Foi um sim, um não e um talvez. O Partido Socialista foi dos primeiros a reagir e admitiu logo viabilizar a comissão de inquérito pedida pelo CDS sobre o roubo de material militar em Tancos. Segundo o presidente do partido, Carlos César, em entrevista à RTP, “o PS, em regra, aceita as propostas dos partidos políticos no sentido de serem formadas comissões de inquérito, sobretudo porque não deseja ser um partido que possa ser acusado de obstruir quaisquer investigações”. “O CDS acha que deve haver uma comissão de inquérito, pois haverá uma comissão de inquérito”, disse ainda. Já o PSD não deu mais do que um “talvez” aos centristas, apesar de Marco António Costa, deputado que preside à comissão de Defesa, ter entretanto dado a sua opinião pessoal no sentido de viabilizar o inquérito.

Na entrevista à RTP, César garantiu ainda que “o Governo nunca desvalorizou” o roubo em Tancos. “Pelo contrário, valorizou a investigação judicial e criminal que se desenvolveu”, afirmou. Questionado sobre as declarações do ministro da Defesa — que disse não ter a certeza de que ocorreu um roubo –, Carlos César disse que “o ministro da Defesa não é vigilante nem faz parte do corpo de segurança” e que “o Governo fez o que tinha de fazer”.

Destacando que nem a Polícia Judiciária Militar nem a Polícia Judiciária estão subordinadas ao Governo e atuam com liberdade, Carlos César saudou o facto de começarem a aparecer conclusões da investigação judicial. “Evidentemente, se este roubo aconteceu, a instituição militar e aqueles que tinham a responsabilidade de garantir” a segurança”, essas pessoas “evidentemente falharam”.

PSD vai refletir sobre benefícios da Comissão de Inquérito

No PSD o tempo é de reflexão. Ao Observador, Fernando Negrão não disse “sim” nem “não” quando questionado sobre a possibilidade de a bancada que lidera vir a aprovar a iniciativa do CDS. “Face aos desenvolvimentos da investigação criminal, que são claramente significativos, devemos ponderar se uma comissão de inquérito é, neste momento, a forma mais adequada”, disse o social-democrata ao Observador. “Não nos opomos nem deixamos de nos opor”, disse para já, admitindo que a bancada precisa de “parar e refletir sobre se é benéfico ou prejudicial à investigação judicial”.

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O CDS quer que a comissão de inquérito ao caso Tancos sirva para apurar “os atos omissões e responsabilidades políticas do Governo é o Parlamento”, mas neste ponto, Fernando Negrão atira uma crítica: “Se é só política porque não a pediram mais cedo?”. Negrão nota que este é uma matéria “sensível” e, lembra, envolveu até uma querela entre duas polícias”, referindo-se à polémica entre a Polícia Judiciária e a PJ Militar.

Acontece que, em declarações à Lusa, o deputado social-democrata Marco António Costa, que preside à comissão de Defesa e que era vice-presidente de Passos Coelho, veio colocar água na fervura no sentido de pressionar a direção do partido a aprovar a comissão de inquérito. “É uma iniciativa útil para retirar ilaçõesno plano legislativo e no plano político relativamente àquilo que no decorrer de todo este processo possa ter corrido mal”, disse o deputado, aplaudindo a iniciativa do CDS, mas esclarecendo que estava a falar a título pessoal.

Ressalvando que se trata de “uma opinião individual”, Marco António Costa sustentou que uma comissão de inquérito “não tem de ter uma conotação negativa” nem deve ser vista como “uma arma de arremesso político”, frisando que “parece óbvio” que não irá de alguma forma interferir com a investigação criminal em curso. “Reforçar as iniciativas legislativas e políticas que apurem o que correu menos bem e que apresentem soluções para reforçar, para o futuro, a segurança do Estado, são sempre úteis e uma comissão de inquérito não tem de ter uma conotação negativa”, disse ainda.

Já o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, mostrou-se logo contra a comissão de inquérito por entender que o momento era da justiça e que a iniciativa pode ser vista como “oportunismo político”. Para o líder parlamentar do BE, as detenções realizadas no âmbito da investigação ao caso do furto de armas dos paióis de Tancos mostram que a justiça “não está parada” e disse esperar resultados “o quanto antes”. “Este é o momento da investigação e é o momento de separar a política da justiça. Esperamos que estas ações tenham consequência o quanto antes para que depois a política possa tirar consequências dessas ações”, afirmou, num claro recado ao CDS.

PCP diz que “sim”, mas quer ir ainda mais longe

O PCP vai viabilizar a proposta do CDS-PP para uma comissão de inquérito, apesar de considerar que é uma iniciativa precipitada e com “agenda política”, sugerindo o apuramento das responsabilidades políticas de “sucessivos Governos”. Em declarações aos jornalistas no parlamento, o deputado comunista Jorge Machado disse que o PCP “não colocará obstáculo” à iniciativa do CDS-PP, sugerindo contudo que “seria mais prudente” aguardar pelo fim da investigação criminal para que os grupos parlamentares pudessem ter acesso a dados que hoje estão em segredo de justiça.

“A iniciativa parece-nos precipitada e claramente forçada por uma agenda política do CDS-PP, que fica muito aquém daquilo que seriam as expectativas uma vez que a informação relevante não está acessível”, disse Jorge Machado.

Considerando que “a justiça está a funcionar” e que “isso é positivo”, Jorge Machado sustentou que uma comissão de inquérito deve apurar não só as responsabilidades políticas do atual Governo e do ministro da Defesa Nacional e das “altas estruturas do Exército”, mas também as responsabilidades de “sucessivos Governos do PS, PSD e CDS”. “Parece-nos que o Ministério da Defesa Nacional tem tido um comportamento muito aquém do desejável”, considerou, reiterando recear que a responsabilidade “vá morrer no praça ou no sargento que estava de vigia naquele dia e não nos responsáveis da alta estrutura militar que permitiram que a estrutura de Tancos chegasse ao ponto que chegou”.

O deputado do PCP considerou que as detenções ocorridas na terça-feira no âmbito de uma investigação ao aparecimento do material roubado em Tancos – quatro elementos da Polícia Judiciária Militar, incluindo o diretor, três da GNR e um civil – “são factos muito graves”. Jorge Machado advertiu que “a Assembleia da República não pode de forma alguma imiscuir-se” no processo judicial em curso, a comissão parlamentar de inquérito fica “de alguma forma limitada”.

*Artigo atualizado dia 26 de setembro às 12h com declarações do deputado do PSD Marco António Costa e com posição do PCP