amigo já lhe trouxe uma lembrança de Portugal: um bacalhau. O problema foi encontrar alguém que soubesse cozinhá-lo. Jorge Jesus encontra-se agora no centro de estágios na Áustria, mas já se instalou na Arábia Saudita para treinar o Al-Hilal. Em entrevista à CM TV, o ex-treinador do Sporting falou da sua nova vida e do que o faz ter mais saudades em Portugal. Depois do ataque em Alcochete que continua a atormentá-lo, Jesus garante, no entanto, ter uma qualidade de vida inquestionável: vive num compound com cinco piscinas e escolheu uma casa com múltiplos quartos para poder receber os amigos que ali o quiserem visitar.

Sentado numa poltrona e com um iPad na mão para visualizar qual dos quatro comentadores da CMTV lhe colocava perguntas, Jorge Jesus respondeu a uma série de questões depois da entrevista em que falou sobre a sua saída do Sporting. Quando lhe perguntaram como ultrapassava a ausência do “peixinho grelhado”, Jesus admitiu logo que essa era uma barreira difícil de ultrapassar.

“Vocês sabem que eu só como peixe, não como carne. E aqui não é fácil. É muita fruta, muita verdura. Já tentaram trazer-me um bacalhau, um amigo meu que veio ao Dubai e depois à Arábia, mas eles nem sabiam o que era um bacalhau. Tentámos fazer um bacalhau aqui na academia e mesmo não estando muito bem cozinhado soube-nos tão bem. É assim, o ser humano vai se adaptando a tudo”, disse Jorge Jesus.

Prosseguindo no tema da gastronomia, um dos comentadores perguntou-lhe se, por acaso, já tinha provado o cabrito, que tradicionalmente se come de joelhos e com as mãos. O treinador voltou a sublinhar que não toca em carne, mas que comer com as mãos até pode ser uma solução “higiénica”. “Se pelo menos lavarmos as mãos”, disse, provocando risos em estúdio.

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“Acabei de dizer que não como carne. E até é uma desculpa para não comer com as mãos. Não como carne, não posso ajoelhar-me. Sei que esse ritual existe aqui e que tem uma técnica para comer a comida … o arroz, mas eu acho giro comer com as mãos… Se calhar com os talheres é mais higiénico. Mas as nossas mãos a gente conhece-as, não têm micróbios nem nada que nos possa fazer mal, pelo menos se as lavarmos”, defendeu.

Desafiado a vir a Portugal apoiar a candidatura à presidência do Sporting do médico Frederico Varandas, o treinador disse logo que isso seria “impossível”. É que, segundo assegurou, agora é um “emigrante”. E isso significa estar seis meses sem poder vir a Portugal.

“Isso é impossível, não sei se vocês sabem, mas eu praticamente durante seis meses não posso ir a Portugal. Não sabem, a tributação se eu sair… eu sou emigrante e tenho de estar 183 dias fora do meu país, isso são seis meses”, disse, deixando os comentadores e amigos admirados.

Apesar das saudades do seu País, Jorge Jesus admitiu que todos os seres humanos têm uma grande capacidade de adaptação. Quando chegou à Arábia Saudita, conta, pensou que era um “outro país”. Mas depois quando lhe mostraram o compound, onde ficaria alojado, e lhe deram a possibilidade de escolher uma casa “com muitos quartos” ficou mais animado.

“A minha preocupação quando fui para o compound foi escolher uma casa grande com muitos quartos para quando os meus amigos viessem cá estarem à vontade. E esse compound é muito grande, tem cinco piscinas, supermercados, vivem lá cinco mil pessoas dentro. É uma cidade…”

Jorge Jesus confessa que até se surpreendeu com o próprio país. Não era o que imaginava. A nível da arquitetura diz que está próximo do “Dubai” e que é um país “em desenvolvimento”. “Não estou a falar em termos de política”, ressalva. No entanto o clima “não é fácil”. “40, 50 graus todos os dias, vai lá vai”, disse. Jesus conta, também, que um elemento do seu staff já lá tinha estado três anos e que, agora de volta ao país, nota uma grande diferença. “Uma maior abertura ao ocidente”.

O clima e a religião fizeram-no, por isso, reestruturar os planos de treinos. Jorge Jesus diz que está na academia das 9h00 até às 23h00, mas por causa do calor e das “rezas” são obrigados a fazer pausas. “Montámos uma metodologia de treino, de manhã ginásio por causa do calor… A primeira reza é às 5h00 e a segunda por volta das 12h00 /12h 30… Depois às 5h da manhã eles rezam e depois dormem, porque estão acordados até às 5h por causa das rezas, são horários que tens que respeitar (sic)”.

Um respeito que Jorge Jesus enaltece ao nível da hierarquia. Jorge Jesus diz que não o impôs, mas que ninguém se senta à mesa para comer, ou entra no avião ou no autocarro antes dele. “A responsabilidade  e as chefias são muito respeitadas e o treinador não tem problemas nenhuns em comandar a equipa”, refere.

Jesus também já está a aprender a falar árabe. Por causa do trabalho a primeira palavra que aprendeu foi “Kura”, para bola. E por causa do calor e da necessidade de se hidratar a segunda palavra que aprendeu foi “ma’an”, para água. Jorge Jesus também já aprendeu que os homens podem abraçar os homens e dizerem “I Love You”.

“Eu já tive homens em roda de mim a dizer I Love, I love you Jesus. E Eu nunca tinha ouvisto (sic) um homem dizer I love you para outro homem”, afirma.

Jesus, que teve a preocupação de ir à embaixada portuguesa na Arábia buscar uma bandeira portuguesa, quer deixar a sua marca na equipa. E quando regressar a casa, um dia, não quer ser esquecido. “O meu grande objetivo de deixar a marca portuguesa como o Vasco da Gama, Pedro Alvares Cabral e por aí fora”.