Os governos português e chinês assinaram esta quarta-feira 17 acordos bilaterais, envolvendo sobretudo às áreas financeira e empresarial, com destaque para o memorando de entendimento sobre a iniciativa chinesa de investimento em infraestruturas “Uma Faixa, Uma Rota”.

Estes acordos foram assinados no Palácio de Queluz, numa cerimónia presidida pelo primeiro-ministro português, António Costa, e pelo chefe de Estado chinês, Xi Jinping, que esta quarta-feira termina a sua visita de Estado a Portugal, iniciada na terça-feira à tarde.

O memorando de entendimento sobre cooperação no quadro da iniciativa chinesa “Uma Faixa, Uma Rota” insere-se na vertente económica relativa à chamada “Rota da Seda Marítima do século XXI” e foi assinado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e pelo diretor da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (com estatuto ministerial), He Lifeng.

No texto deste compromisso, estão estabelecidas as modalidades de cooperação bilateral no âmbito da iniciativa chinesa ‘Uma Faixa, Uma Rota’, abrangendo uma ampla gama de setores, com destaque para a conectividade e para a mobilidade elétrica.

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Na terça-feira, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, salientou especificamente a importância deste acordo, considerando que simboliza bem a parceria que Portugal e a China pretendem “continuar a construir, com diálogo político regular e contínuo, a pensar no muito que une” os dois países.

Também na área económica, Augusto Santos Silva e o ministro do Comércio chinês, Zhong Shan, assinaram um memorando sobre cooperação em matéria de comércio de serviços.

No documento, salienta-se que Portugal e a China se comprometem no sentido de que “o comércio de serviços será, no quadro da realização da Comissão Mista Económica, um dos pontos de agenda de diálogo bilateral, abrangendo áreas como transportes, turismo, finanças, propriedade intelectual, tecnologia ou cultura”.

No âmbito empresarial foram assinados sete acordos, o primeiro dos quais um memorando de entendimento para a Implementação em Portugal do STARLAB – um laboratório de pesquisa de tecnologia avançada nos domínios do mar e do espaço.

Um projeto que envolve a portuguesa Tekever e a Academia Chinesa das Ciências que tem como objetivo “alargar a cooperação com outras entidades internacionais em áreas como a visão 4D, a exploração do espaço profundo, desenvolvimento de plataformas de satélites ou de tecnologias de monitorização e proteção dos oceanos”.

Outros acordos envolveram a AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) e a “COFCO International” (da área dos negócios agro-industriais) para o estabelecimento de um centro de serviços partilhados em Matosinhos, com uma previsão inicial de criação de 150 postos de trabalho; a Caixa Geral de Depósitos e o Banco da China, prevendo a emissão de dívida pública em moeda chinesa (Yuan), além de formas de cooperação bilateral em mercados terceiros no âmbito da chamada “Rota da Seda”; a EDP e a China Three Gorges no âmbito da responsabilidade social da empresa; e a State Grid e a REN para o desenvolvimento em investigação em energia, projetos de interconexão entre Portugal e Marrocos e criação de um programa de estágios internacionais.

Ainda no domínio empresarial foram assinados acordos entre o Banco Comercial Português e a Union Pay, e, igualmente, entre a MEO e a Huawei sobre o desenvolvimento da tecnologia 5G, tendo em vista permitir um aumento qualitativo do acesso à rede de banda larga móvel e comunicações com maior fiabilidade.

Na cerimónia do Palácio de Queluz, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, e o seu homólogo chinês, Luo Shugang, assinaram um acordo para a programação de festivais culturais – área em que também se avançou para uma parceria entre a RTP e um grupo media da China para a produção conjunta de documentários.

Na ciência e Ensino Superior, Portugal e China têm agora um memorando de entendimento sobre a promoção de atividades de cooperação para o desenvolvimento de uma parceria, assim como acordos para o estabelecimento do Instituto Confúcio na Universidade do Porto e para a instalação de um Centro de Estudos Chineses na Universidade de Coimbra.

Portugal e China assinaram ainda um protocolo sobre requisitos fitossanitários para a exportação de uva de mesa portuguesa e um memorando de entendimento no domínio da água – dois acordos que foram assinados, respetivamente, pelos ministros da Agricultura, Capoulas Santos, e do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes.

De referir, ainda, o compromisso em torno de uma carta de intenções sobre cooperação entre as câmaras municipais de Tianjin e de Setúbal – documento que foi subscrito pelos autarcas Maria das Dores Meira e Zhang Guoqing.

Somos sempre o garante de uma relação de confiança, afirma Costa

O primeiro-ministro afirmou esta quarta-feira que Portugal, no quadro bilateral, ou no âmbito da União Europeia, é sempre um garante de uma relação de confiança com a China, que disse estar fundada em cinco séculos de convivência.

Esta posição foi transmitida por António Costa após ter estado reunido com o Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, no Palácio de Queluz, e de os dois governos terem assinado 17 acordos bilaterais.

António Costa disse que a visita de Estado a Portugal de Xi Jinping, que termina ao início da tarde, ocorre num “momento especialmente importante quando, no próximo ano, se celebram 40 anos de relações diplomáticas entre os dois países e 20 anos após a devolução à China da administração do território de Macau.

“A nossa relação funda-se em mais de cinco séculos de convivência e numa confiança mutua que foi sendo confirmada e reafirmada. No quadro bilateral e da União Europeia, somos sempre um garante da relação de confiança com a República Popular da China”, sustentou o primeiro-ministro português, numa declaração sem direito a perguntas por parte dos jornalistas.

De acordo com António Costa, na sequência desta visita de Estado de Xi Jinping a Portugal “estão criadas as condições para um novo reforço das relações bilaterais dos pontos de vista económico, cultural ou povo a povo”.

Depois, deixou uma referência à visita de Estado que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, efetuará em abril próximo à China.

Dirigindo-se a Xi Jinping, António Costa afirmou: “A sua visita de Estado rapidamente será correspondida com a visita do nosso Presidente da República à China e seguramente com a continuação das relações muito intensas entre os nossos governos”.

Perante o Presidente da China, o primeiro-ministro deixou ainda mais uma referência elogiosa ao atual estado das relações luso-chinesas.

“Com a confiança que temos, em cada novo encontro, são dois passos à frente que conseguimos dar no nosso relacionamento cada vez mais profícuo entre nós”, acrescentou.

Depois das declarações conjuntas, num momento raro, porque fora do protocolo de Estado, o Presidente chinês e o primeiro-ministro português deram um demorado passeio a sós pelos jardins do Palácio de Queluz.

Xi Jinping defende multilateralismo, livre comércio e paz

O Presidente da China prometeu esta quarta-feira o reforço dos projetos existentes com Portugal e defendeu o multilateralismo, o livre comércio e a paz, numa declaração conjunta com o primeiro-ministro António Costa.

“O funcionamento bilateral encontra-se no seu melhor momento histórico. Em 2019, quando se celebram 40 anos das relações bilaterais, vamos aprofundar a amizade e cooperação e levar a nossa parceria estratégica global para um novo patamar”, assinalou Xi Jinping no Palácio de Queluz, onde foi recebido pelo primeiro-ministro português, membros do Governo, empresários e académicos.

Na sua declaração, com tradução simultânea para português, o Presidente chinês voltou a enfatizar o reforço das relações bilaterais, que se encontram “no seu melhor momento histórico”. “As duas partes vão empenhar-se na promoção e aprofundamento da parceria estratégica global entre a China e a Europa, reforçar o apoio à cooperação nas organizações internacionais, como a ONU, salvaguardar conjuntamente o multilateralismo, o livre comércio, promover a paz, desenvolvimento, estabilidade e prosperidade mundiais”, assinalou na sua declaração.

Para 2019, quando se celebram 40 anos das relações bilaterais, Xi Jinping prometeu um aprofundamento da amizade e cooperação.

Prometeu também elevar a “parceria estratégica global para um novo patamar”, em particular no âmbito da Faixa Económica da “Rota da Seda” e da iniciativa relativa à “Rota da Seda Marítima” do século XXI, um dos instrumentos bilaterais que foi assinado pelas duas partes.

“Vamos criar mais sinergias, reforçar a construção de ‘Uma Faixa, Uma Rota’, implementar bem os projetos existentes, aperfeiçoar os mecanismos de cooperação, e explorar juntos os mercados terceiros”, assegurou, após prometer manter “a tendência das visitas de alto nível, reforçar intercâmbios entre os dois governos, assembleias, partidos políticos, contactos a nível local entre os povos e elevar incessantemente o nível de confiança mútua”, referiu o líder chinês.

Xi Jinping recordou que Portugal foi a sua última paragem no seu périplo pela Europa, Caribe e América Latina, onde participou na cimeira do G20 que decorreu em Buenos Aires, a capital da Argentina. “Senti as aspirações, expectativas, dos povos de todos os países, pela paz, estabilidade, desenvolvimento, prosperidade, por uma vida melhor”, assegurou.

“Apesar de o mundo atual enfrentar diversos problemas e desafios, a China vai aderir sempre ao princípio do respeito mútuo, consultas em pé de igualdade, e persistir no desenvolvimento pacífico e cooperação”.

Ao concluir a sua intervenção, muito aplaudida pelas duas delegações presentes, prometeu ainda uma “conjugação de esforços com Portugal e outros países para promover a concretização da paz e estabilidade, desenvolvimento comum, por uma paz duradoura no mundo”.

Declaração conjunta repudia protecionismo, defende direitos humanos e apoia Guterres

Os governos português e chinês acordaram esta quarta-feira uma declaração conjunta em defesa da ação do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, na qual se repudia o protecionismo económico, o unilateralismo e se defende os direitos humanos.

Este documento, com 21 pontos, foi divulgado momentos antes de o primeiro-ministro português, António Costa, e o chefe de Estado da República Popular da China, Xi Jinping, presidirem no Palácio de Queluz à cerimónia de assinatura de um conjunto acordos bilaterais.

“As duas partes manifestaram o apoio a uma economia mundial aberta e repudiaram todas as formas de protecionismo e unilateralismo, comprometendo-se a promover a liberalização e facilitação do comércio e investimento no âmbito das regras do sistema multilateral do comércio”, lê-se na declaração conjunta, em que também se salienta o papel de António Guterres.

Portugal e a China transmitem o seu apoio “à reforma do sistema das Nações Unidas de modo a aumentar a sua autoridade e eficiência” e acrescentam: “A reforma deve refletir o princípio de abertura e transparência, ouvir de forma extensiva as opiniões dos países membros e buscar amplo consenso mediante consulta plena. As duas partes sublinharam o seu apoio aos esforços do secretário-geral da ONU neste âmbito”.

Neste capítulo sobre segurança internacional e multilateralismo, consta uma referência direta à questão dos direitos humanos.

“As duas partes reafirmaram o seu empenho no multilateralismo, na defesa dos propósitos e princípios consagrados na Carta das Nações Unidas, em apoiar o reforço do papel das Nações Unidas na comunidade internacional, na manutenção da paz e segurança internacionais, na promoção do desenvolvimento sustentável e na proteção dos direitos humanos”, sublinha-se.

Outra nota significativa é o facto de o executivo de Pequim entender como favorável o processo de construção europeia, sendo expressamente referido no documento que a parte chinesa “avaliou como muito positivo o papel importante que Portugal desempenha em salvaguardar a estabilidade e impulsionar a integração da União Europeia”.

Por outro lado, o regime de Pequim manifesta “apreço” pelo facto de Portugal ter reafirmado “a continuada adesão ao princípio ‘Uma só China’, bem como o apoio à posição chinesa na questão de Taiwan”.

Ainda em relação aos principais ‘dossiers’ mundiais, Portugal e China prometem empenhamento e coordenação para enfrentarem o desafio do combate às alterações climáticas.

“As duas partes continuarão a promover o multilateralismo baseado na lei internacional e nas normas universalmente reconhecidas que regem as relações internacionais, e juntarão esforços para promover relações internacionais assentes no respeito mútuo, na equidade e justiça e na cooperação mutuamente vantajosa com vista a construir um mundo limpo, belo, aberto e inclusivo com paz duradoura, segurança universal e prosperidade comum”, lê-se na declaração conjunta luso-chinesa.

No que se refere às relações bilaterais, os dois governos consideram existir atualmente um clima de “confiança política mútua crescentemente reforçada, consolidada em resultados frutíferos de cooperação nos setores da economia e comércio, investimento, energia, finanças, cultura, educação, ciência e tecnologia, justiça, transportes e segurança, entre outros”.

“O ano de 2019 marcará o 40.º aniversário das relações diplomáticas entre Portugal e a China. No contexto da atual situação internacional, que regista mudanças complexas e profundas, as duas partes consideraram que reforçar a Parceria Estratégica Global Portugal-China com novos conteúdos corresponde aos interesses fundamentais dos dois países e dos seus povos e contribui para a salvaguarda da paz, estabilidade, desenvolvimento e prosperidade do mundo”, especifica-se.

Nesse sentido, os países dizem ter acordado um conjunto de compromissos para “elevar o nível de desenvolvimento das relações e conduzir a Parceria Estratégica Global Portugal-China a novos patamares”.

Na declaração conjunta, menciona-se ainda que Portugal “saudou e manifestou o seu interesse em participar na Iniciativa Uma Faixa e Uma Rota, da China, e que os dois países se comprometem, nos vários setores económicos “a conceder facilidades à importação de produtos e serviços qualificados, e a continuar a encorajar e apoiar as suas empresas a investir na China e em Portugal”.

“A parte portuguesa acolhe favoravelmente o interesse das empresas chinesas em investir e criar fábricas em Portugal e em explorar em conjunto com as suas congéneres portuguesas os mercados europeus, bem como outros”, assinala-se num dos pontos do capítulo económico.

No plano da justiça, merece destaque um ponto relativo ao combate ao terrorismo e à criminalidade organizada.

Os governos português e chinês “concordaram em aprofundar a cooperação bilateral na entrega de infratores em fuga, na recuperação dos ativos de proveniência ilícita e no combate ao terrorismo e o seu financiamento, à criminalidade organizada transnacional e ao branqueamento de capitais”.