Rui Rio e André Silva não se conheciam, nem nunca se tinham visto, até se terem cruzado esta segunda-feira nos estúdios da RTP para um debate de pré-campanha. Talvez por isso, ou por não se antever, à partida, nenhuma relação futura entre os dois, este acabou por ser o debate mais aguerrido de todos até aqui.

Políticas de ambiente, transição energética, serviço nacional de saúde para animais, fim do abate dos animais em canis, emergência climática, ou descarbonização da economia: foi o PAN que ditou as regras do jogo, com o debate a centrar-se inteiramente na agenda daquele partido. Rui Rio ainda tentou lembrar que o PAN “ainda não era nascido” quando já o PSD andava a defender o ambiente, sendo que o primeiro secretário de Estado do Ambiente que alguma vez se sentou num governo português era do PSD, mas André Silva pediu medidas concretas e adequadas ao século XXI. Porque isso, disse, “é ecologiazinha dos anos 80″.

Sem pinças nem falas mansas, tanto Rui Rio como André Silva não se pouparam em acusações um ao outro: “fundamentalista” ou “partido de nicho”, chamou Rio; “não tem uma única proposta sobre a proteção animal” e “tem uma visão da economia do século passado”, acusou André Silva referindo-se ao programa do PSD, que, desconfia Rio, na verdade não leu.

Encontrando-se aqui e ali em temas de princípio, como a defesa “proclamatória” dos direitos dos animais ou a assunção de que vivemos em estado de “emergência climática” — nisso, Rio até com o Bloco de Esquerda concorda quando diz que “não há Planeta B” — a verdade é que se Rui Rio chegasse ao governo e precisasse de interlocutores para dialogar, era muito pouco provável que olhasse para o PAN. “Conversar, podemos conversar sempre, mas era difícil sermos parceiros”, disse o líder do PSD, opondo sempre a “moderação”, o “bom senso” e o “equilíbrio” dos sociais-democratas, ao “extremismo” e “fundamentalismo” do partido das Pessoas, Animais e Natureza.

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Mas André Silva estava preparado para atacar. Acusando o PSD de “não ter uma estratégia sólida para a transição energética e para a descarbonização da economia”, o líder do PAN fugiu sempre às perguntas do jornalista sobre se o PAN fez “contas” ao custo das medidas que propõe, dizendo apenas que se “podem aproveitar infraestruturas e apoios já existentes”, e até lembrou a Rio de que o PSD votou ao lado do PAN a medida legislativa para acabar com o abate de animais em canis.

“Vou gastar dinheiro num SNS para animais quando tenho o SNS para as pessoas no estado em que está?”

Quando questionado sobre a proposta do PAN de criar um serviço nacional de saúde para animais, Rui Rio discordou totalmente da ideia, defendendo que antes de tratar de um SNS para animais é preciso melhorar o SNS para as pessoas. Segundo o líder do PSD, é preciso inverter a ordem, dando, primeiro, condições económicas aos idosos que vivem sozinhos com um animal de companhia para tratarem desse mesmo animal, em vez de o Estado dar ajudas a esse mesmo idoso por ter um animal.

“Vou gastar dinheiro num SNS para animais quando tenho o SNS para as pessoas no estado em que está?”, atirou Rui Rio, com André Silva a limitar-se a responder que “podemos fazer as duas coisas em simultâneo” e a acrescentar que a ideia do SNS para animais de companhia se trata apenas de “um pequeno investimento”. Mas não quantificou.

Certo é que Rui Rio não conseguiu puxar André Silva para temas que ele próprio domina, tendo sido sempre André Silva a puxar o presidente do PSD para os temas que são a sua praia. E quando Rui Rio tentava explicar por ‘a’ mais ‘b’ que o PSD tem uma tradição de defesa do ambiente, nomeadamente devido a Carlos Pimenta, que foi o primeiro secretário de Estado com essa pasta, André Silva atirou-lhe com o facto de isso ter sido “no século passado” (“estamos no século XXI e o PSD não tem um projeto para descarbonizar a economia”), e empurrou-lhe uma série de questões — “como?” “que propostas concretas defendem?” — obrigando Rui Rio a ir atrás.

De tal maneira que, na última pergunta, quando ambos foram desafiados a dar um exemplo de algo que tenham mudado na sua vida em função da defesa do ambiente, Rui Rio chegou ao ponto de mostrar um talão de uma transferência bancária. Fê-la hoje, às 15h15, na caixa multibanco ao pé da sua casa, no Porto: “Paguei 1282 euros para mudar a caldeira da minha casa para uma mais moderna que produz menos monóxido de carbono”. “Tenho aqui o comprovativo da transferência bancária, foi este o meu contributo”, disse. Já André Silva disse que “anda de transportes públicos” e “não come carne nem produtos de origem animal”.