Nova-Iorque, a primeira das quatro grandes semanas da moda mundiais, assistiu à antecipação da próxima estação. Durante oito dias, dezenas de criadores fizeram desfilar as suas propostas para o outono-inverno 2019/20, do streetwear mais condizente com as ruas da cidade aos vestidos glamorosos dignos de uma red carpet à americana. Foi uma semana da moda com dois tons — de um lado, a celebração do luxo e das estrelas que pisaram a passerelle, do outro, as chamadas de atenção para a diversidade de corpos, para a questão do género no vestuário (ou vice-versa) e para a crise ambiental que o globo atravessa.
Aqui e ali, os grandes palcos da moda começam a perceber a importância de incluir novas silhuetas (que não a XS). Como quase sempre acontece, nesta edição da Semana da Moda de Nova Iorque, que decorreu de 6 a 13 de fevereiro, são os nomes emergentes, mais do que os veteranos do setor, a dar o primeiro passo para operar a mudança. Além do desfile da plataforma Honoré 11, especializada na venda de peças de designers de renome em tamanhos grandes, foram as marcas Gypsy Sport e Chromat as responsáveis pela mensagem, com direito a hashtag próprio — #fatfashionweek. A segunda marca, chegou mesmo a levar uma modelo com uma prótese na perna e canadianas para a passerelle.
Recorrendo a silhuetas invejáveis, mas questionando a ditadura da juventude, o designer indiano Naeem Khan também deu que falar. Pat Cleveland, modelo de 68 que teve o apogeu da sua carreira nos anos 60 e 70, regressou em grande, com um vestido de glitter prateado ao lado de outras duas modelos seniores. As questões de género estiveram igualmente representadas. Com subtileza, Bode e Eckhaus Latta, duas marcas em pleno processo de afirmação na indústria, desafiaram aquilo que, todos os dias, entendemos como roupa de mulher e roupa de homem. Emily Bode desenvolve o conceito de masculinidade através de peças de menswear ricas em padrões, técnicas e texturas. A dupla Zoe Latta e Mike Eckhaus levou manequins de ambos os géneros para o desfile, mas para mostrar a versatilidade de todas as peças.
Alessandro Trincone foi mais ruidoso. A maquilhagem hiperbólica e os coordenados teatrais redefinem o conceito vigente do guarda-roupa masculino. A No Sesso, marca que se estreou na fashion week, fez história. A sua fundadora e diretora criativa, Pierre Davis, foi a primeira mulher transgénero a apresentar uma coleção na Semana da Moda de Nova Iorque. A própria coleção revelou-se um manifesto da moda sem género.
Collina Strada, marca sob a direção criativa de Hillary Taymour, foi a voz ambientalista num calendário repleto de outras prioridades. Convidou Xiuhtezcatl Martinez, um rapper e ativista de 18 anos que acompanhou o desfile com uma performance de spoken word. As manequins comeram e beberam enquanto percorriam a passerelle, uma forma de mostrar garrafas e marmitas reutilizáveis juntamente com o vestuário, ele próprio feito, maioritariamente (75%), com sobras de tecidos.
Tom Ford fez uma coleção que tem tudo para alcançar a intemporalidade. Com harmonias cromáticas próximas do genial, luxo e sobriedade em doses balançadas, Ford usou a banda sonora do desfile para marcar uma posição. Um dia depois de Trump ter reafirmado a intenção de erguer um muro na fronteira com o México, no State of The Union, o designer fez soar “Don’t Dream It’s Over” (Não Sonhes que Acabou), canção composta em 1986 e interpretada pelo grupo australiano Crowded House.
O resto foi pura festa, a começar por Michael Kors. Sob lustres e bolas de espelhos, o designer aproveitou a apresentação da coleção do próximo inverno para recordar o mítico Studio 54, cuja abertura foi há 41 anos. O cantor Barry Manilow teve direito a palco e microfone para interpretar o tema “Copacabana”. A dupla The Blonds também teve uma estrela da música a animar o desfile. Lil’ Kim e Paris Hilton desfilou, num espetáculo de brilho, decotes e silicone.
E se Kors se deixou inspirar pelos anos 70, Anna Sui levou a década de 60 para a passerelle. Os estampados falaram por si — foram a ponte mais direta com a famosa década de todas as liberdades. De padrões (muitos padrões) também se fez a coleção da Coach. Sob a direção criativa de Stuart Vevers, a marca teve como mote as imagens vibrantes produzidas pelo artista Kaffe Fassett. No ambiente exclusivo da New-York Historical Society, o designer Wes Gordon apresentou a sua segunda coleção para a Carolina Herrera — uma fórmula composta por fatos, vestidos de cocktail e silhuetas dignas de um baile, que, apesar de não ser inovador, parece encerrar alguma frescura.
De volta a Nova Iorque, depois de duas estações em Paris, Proenza Schouler deu ênfase aos básicos, retrabalhados e corridos a uma paleta de beges, mostardas e preto. A dupla composta por Jack McCollough e Lazaro Hernandez visitou ainda ao universo artístico de Sol LeWitt. Como sempre, o resultado foi, invariavelmente, chique. A Marc Jacobs, coube a nobre tarefa (ou não) de fechar a semana da moda. As plumas e Christy Turlington, que não pisava uma passerelle há mais de 20 anos, foram as imagens que ficaram.
Na fotogaleria, veja as imagens dos momentos que marcaram a Semana da Moda de Nova Iorque. O roteiro da moda mundial segue para Londres, onde os desfiles acontecem entre 15 e 19 de fevereiro.