O Tribunal Supremo espanhol não deu razão ao recurso interposto pela família de Francisco Franco, decidindo assim de forma definitiva que o corpo do antigo ditador que governou Espanha entre 1939 e 1975 deve ser exumado da capela do Vale dos Caídos.

A decisão foi tomada por unanimidade pelos seis juízes do Tribunal Supremo que apreciaram o recurso colocado pela família de Franco, refere a rádio Cadena Ser.

A exumação de Franco foi uma das primeiras medidas a serem anunciadas pelo governo de Pedro Sánchez, pouco depois de ter tomado posse em junho de 2018.

Em declarações àquela rádio, a vice-Presidente de Governo, Carmen Calvo, disse que o executivo em funções vai “tentar muito, por todos os meios” que a exumação aconteça ainda antes das eleições antecipadas, previstas para 10 de junho. Aquela governante socialista referiu ainda que o Governo tentará fazer a exumação “muito antes da campanha eleitoral” de maneira a evitar que esta traga “efeitos políticos”.

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De acordo com o El País, o governo espanhol quer conseguir a exumação de Franco antes das eleições antecipadas, previstas para 10 de novembro. A exumação pode mesmo vir a acontecer nas vésperas daquela ida às urnas.

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A decisão surge depois de uma longa batalha jurídica, que opôs o governo socialista de Pedro Sánchez e a família do ditador, que se opõe à sua exumação.

Além disso, a família de Franco não verá também respeitada a sua escolha de, no caso de uma exumação, os restos mortais do ditador serem sepultados no jazigo da família na Catedral de La Almudena, em Madrid. Essa opção contou com a oposição do Governo espanhol — e também do Tribunal Supremo —, que evocou a falta de segurança daquele espaço, visitado por centenas de pessoas diariamente.

A família de Franco anunciou esta terça-feira que vai recorrer junto do Tribunal Constitucional contra o veto para enterrar os restos do seu familiar na Catedral de La Almudena — ação esta que não tem o poder de suspender ou atrasar a execução da sentença do Tribunal Supremo.

A próxima barreira para a exumação de Franco será agora o abade do Vale dos Caídos, que já fez saber que se opõe à exumação dos restos mortais de Franco, cujo corpo está sepultado na capela daquele monumento nos arredores de Madrid.

No entanto, a Igreja não deverá ser um impedimento para que se avance com a exumação de Franco, uma vez que a vice-Presidente de Governo em funções conseguiu da parte do Vaticano o compromisso de que agiria em “pleno respeito da soberania do Estado espanhol e do seu sistema legal”.

Carmen Calvo desconsiderou ainda o facto de neste momento a licença de obras no Vale dos Caídos estar suspensa, após um pedido tramitado pela Fundação Francisco Franco. Em fevereiro deste ano, foi aprovada suspensão da licença de obras, com um juiz então a determinar que “falta uma análise rigorosa quanto à segurança, estabilidade e instalações subterrâneas que podem existir debaixo da sepultura de Franco”. A vice-Presidente de Governo em funções desvalorizou esta apreciação, referindo que a decisão de exumar o ditador foi agora aprovada pela mais alta instância da justiça espanhola, e tudo isto depois de ter sido aprovada em conselho de ministros e no Congresso dos Deputados. “É lei julgada”, rematou, em declarações à Cadena Ser.

A campa de Franco não é um assunto morto, nem enterrado. E está a dividir Espanha

A exumação de Franco passou a ter valor de lei em setembro de 2018, quando o Congresso dos Deputados aprovou uma alteração à Lei da Memória Histórica que permitisse a retirada dos restos mortais do ditador do Vale dos Caídos. O decreto-lei foi aprovado com 172 votos a favor (incluindo o PSOE, o Unidos Podemos e todos os partidos regionalistas, incluindo os independentistas catalães da ERC e do PDeCAT, entre outros), 164 abstenções (PP e Ciudadanos) e dois votos contra, de dois deputados do PP, que dizem ter votado assim por engano.

Vox: “Começa a campanha socialista”

À altura da votação no Congresso dos Deputados, o Vox, partido de extrema-direita, ainda não estava no Congresso dos Deputados. Depois da decisão do Tribunal Supremo anunciada esta terça-feira, o Vox foi o primeiro partido a pronunciar-se. Entre os partidos espanhóis com representação parlamentar, o Vox é o único que se opõe totalmente à exumação de Franco, ao passo que PP e Ciudadanos adotam posições mais ambíguas.

“Começa a campanha socialista: profanar campas, desenterras ódios, questionar a legitimidade da monarquia. Só Vox se oporá frontalmente, porque só o Vox tem valor para defender a liberdade e o senso comum perante o totalitarismo e os truques de propaganda eleitoral”, escreveu o líder do Vox no Twitter.

No lado oposto ao Vox, o líder do Podemos e da coligação Unidas Podemos, Pablo Iglesias, saudou a exumação de Franco como “um passo importantíssimo para reparar uma vergonha que carregámos durante 40 anos de democracia”. “Uma conquista que devemos aos familiares das vítimas da ditadura. Continuaremos a lutar pela memória, pela verdade e pela justiça”, concluiu.

Pedro Sánchez fala em “vitória da democracia espanhola”

Numa curta mensagem publicada no Twitter, o primeiro-ministro espanhol considerou a decisão do tribunal esta terça-feira “uma grande vitória da democracia espanhola”. “A determinação em reparar o sofrimento das vítimas do franquismo guiou sempre a ação do Governo”, garantiu Pedro Sánchez.

O primeiro-ministro terminou a sua mensagem com três palavras: “Justiça, memória e dignidade”.