Não são inéditas as histórias de guarda-redes que correm até à área contrária no último minuto de um jogo e acabam por marcar golos decisivos. Também são novas as histórias de guarda-redes que defendem o penálti que coloca as respetivas equipas numa final depois de um jogo em que estiveram a perder. E também não são surpreendentes as histórias de guarda-redes que trocam as balizas pela marca de penálti para bater um dos remates certeiros que acaba por valer a vitória. Nada disto é inédito, novo ou surpreendente. Mas há precisamente 15 anos, a 24 de junho de 2004, Ricardo fez algo que dificilmente terá paralelo no mundo do futebol.

Depois de terminar no primeiro lugar do grupo A do Campeonato da Europa 2004, Portugal encontrava Inglaterra nos quartos de final, que por sua vez tinha ficado no segundo lugar do Grupo B, com menos um ponto do que a seleção francesa. O conjunto português, orientado por Luiz Felipe Scolari, defrontava o inglês, às ordens de Sven-Göran Eriksson e com uma equipa que incluía Gerrard, Lampard, Scholes e Beckham. Na última semana do mês de junho, no Estádio da Luz, Michael Owen aproveitou um mau alívio de Costinha para colocar Inglaterra em vantagem logo aos três minutos: seria um jogo totalmente em formato remontada para Portugal.

Scolari levou a Seleção Nacional a uma final pela primeira vez na história da equipa portuguesa

O empate chegou já nos últimos dez minutos do tempo regulamentar, aos 83′, quando Simão Sabrosa cruzou na esquerda para um cabeceamento certeiro de Hélder Postiga. O jogo foi para prolongamento e Rui Costa correu, correu e correu até chegar à entrada da grande área de David James, de onde atirou para o 2-1. A Luz explodiu mas gelou apenas cinco minutos depois, quando Lampard apareceu praticamente sozinho no seguimento de um pontapé de canto para voltar a empatar o resultado. Ao fim de 120 minutos de jogo, continuava tudo empatado entre Portugal e Inglaterra.

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David Beckham foi o primeiro a bater uma grande penalidade e atirou para a bancada, ficando a olhar para trás e para o pedaço de relva que ficou levantando na marca de penálti. Deco marcou, Owen também, Simão não falhou e Lampard também cumpriu. Seguiu-se Rui Costa, que à semelhança de Beckham também atirou por cima e também ficou a olhar para o relvado. Depois de Cristiano Ronaldo, John Terry, Maniche, Hargreaves, Hélder Postiga (com direito a Panenka) e Ashley Cole acertarem, era a vez de Vassell. No regresso à baliza para tentar defender a sétima grande penalidade dos ingleses, Ricardo tirou as luvas e preparou-se com as mãos descobertas. O então avançado do Aston Villa atirou para a esquerda do então guarda-redes do Sporting e Ricardo defendeu.

Nesta altura, bastava a Portugal marcar o penálti seguinte para carimbar o apuramento para as meias-finais do Europeu. Era preciso escolher alguém que assumisse toda a responsabilidade mas houve quem tomasse esse passo e carregasse o peso às costas. Depois de defender sem luvas, Ricardo bateu David James, marcou a grande penalidade decisiva e colocou a Seleção Nacional na fase seguinte. O resto é história: Portugal eliminou a Holanda com um golo de Ronaldo e outro de Maniche e perdeu na final com a Grécia graças a um golo solitário de Charisteas. A memória é dura de recordar pela desilusão na final mas o voo sem luvas de Ricardo vai ficar sempre nas páginas mais bonitas da seleção portuguesa.