O Presidente chinês, Xi Jinping, sublinhou esta terça-feira que “ninguém pode ditar” a conduta da China, durante as comemorações do 40.º aniversário de abertura do país à iniciativa privada, numa rutura com o maoísmo. “Ninguém pode ditar ao povo chinês o que pode, ou não, fazer”, afirmou Xi, num discurso de quase uma hora e meia, no qual sublinhou o progresso económico e social do país, desde que adotou a política de Reforma e Abertura, em dezembro de 1978.

As declarações de Xi, o líder chinês mais forte desde o fundador da República Popular, Mao Zedong (1949-1976), surgem numa altura em que Pequim enfrenta pressões dos Estados Unidos para realizar “mudanças estruturais” na economia.

As tensões entre as duas maiores economias do mundo resultaram já numa guerra comercial, com ambos os lados a impor taxas alfandegárias sobre centenas de milhares de milhões de dólares de bens dos dois países. Xi e o homólogo norte-americano, Donald Trump, concordaram, no entanto, em não avançar com taxas adicionais durante um período de 90 dias, para tentar negociar um acordo.

O líder chinês considerou que os feitos económicos dos últimos 40 anos legitimam o “socialismo com características chinesas”, um modelo que permite a iniciativa privada, enquanto o papel dirigente do Partido Comunista (PCC) continua a ser um “princípio cardeal”.

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Xi assegurou que Pequim vai continuar a promover a abertura e o desenvolvimento, mas ao seu próprio ritmo. “Mudaremos resolutamente o que pode ser reformado, e não mudaremos, resolutamente, o que não pode ser mudado”, frisou.

O também secretário-geral do PCC lembrou que a abertura e as reformas devem ser balançadas com a “manutenção da estabilidade” do país, permitindo à China crescer em qualidade, inovar e enfrentar os desafios contemporâneos, como o combate à poluição.

“Num país como a China, com cinco mil anos de História e uma população de mais de 1,4 mil milhões de pessoas, nenhum manual pode ser considerado regra de ouro, e não há um mestre que possa comandar as pessoas “, declarou.

Quatro décadas em busca da abertura

A China comemorou esta terça-feira o 40.º aniversário da adoção das reformas económicas que converteram o país na segunda maior economia do mundo, com o Presidente chinês a defender o modelo de capitalismo de Pequim.  No Grande Palácio do Povo, ícone da arquitetura socialista erguido junto à praça Tiananmen, em Pequim, Xi voltou a prometer que o país vai continuar a abrir-se ao comércio e ao investimento, na celebração do 40.º aniversário da política de Reforma e Abertura.

No final dos anos de 1970, após uma década de violência e caos induzidos pela Grande Revolução Cultural Proletária, movimento de massas lançado pelo fundador da República Popular da China, Mao Zedong, a então pobre e isolada China estava à beira do colapso.

Mas, entre 18 e 22 de dezembro de 1978, no terceiro plenário do XI Congresso do Partido Comunista realizou-se o ponto de viragem que viria a converter o país na segunda maior economia mundial, com a adoção da política de “Reforma e Abertura”, sob a liderança de Deng Xiaoping. Deng lançou então as “Quatro Modernizações”: agricultura, indústria, ciência e tecnologia, e defesa.

Oficialmente, o país continuou a ser governado sob a égide do marxismo-leninismo e o papel dirigente do PCC permaneceu como um “princípio cardeal”. Quando em dezembro de 1978, um jovem chamado Wei Jinsheng propôs a democracia como a “quinta modernização”, foi condenado a 18 anos de prisão. Em junho de 1989, o movimento pró-democracia da Praça Tiananmen foi esmagado pelo exército, na noite de 03 para 04 de junho, quando os tanques do exército foram enviados para pôr fim a sete semanas de protestos.

O número exato de pessoas mortas continua a ser segredo de Estado, mas as “Mães de Tiananmen”, associação não-governamental constituída por mulheres que perderam os filhos naquela altura, já identificaram mais de 200. O quadro é claro: abertura e reformas económicas, mas sob o controlo do PCC.

Em 1979, num país então essencialmente rural, foi no campo, onde os camponeses viviam em profunda miséria, que foram lançadas as primeiras reformas, com o desmantelar do sistema coletivo de produção agrícola. As reformas chegaram às cidades em meados dos anos de 1980, mas não sem antes serem testadas em Zonas Económicas Especiais no sul do país, abertas ao investimento externo.

Um desses laboratórios é Shenzhen. Então uma vila pacata, o Produto Interno Bruto da cidade ultrapassou, em 2017, os 338 mil milhões de dólares, à frente de Hong Kong ou Singapura, dois importantes centros financeiros da Ásia.

A adesão da China à Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, marca outro passo importante para o país, que é forçado a promover uma maior abertura e adaptar-se às regras internacionais. Washington e Bruxelas, no entanto, continuam a queixar-se das dificuldades no acesso ao mercado chinês. Pequim é acusado de distorcer a concorrência, ao subsidiar empresas chinesas e através de práticas comerciais “injustas”, como violações de propriedade industrial ou transferência forçada de tecnologia, em troca de acesso ao mercado.

A taxa de câmbio da moeda chinesa, o yuan, que ainda não é totalmente convertível, continua a ser ditada pelas autoridades. Numa tentativa de forçar Pequim a realizar “mudanças estruturais”, o Presidente norte-americano, Donald Trump, impôs já taxas alfandegarias sobre 250 mil milhões de dólares de bens chineses.

Porém, Xi Jinping considerou esta manhã que os feitos económicos dos últimos 40 anos legitimam o “socialismo com características chinesas”, um modelo que permite a iniciativa privada, enquanto o papel dirigente do Partido Comunista (PCC) continua a ser um “princípio cardeal”.

Xi assegurou que Pequim vai continuar a promover a abertura e o desenvolvimento, mas ao seu próprio ritmo. “Mudaremos resolutamente o que pode ser reformado, e não mudaremos, resolutamente, o que não pode ser mudado”, sublinhou.

Presidente chinês diz que China “nunca vai procurar a hegemonia”

O Presidente chinês, Xi Jinping, garantiu esta terça-feira que o país “nunca vai procurar a hegemonia”, mesmo quando se aproxima do centro do palco internacional, durante as comemorações do 40.º aniversário de abertura à iniciativa privada. Num discurso de hora e meia, o chefe de Estado chinês repetiu o compromisso do país com o sistema multilateral de comércio e a abertura económica, sem mencionar as disputas comerciais em curso com os Estados Unidos. Xi assegurou que a China não se vai desenvolver “à custa dos interesses de outros países”.

Mas a crescente influência de Pequim além-fronteiras tem suscitado divergências com as potências ocidentais, que veem uma nova ordem mundial ser moldada por um rival estratégico, com um sistema político e de valores profundamente diferentes.

Do Sudeste Asiático a África, o país tem alargado a presença através do gigantesco projeto de infraestruturas ‘uma faixa, uma rota’, visto como uma versão chinesa do “Plano Marshall”, lançado pelos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial, e que permitiu a Washington criar a fundação de alianças que perduram até hoje.

Ao destacar que a China está “gradualmente a aproximar-se do centro do palco internacional”, Xi Jinping notou que o país adota uma política de defesa nacional defensiva. “O desenvolvimento da China não constitui uma ameaça para outros países”, afirmou. “Não interessa o quanto se desenvolve, a China não vai procurar a hegemonia”, garantiu.

Xi sublinhou ainda o papel do antigo líder Deng Xiaoping nas reformas económicas que salvaram o país do colapso, após uma década de violência e caos induzidos pela Revolução Cultural, movimento de massas lançado pelo fundador da República Popular da China, Mao Zedong.

Outras comemorações foram criticadas por minimizarem o contributo de Deng, considerado o arquiteto-chefe das reformas económicas, de forma a elevar o estatuto de Xi, o mais forte líder chinês desde Mao.

O discurso não terá aliviado as preocupações de empresários e companhias estrangeiras, que esperavam que Xi aproveitasse o momento para anunciar medidas concretas de abertura do mercado, visando reduzir o domínio dos conglomerados estatais sobre a economia.