A líder do governo de Myanmar, Aung San Suu Kyi, já está no Tribunal Internacional de Justiça, em Haia, para o primeiro de três dias de audiências em que deverá defender os líderes militares do país contra as acusações de genocídio da minoria muçulmana rohingya no país, formuladas já em 2018 pelos investigadores das Nações Unidas.

Desde agosto de 2017, altura em que começou aquela que a Human Rights Watch classifica como uma “campanha de limpeza étnica levada a cabo pelos militares” do país, terão sido mais de 730 mil os rohingya obrigados a fugir da antiga Birmânia para o vizinho Bangladesh. Segundo os Médicos Sem Fronteiras, só no primeiro mês desde o início da ofensiva, cerca de 9 mil rohingya terão sido assassinados.

Quem são os rohingyas e por que fogem de Myanmar?

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À porta do edifício do Tribunal Internacional de Justiça, na cidade costeira holandesa e à espera de Aung San Suu Kyi, estavam várias dezenas de pessoas, entre as quais três mulheres, sobreviventes rohingya, que viajaram desde o campo de refugiados de Kutapalong, no Bangladesh, relata o Guardian.

“Estão à procura de justiça e este é o primeiro e o mais importante passo. Elas representam a sua comunidade. Para elas ver Aung San Suu Kyi no tribunal é um momento muito poderoso. Ficaram chocadas quando a ouviram defender os militares. Aung San Suu Kyi não fez nada para parar os assassinatos. Na altura, ela podia ter pedido ajuda à comunidade internacional. E agora, como o derradeiro insulto, ela vem ao tribunal defender o comportamento do exército“, disse ao diário britânico Antonia Mulvey, ex-investigadora das Nações Unidas para a violência e fundadora da organização não governamental Legal Action Worldwide, que custeou a deslocação das sobreviventes rohingya desde o Bangladesh até à Europa.

Aung San Suu Kyi, galardoada em 1991 com o Prémio Nobel da Paz e durante anos tida como símbolo de luta pacifista pró democracia, só deverá dirigir-se ao tribunal esta quarta-feira. Para já, vai ouvindo as intervenções de Abubacarr Marie Tambadou, ministro da Justiça e procurador-geral da Gâmbia, país que deu origem ao processo internacional contra Myanmar — e a que a líder do governo, no cargo desde 2016, responderá de forma voluntária.

“Está a desenrolar-se outro genocídio mesmo à frente dos nossos olhos, mas não fazemos nada para o parar. Isto é uma mancha na nossa consciência coletiva. O estado de Myanmar não é o único que está aqui a ser julgado, a nossa humanidade coletiva também está em tribunal”, acusou o gambiano.