Em dezembro, quando o Manchester City perdeu três jogos em quatro jornadas da Premier League e chegou a estar a sete pontos do Liverpool, a conquista da Liga inglesa por parte dos reds quase 30 anos depois de o terem feito pela última vez parecia certa. Esse último mês de 2018, o pior período da atual temporada da equipa de Pep Guardiola, deu lugar a um City praticamente perfeito que à entrada para a penúltima jornada da Liga levava 12 vitórias consecutivas para o Campeonato. O pico de forma dos citizens encontrou uma fase menos eficaz do Liverpool: contas feitas, e já depois de um confronto direto que Bernardo Silva e companhia venceram, o Manchester City só precisava de ganhar os últimos dois jogos da época para se sagrar bicampeão inglês pela primeira vez na história.

Para isso, era preciso vencer o Leicester esta segunda-feira. O Liverpool ganhou no passado sábado no terreno do Newcastle (2-3) e ficou provisoriamente na liderança da tabela, com mais dois pontos do que o Manchester City: ganhar o último jogo da temporada em casa era por isso obrigatório, até porque a conquista da Premier League ficaria assim à distância de uma vitória no próximo domingo, com o Brighton. Mas do outro lado estava um Leicester que não só foi o responsável por uma das quatro derrotas que o City tem na Liga, que não só venceu o Arsenal na semana passada de forma inequívoca (3-0), como ainda mantém ambições de chegar ao sétimo lugar onde está atualmente o Wolves de Nuno Espírito Santo e que pode dar entrada no playoff de acesso à Liga Europa caso o City conquiste a Taça de Inglaterra.

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Bernardo Silva era titular no City, já que Guardiola só lançava Phil Foden no lugar de Leroy Sané face à equipa que ganhou a Burnley na semana passada, e Ricardo Pereira integrava o onze inicial do Leicester, já que Brendan Rodgers colocava em campo a mesma equipa que anulou o Arsenal. O City começou a partida com o habitual ascendente que o caracteriza mas não conseguiu impôr a esmagadora posse de bola que normalmente encosta as equipas adversárias às cordas e só alivia quando o marcador é inaugurado. O Leicester, que nunca deixou cair muito o bloco e aplicou uma pressão alta o suficiente para dificultar as transições de Bernardo de um lado e Sterling do outro, ia evitando os lances perigosos e até foi o responsável pelas jogadas mais relevantes dos primeiros 20 minutos.

Ricardo Pereira, que ia enchendo o corredor direito do Leicester e foi o melhor da equipa de Brendan Rodgers no primeiro tempo, esteve perto do golo com um remate rasteiro que foi intercetado por Kompany (8′) e depois foi Tielemans, que atirou de fora de área para Ederson encaixar (14′). Pelo meio, Phil Foden ainda rematou à figura de Schmeichel mas o City ia mostrando dificuldades em fazer aquilo que faz melhor: rendilhar o jogo no balcão da grande área adversária até descobrir linhas de passe aparentemente invisíveis que desmancham a organização defensiva da outra equipa. A partir dos 20 minutos de jogo, porém, a equipa de Guardiola entregou a iniciativa a Bernardo Silva, que com o habitual movimento de transitar da direita para a faixa central foi tombando, praticamente sozinho, a direção da partida para a baliza do Leicester. Foi um período de cinco minutos de maior inspiração do jogador português que o City conquistou dois pontapés de canto consecutivos e Agüero viu Schmeichel roubar-lhe o primeiro golo, já que o guarda-redes dinamarquês desviou com a ponta dos dedos o cabeceamento do argentino ao primeiro poste (31′).

Na ida para o intervalo, o Manchester City já estava totalmente por cima do Leicester mas atravessava um período algo desinspirado que não lhe permitia implementar o decisivo jogo entre linhas que costuma resolver as situações mais complicadas. No sofá, o Liverpool ia vendo a equipa de Guardiola fazer muitos cruzamentos, algo que é oposto à sua identidade, e estava à espera de um segundo tempo parecido ao primeiro que permitisse aos reds permanecer na liderança da tabela e depender de si próprios para conquistar a Premier League.

No regresso para a segunda parte, o Manchester City voltou com a mesma escassez de discernimento e o mesmo excesso de ansiedade mas com uma injeção de adrenalina que tornava o ímpeto ofensivo completamente asfixiante para o Leicester. Bernardo Silva, que era mais uma vez o melhor da equipa de Guardiola, ficou ainda mais solto quando Sané entrou para o lugar de Foden e ocupou a esquerda do ataque, deixando Sterling nas costas de Agüero e no apoio direto ao argentino. O City ficou perto do golo através de Sterling (54′) e de Agüero (69′) e o Leicester só respondia no contra-ataque, onde Maguire ia surpreendendo Ederson (63′). A 20 minutos do apito final, numa altura em que Guardiola já ia trocando Sterling e Bernardo, à procura de novas soluções para desbloquear a muralha adversária, foi a palavra de capitão que decidiu dar o passo que pode ser decisivo rumo à conquista da Premier League: Vincent Kompany, o central belga de 33 anos que tem vivido temporadas marcadas por lesões graves e duradouras que o afastaram dos relvados e das principais opções de Guardiola, recebeu a bola a 25 metros da baliza, preparou o remate, aproveitou o espaço e atirou certeiro ao sítio onde as corujas costumam dormir.

O Leicester ainda tentou esboçar uma reação e o Manchester City acabou a partida a sofrer para manter a vantagem mas Kompany foi mesmo o único a inscrever o nome na ficha de jogo — e saiu do Etihad em lágrimas e com os filhos pela mão. A equipa de Bernardo Silva alcançou uma das vitórias mais suadas e esforçadas da temporada graças a um golpe de inspiração do capitão e está agora a uma vitória (ou a um resultado igual ao que fizer o Liverpool com o Wolves) de conquistar a Premier League e sagrar-se bicampeã inglesa.