A Guerra dos Tronos caminha inexoravelmente para o seu final e, ao longo destes oito anos, há uma personagem, daquelas mesmo importantes, que é bem capaz de ter ficado esquecida. OK, não será exatamente uma personagem de carne e osso, nem viva nem sequer morta, mas antes um instrumento, um objeto inanimado que ganha vida nas mãos de quem o tem utilizado. E a última vez que alguém pegou nele deu cabo dos mortos. Todos.

Trata-se, obviamente, do punhal com que que, no clímax do terceiro episódio da oitava e última temporada, Arya Stark “matou” (entre aspas porque será que podemos, na realidade, matar alguém que já está morto?) o Night King e, por arrasto, os restantes milhões de zombies na única cena do episódio em que se conseguiu ver, de facto, alguma coisa…

[a morte do Night King:]

https://www.youtube.com/watch?v=MuUyIKWkBfg

A história do punhal de aço valiriano não terá ainda chegado ao fim já que, no mais recente episódio, o quarto, deixámos Arya a caminho de Kings Landing para cumprir o seu destino e riscar o último nome da sua lista: a malvada Cersei Lannister. Do rol falta ainda o Montanha Clegane mas será provável que seja o irmão da criatura que foi remendada pelo agora Mão da Rainha, Qyburn – uma espécie de doutor Frankenstein –, o esfacelado The Hound Clegane, a tratar do assunto, que é para isso que ele chegou vivo à temporada final.

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Isto, claro, se for mesmo Arya Stark a tratar da saúde de Cersei, porque candidatos não faltam, a começar pela outra rainha, Daenerys Targaryen, e a acabar no irmão Jaime, que por estes dias também já vai a caminho da capital depois de ter abandonado Brienne de Tarth no frio de Winterfell. E se, antes, até poderíamos pensar que Cersei poderia nem sequer morrer e sair vencedora disto tudo, a previsibilidade que, para já, a última temporada tem oferecido não deixa dúvidas: a rainha má vai ter de morrer e não vai ser bonito.

E, para já, o punhal que agora pertence a Arya Stark assume-se como arma provável para encaminhar Cersei para o seu criador, culminando uma longa história que começou precisamente na primeira temporada e que, pedindo emprestado o lema de um certo anel de uma outra fantasia de sucesso, poderá muito bem vir a ser a história de “um punhal para todos trespassar”.

Voltemos, então, à temporada inaugural da “A Guerra dos Tronos” e à primeira participação do dito punhal que, diga-se, foi um completo fracasso, já que falhou a missão de que tinha sido encarregue: matar Bran Stark. Em seu favor tem o facto de ter sido entregue a um assassino anónimo e manifestamente incompetente que acabou na boca do lobo do jovem Stark.

Na altura, toda a gente deu de barato que tinham sido os Lannister a ordenar a execução para acabar o que Jaime tinha começado quando atirou Bran do alto da torre de Winterfell, mas a verdade é que a arma, feita de aço valiriano e com um punho de osso de dragão, pertencia ao insidioso Petyr Baleish. Após a falhada tentativa de assassinato, Littlefinger acusa Tyrion Lannister de ser o mandante do crime, afirmando que perdera o punhal para Tyrion numa aposta, e a arma passa para as mãos de Catelyn Stark que, pelo caminho, captura Tyrion e leva-o para o castelo da maluca da irmã para que o filho indesejado de Tywin Lannister seja julgado por um crime que, convenhamos, já toda a gente sabia que ele não cometera.

E é assim, por causa de um miserável punhal, que começa a Guerra dos Cinco Reis, iniciando um círculo que, para já, acabou com o fim de outra guerra, contra o exército dos mortos.

[a tentativa de assassinato de Bran Stark:]

Bran sobreviveu e como Lady Catelyn não tinha uso para dar ao punhal, dá-o ao marido, Ned Stark, acabado de chegar a Kings Landing para ser a Mão do Rei Robert Baratheon. O patriarca dos Stark, já se sabe, nem chega a aquecer o lugar e acaba traído pelo Littlefinger que, depois lhe rapinar o punhal, o encosta à garganta de Ned enquanto consuma a traição. E, durante meia dúzia de temporadas, o punhal permanece sossegado e longe da vista na posse do desprezível Baelish até que, na sétima temporada, chegamos à Citadela, onde Samwell Tarly estuda para ser um Meister e lê um livro sobre a Longa Noite, para os leigos o anterior e infindável Inverno.

Na série da HBO, reparamos no desenho do punhal no livro que Sam está a ler mas é preciso ir para os livros de George R. R, Martin para termos a verdadeira e completa perspetiva histórica da importante arma. E é como se segue:

“Os valirianos estavam familiarizados com o vidro de dragão muito antes de chegarem a Westeros. Chamavam-no de ‘zīrtys perzys’, que se traduziu em ‘fogo congelado’ em valiriano, e contos orientais contam como os dragões derretiam a pedra com até que ela se fundisse e fosse maleável. Os valirianos usaram-na então para construir os seus estranhos monumentos e construções sem as juntas dos nossos castelos modernos. Quando Aegon, o conquistador, forjou os Sete Reinos, ele e os seus descendentes costumavam decorar as suas espadas com vidro de dragão, sentindo uma ligação com a pedra. A moda real da ornamentação com vidro de dragão logo se espalhou pelos Sete Reinos para aqueles que fossem ricos o suficiente para pagá-la.”

Baelish acaba por oferecer a Bran Stark o punhal que quase o matou, mas este, agora a viver uma vida paralela como o Corvo de Três Olhos, não tem obviamente grande uso para lhe dar e passa-o para as mãos da irmã Arya na presença de Sansa Stark, que nota e bem que Littlefinger nunca dá nada de graça. Mas ninguém escapa ao karma, nem mesmo em Westeros, e o punhal acaba por ser a arma com que Arya cumpre, no episódio final da sétima temporada, a ordem de execução de Petyr Baleish, proferida pela irmã Sansa, quando finalmente se percebe que a ordem para assassinar Bran Stark foi, provavelmente, dada pelo próprio Littlefinger, o mais maquiavélico de todos os personagens de “A Guerra dos Tronos”.

[a morte de Littlefinger:]

https://www.youtube.com/watch?v=ExkPxHxcP3Q

E assim chegamos finalmente à temporada final e ao golpe de ninja com que Arya Stark destrói o rei dos mortos que, convenhamos, pareceu demasiado surpreendido para quem parecia estar sempre muitos passos à frente dos vivos. Logo veremos, nos dois episódios que faltam para acabar A Guerra dos Tronos – e antes da chegada das prometidas sequelas – se a história do punhal de aço valiriano com cabo de osso de dragão ficará por aqui.