Há cada vez mais homens a denunciar situações em que foram vítimas de abusos sexuais. Em dois anos de existência, a associação Quebrar o Silêncio recebeu 146 pedidos de ajuda. Só no ano passado, foram cerca de 97, mais do dobro do ano anterior. Os números foram divulgados esta sexta-feira pelo jornal Público. 

“Chamo-me Miguel, tenho 50 anos e sou um sobrevivente. (…) Num dia de desespero e de muita angústia, percebendo que não conseguia viver mais com o fardo que carreguei toda a minha vida, e já depois de ter tido conhecimento da Quebrar o Silêncio, escrevi um pedido de ajuda”. Este é um dos 13 testemunhos de homens disponíveis no site da associação.

O trauma é, muitas vezes carregado em silêncio. Na maioria dos casos, as vítimas só denunciam os casos 20 a 30 anos após o abuso. Na associação Quebrar o Silêncio a média de idades dos homens que se queixam é de 34 anos, mas o leque vai desde os 18 aos 77 anos. “É preciso passar a mensagem de que não há nada errado com estes homens e que não são um caso único. Muitos destes sobreviventes [termo usado na associação para designar os homens que foram vítimas de violência sexual e que vivem com as consequências do abuso] acreditam que a sua história é isolada e que são a exceção à regra”, explica Angêlo Fernandes, técnico especialista e fundador da associação, ao Sapo24. 

Não é standard, mas há duas situações que são as mais comuns. Uma é atinguirem um ponto de rutura tal que não aguentam mais, ou então alguma coisa de bom começa a acontecer na vida deles e não são capazes de a viver ou de a aproveitar. Normalmente é um destes extremos”, explica Cláudia Caires, psicóloga da associação Quebrar o Silêncio ao Público.

Grande parte dos pedidos de ajuda chegam por escrito, por e-mail (73%), mas há também quem recorra à linha de apoio (24%). Os pedidos de ajuda não vêm apenas de vítimas, mas também de familiares ou amigos que tentam ajudá-los a superar o trauma.

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Esta associação dedica-se a apoiar vítimas do sexo masculino. Ainda assim, há também mulheres a procurar a associação. Em 2018, 28 vítimas do sexo feminino pediram ajuda à associação Quebrar o Silêncio. Nestes casos, a associação reencaminha os casos para a Associação de Mulheres Contra a Violência.

Estes casos “não são pontuais, nem raros”, explica Ângelo Fernandes ao Sapo 24. “Sabemos que 1 em cada 6 homens é vítima de alguma forma de violência sexual antes dos 18 anos”, afirma. A maioria dos casos denunciados à associação, acontece durante a infância ou a pré-adolescência, quase sempre cometida por familiares ou conhecidos da família e, muitas vezes, de forma continuada durante anos.

Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna, citado pelo Público, o crime de abuso sexual foi o que motivou o maior número de inquéritos abertos entre os crimes contra a liberdade e auto-determinação sexual (42,6%), seguido da violação com 18,7%.

Em Portugal são três as associações que apoiam as vítimas.