A primeira Lei de Bases da Habitação foi aprovada esta sexta-feira, em votação final global, na Assembleia da República, com os votos a favor de PS, PCP, BE, PEV e PAN, e os votos contra de PSD e CDS-PP.
Após a votação em plenário, os grupos parlamentares do PS, PCP, BE, PSD e CDS anunciaram a apresentação de uma declaração de voto oral.
O diploma aprovado foi consensualizado entre os deputados do grupo de trabalho parlamentar da Habitação, Reabilitação Urbana e Políticas de Cidades, no âmbito do processo de apreciação dos projetos de lei de PS, PCP e BE para a criação da Lei de Bases da Habitação, que suscitaram cerca de uma centena de propostas de alteração, apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares, incluindo PSD e CDS-PP.
A favor deste diploma, o grupo parlamentar do PS, que suscitou o tema com a apresentação de um projeto de lei, em abril de 2018, da autoria da deputada independente do PS Helena Roseta, aceitou retirar a sua iniciativa legislativa, assim como PCP e BE, que também tinham projetos próprios.
“O Estado é o garante do direito à habitação”, lê-se no diploma da Lei de Bases, indicando que “todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”.
Além da “efetiva garantia desse direito a todos os cidadãos”, o diploma estabelece a função social da habitação, em que “os imóveis ou frações habitacionais detidos por entidades públicas ou privadas participam, de acordo com a lei, na prossecução do objetivo nacional de garantir a todos o direito a uma habitação condigna”.
Entre as medidas que compõem a Lei de Bases, destaca-se a criação do Programa Nacional de Habitação e da Carta Municipal de Habitação, assim como a proteção no despejo e a integração do direito à habitação nas políticas de erradicação de pessoas em condição de sem-abrigo.
O Estado deve acelerar os processos judiciais de heranças indivisas que incluam bens imóveis com aptidão habitacional, a possibilidade da entrega da casa às instituições bancárias para extinguir a dívida no crédito à habitação e a regulação e fiscalização da atividade dos condomínios são outras das medidas que incluem a proposta para a Lei de Bases da Habitação.
Após promulgação pelo Presidente da República, o diploma entra em vigor “no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação” no Diário da República, dando “um prazo de nove meses” para adaptação da Lei de Bases da Habitação ao quadro legal e regulamentar.
PS, PCP e BE classificam como “histórica” aprovação da Lei de Bases da Habitação
A aprovação da primeira Lei de Bases da Habitação foi considerada como “histórica” por PS, PCP e BE, apesar de admitirem que se podia ter ido mais longe, enquanto PSD e CDS-PP alertam para a instabilidade legislativa.
Da bancada do PS, a deputada independente Helena Roseta classificou esta votação como “histórica”, defendendo que a Lei de Bases cria as condições para que “o direito à habitação seja uma realidade para todas as pessoas que vivem em Portugal”.
Lembrando as audições e contributos recebidos, Helena Roseta disse que a elaboração do diploma foi resultado de 304 votações, em que 178 propostas mereceram aprovação, algumas aprovadas por unanimidade, destacando o processo “transparente” em que decorreram os trabalhos.
Neste sentido, a deputada independente, autora da primeira iniciativa legislativa neste âmbito, apresentada em abril de 2018, afirmou que a Lei de Bases da Habitação “não é património de nenhum partido”, ressalvando também que “não vai dar casa a ninguém, mas representa um passo para garantir esse direito”.
Helena Roseta acautelou, ainda, que a concretização da Lei de Bases da Habitação implica “rever e compatibilizar legislação avulsa”, pelo que “não é de um dia para o outro” que dará resultados.
Para a deputada do PCP Paula Santos, “este é um dia muito importante, porque foi possível aprovar a primeira Lei de Bases da Habitação”, que visa concretizar o direito à habitação e que “o Estado assuma as suas responsabilidades”.
“Foi possível com o contributo decisivo do PCP”, reclamou a comunista, reconhecendo que se podia ter ido “mais longe” em algumas matérias.
A mobilização do património público para garantir o direito à habitação, a proteção no despejo, a impenhorabilidade da habitação e a possibilidade da entrega da casa para extinção da dívida ao banco foram algumas das medidas destacadas por Paula Santos, assegurando que o PCP vai continuar “a intervir e a lutar para que o direito à habitação seja uma realidade para todos”.
Do grupo parlamentar do BE, Maria Manuel Rola congratulou-se com a viabilização da Lei de Bases, sustentando que “coisas básicas e óbvias como a função social da habitação deixam de ser senso comum e ficam plasmadas em lei”.
Apesar de concordar que se podia “ter ido mais longe”, a bloquista declarou que esta “é uma boa Lei de Bases, histórica e de esquerda”, exigindo “determinação ao PS” para que haja uma resposta concreta, “sem recuos”.
Apoiando as palavras de Helena Roseta, a deputada do BE advertiu que a Lei de Bases “não dará de facto casa a ninguém”, mas pode garantir “um futuro em que ninguém ficará sem casa, e isso será uma grande vitória”.
Referindo que “o PSD participou ativamente” na discussão da Lei de Bases, Jorge Paulo Oliveira discordou do resultado final, porque o diploma aprovado “legisla sobre aquilo que já estava legislado” e dá cobertura a medidas como o congelamento das rendas, a renovação automática dos contratos de arrendamento, a proibição dos despejos, o ataque ao alojamento local e as mudanças do regime do arrendamento apoiado.
Assim, o PSD está contra o “carácter genérico” da Lei de Bases da Habitação, em que “cabe tudo e o seu contrário”, num diploma que “não oferece certeza, nem segurança”, antecipando como consequência “menos casas para arrendar e casas cada vez mais caras”.
Da parte do CDS-PP, Nuno Magalhães criticou a falta de oferta pública de habitação, que representa apenas 2%, recordando que o trabalho do anterior Governo PSD/CDS-PP visava o aumento do parque habitacional público.
“O atual Governo, em quatro anos, nada fez para resolver a crise da habitação em Portugal”, apontou o centrista, argumento que os princípios da Lei de Bases da Habitação são muito importantes, “mas já estão há muito plasmados na ordem jurídica”.
Antecipando o falhanço da Lei de Bases, Nuno Magalhães reforçou que “o que os portugueses precisam é de resposta”, alertando que a Lei de Bases “nada mais faz do que introduzir instabilidade” e lamentando que, em quatro Orçamentos do Estado, não tenha existido verba suficiente para a habitação.