A publicação do Relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) que mostra Portugal no restrito grupo dos quatro países da Região Europeia que diminuiu a despesa em saúde pública entre 2000 e 2017 já espoletou críticas por parte dos profissionais do setor. O Sindicato Independente dos Médicos e a Ordem dos Enfermeiros não poupam o executivo de António Costa, acusando-o de estar a destruir o Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O primeiro a ser ouvido nesta manhã pela Rádio Observador foi o presidente de um dos maiores sindicatos de médicos do país. Jorge Roque da Cunha, do Sindicato Independente dos Médicos, acusa o Governo de usar o SNS para fazer “propaganda”, não tendo dúvidas de que a realidade é bem diferente daquilo que o executivo socialista tem feito ao longo dos últimos quatro anos. “Aquilo que sentimos nos serviços é a carência de equipamentos e a carência de recursos humanos e isso surge agora plasmado num relatório independente”.
“Temos apelado ao Ministério da Saúde e ao Ministério das Finanças para que façam menos propaganda e que exijam ao senhor Primeiro Ministro que as proclamações de amor ao Serviço Nacional de Saúde sejam concretizadas“, continua Roque da Cunha. As cativações de Mário Centeno também fazem parte da lista de críticas dos médicos porque representam “um investimento no SNS inferior ao do tempo da troika“.
Solicitado a explicar o que está mal nos hospitais públicos, o presidente do Sindicato Independente dos Médicos avança com as listas de espera que “nunca foram tão grandes como agora”, continuando para a “dívida a fornecedores que atingiu valores elevados”, algo que diz ser injustificado porque, diz, “nunca pagámos tantos impostos como agora”.
Quem também reagiu ao relatório da OMS que coloca Portugal no mesmo grupo que a Irlanda, a Hungria e Israel foi a bastonária da Ordem dos Enfermeiros. Ana Rita Cavaco diz não estar surpreendida com as conclusões: “Para nós isto não é novidade e para a maioria dos portugueses também não deve ser porque Portugal sempre foi dos países que menos gastou do seu Produto Interno Bruto (PIB) em investimentos na saúde”.
A bastonária entende que a contratação de novos profissionais deve ser uma prioridade para inverter estes dados, especialmente no que diz respeito aos enfermeiros. “Vários estudos dizem que quanto menos enfermeiros tivermos, mais a taxa de mortalidade aumenta”, revela Ana Rita Cavaco.
Sobre responsabilidades, a bastonária não tem dúvida de que este é um problema que atravessa vários governos: “há 20 anos que se faz este desinvestimento, mas nós gostávamos de saber qual é o plano a longo e médio prazo porque infelizmente nós não vemos plano nenhum“.
Para a OMS é na prevenção que pode estar a chave dos gastos com saúde dos estados: “Muitas intervenções na promoção da saúde e prevenção da doença são bastante custo-efetivas e poupam dinheiro e recursos no curto, médio e longo prazo”, refere o documento revelado nesta terça-feira.
Tanto o Presidente do Sindicato Independente dos Médicos como a Bastonária da Ordem dos Enfermeiros não têm dúvidas em concordar com a organização. Roque da Cunha diz que “tudo aquilo que se faça para promover uma alimentação mais saudável, o combate à obesidade, o combate ao tabagismo e a promoção da atividade física, são fundamentais para que a saúde seja melhor e as pessoas recorram menos ao SNS”.
Ana Rita Cavaco segue a mesma linha: “Se não houver um investimento nos cuidados de saúde primários e na prevenção, vamos gastar mais dinheiro a tratar as pessoas que acabam por chegar à situação de doença”.
CDS também reagiu
Em reação ao relatório da OMS, Isabel Galriça Neto, deputada do CDS e coordenadora do Grupo Parlamentar da Saúde, expressou a “preocupação” do partido centrista em relação à redução do investimento na saúde pública.
A deputada acusou o Governo socialista, apoiado pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, de anunciar verbas, “mas que depois não são executadas”, limitando “muito do investimento que foi prometido e anunciado”.
Relativamente à questão da saúde o problema não passa apenas por investimento. Passa também por organização e por formas de gestão”, acrescentou.
Em declarações ao Observador, Isabel Galriça Neto defendeu “um estado social de base alargada, em que não sejam os portugueses a ter que pagar a saúde do seu bolso. Com uma articulação entre os setores social, privado e público para se poder otimizar a prestação dos cuidados de saúde”.
“O sistema público está claramente a evidenciar que não tem capacidade de resposta. O que é visível nos agravamentos dos tempos de espera para consultas, cirurgias e internamentos”, denunciou.
A deputada centrista lembrou, ainda, que o atual Governo, no início do mandato, disse que a austeridade já tinha acabado e que ia fazer investimentos na saúde. “Passados quatro anos o que se vê na realidade é que os investimentos não se concretizaram”, acusou.