Vários países do sul de África ponderam retirar-se da convenção sobre comércio internacional de espécies ameaçadas perante a recusa de flexibilização das normas de comércio de espécies como o elefante ou o rinoceronte.

Namíbia, Tanzânia, Botsuana e Zimbabué figuram entre os países que manifestaram desagrado por considerarem que, durante a última reunião da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Fauna e Flora (CITES), em agosto, as suas reclamações foram ignoradas e não foram tidos em conta os esforços necessários à preservação da fauna.

Os signatários da CITES — onde se incluem 182 países e a União Europeia — recusaram, por maioria, os pedidos de eSwatini (antiga Suazilândia) e da Namíbia para que fosse autorizado o comércio de rinocerontes brancos e dos seus cornos, aos quais se atribuem propriedades medicinais e que atingem preços astronómicos no mercado ilegal asiático.

Recusada foi também uma proposta para flexibilizar as restrições sobre o comércio de produtos de elefante — espécie catalogada como vulnerável — apresentada por vários países da África meridional, como o Zimbabué, que afirma ter armazenado marfim num valor estimado de mais de 500 milhões de euros, bem como uma sobrepopulação de elefantes.

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“É uma grande quantidade de dinheiro que poderíamos usar para grandes projetos. Debate-se sobre os nossos animais selvagens em Genebra, um lugar irrelevante para os animais”, disse o Presidente do Zimbabué, Emmerson Mnangagwa, cujo país atravessa uma profunda crise económica.

A CITES protege cerca de 36 mil espécies animais e vegetais em todo o mundo, com 900 classificadas no índice 1, que proíbe totalmente o seu comércio. Os elefantes africanos estão incluídos nesta classificação, exceto as populações do Botsuana, Namíbia, África do Sul e Zimbabué, que devido à sua dimensão estão classificadas no índice 2, menos restritivo. Ainda assim, o comércio de marfim é uma exceção a que se aplicam as regras do índice 1 para não fomentar a caça furtiva.

“O consenso expresso através da CITES pela maioria dos estados prejudica os esforços da nossa região para assegurar a justiça social mediante o uso sustentável dos nossos recursos naturais”, afirmou, por seu lado, John Magufuli, chefe de Estado da Tanzânia e atual presidente da Comunidade para o Desenvolvimento da África Meridional(SADC). Nesse sentido, vários países defendem que deve ser equacionada a conveniência de manter a CITES e pretendem analisar a questão no contexto da SADC, que integra 16 países.

Alguns países defendem que as normas são demasiado protecionistas e sujeitas a opiniões de governos e grupos de pressão ocidentais. Posição diferente têm países da região como o Quénia, que se afirma contrário à flexibilização das normas de proteção.

O diretor de políticas de fauna da organização World Wildlife Found (WWF), Colman O’Criodain, lamentou as divisões entre os países do sul da África e os restantes, mas considerou que “muitos estão a fazer um bom trabalho na gestão da fauna selvagem”.

Para o especialista, os países “estão melhor dentro da convenção porque podem ser parte do processo de tomada de decisões”.

Uma retirada da convenção implicaria perder o direito a comercializar com qualquer outro país dentro da CITES, uma vez que os estatutos apenas permitem aos seus membros a troca de fauna e flora regulada.

“Há a expectativa de que se lhe fosse permitido exportar marfim, haveria países dispostos a comprá-lo, mas isso não é assim. A China proibiu o comércio nacional e os países que se mostraram interessados no passado teriam de mudar primeiro a sua legislação”, explicou O’Criodain. O Japão seria, assim, o único potencial importador, segundo este especialista.