Depois de uma pausa de duas semanas devido às férias judiciais, o Tribunal de Monsanto voltou a receber esta segunda-feira o julgamento do caso de Alcochete. Nesta 16.ª sessão, foram ouvidos como testemunhas do Ministério Público Márcio Sampaio, na altura recuperador físico dos leões que acompanhou de seguida Jorge Jesus para o Al-Hilal e para o Flamengo, e Rui Patrício, guarda-redes internacional do Wolverhampton que foi um dos agredidos na invasão à Academia. André Pinto, central que joga atualmente no Al Fateh da Arábia Saudita e que deveria também falar hoje, adiou o depoimento para a manhã de quarta-feira por se encontrar em viagem.

Este acabou por ser um dia quase de viragem no julgamento do caso de Alcochete. Por um lado, pela declaração de Márcio Sampaio que Bruno de Carvalho terá dito na reunião com os elementos técnicos, deixando a ideia de que teria evitado algo que estava a ser preparado. Por outro, pelo longo depoimento de Rui Patrício que entrou pela primeira vez de forma mais aprofundada na relação entre jogadores e então presidente do Sporting sobretudo depois da derrota dos leões em Madrid frente ao Atlético e que confirmou outros pontos mais ou menos ligados ao processo como o clima de tensão nas reuniões de abril em Alvalade e na Academia, o cortar de relações que teve com o número 1 do clube ou a recusa de um prémio de 500 mil euros antes do jogo com o Benfica.

[O resumo do dia 15 do julgamento do caso de Alcochete]

Dia 15 de Alcochete. Medo de Coates, alarmes de Battaglia e as reuniões com gritos, questões pessoais e tom intimidatório

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Rui Patrício: “Entraram a chamar nomes e a dizer ‘Vamos matar-vos'”

A sessão vespertina, inicialmente marcada para as 14h, sofreu um atraso de quase uma hora devido a complicações na ligação por Skype que impediam o contacto com o guarda-redes internacional português que representa desde a última temporada os ingleses do Wolverhampton, após ter sido o primeiro jogador do plantel do Sporting a rescindir contrato, a 1 de junho de 2018, logo duas semanas depois da invasão. “Fui jogador dos 12 aos 30 anos do Sporting, de 2000 a 2018. Até 1 de junho de 2018”, recordou na primeira intervenção que teve antes de dar início a um depoimento de pouco mais de duas horas e meia onde foram abordados outros temas que não os já habituais três: a invasão da Academia, o jogo com o Marítimo e as reuniões a 14 de maio em Alvalade.

“Quando ouvi os adeptos a entrarem estava dentro do balneário, a preparar-me para ir treinar. Comecei a ouvir adeptos aos gritos a entrarem pelo balneário adentro. Não me apercebi antes que estavam cá fora, isso não. Estava lá o plantel quase todo, tínhamos acabado de fazer ginásio e estávamos naquela última preparação antes de ir para o campo. Nesse sentido, estávamos quase todos no balneário. Se havia mais pessoas lá dentro além dos jogadores? É normal que estivessem alguns elementos da equipa técnica, para ver se estávamos preparados para ir para o relvado. Devíamos ser umas 20 pessoas, não me recordo”, contextualizou. “Quando eles vêm o Vasco Fernandes, que era o nosso secretário técnico, estava a tentar fechar a porta mas eles entraram. Todos de cara tapada, uns atrás dos outros. E foi logo a agredir, um logo ao pontapé”, acrescentou antes de pormenorizar o que se passou.

[O resumo do dia 14 do julgamento do caso de Alcochete]

Alcochete. As ameaças de morte recordadas por Acuña e Battaglia, as agressões e o “hijo de puta”

Não houve nenhuma conversa. Entraram logo agressivos, começaram logo a agredir. Alguém levou logo um pontapé, não me recordo quem foi. Foram primeiro ao William, que estava à frente. Quando vi esse primeiro a agredir vou lá, tento acalmá-lo e é quando se juntam mais uns quatro à nossa frente a tentar tirar a camisola, a dar socos no peito, a dizer que éramos uma vergonha, que eu não era digno de vestir a camisola. O primeiro do William tentou torcer-me o braço mas consegui soltar, outro disse-me ‘Oh filho da puta, queres ir embora, parto-te a boca toda’. Disseram muita coisa, estava a viver um sentimento quase de ‘Não nos matem’”, recordou Rui Patrício sobre esses minutos de terror.

“Havia muito fumo, muita confusão, gritos. Não consegui ver mais nada do que se estava a passar porque estavam à nossa volta. Nós tentávamos acalmar, eles estavam muito agressivos. Não me recordo de mais frases, como era um momento de muita tensão só dava para sentir. Quando entraram começaram logo a chamar nomes desde o corredor, a dizer ‘Filhos da puta, vamos matar-vos’. Vinham com tudo. Não sei se vinham para matar mas quando entraram… Não me apercebi de ninguém deles tentar acalmar nem de ninguém nosso a responder a quem tinha invadido. O alarme de incêndio tocou mas já no final ou pelo menos só me apercebi no final. Depois foram começando a sair mas não me recordo de ouvir ninguém dizer para saírem”, salientou.

[O resumo do dia 13 do julgamento do caso de Alcochete]

Palhinha gravou um vídeo, mas não foi aquele que passou nas televisões: “Não sei quem gravou”. Dia 13 do julgamento do caso de Alcochete

Antes de encerrar essa parte, o guarda-redes agora no Wolverhampton falou sobre os elementos leoninos a quem viu ferimentos, sobre os alvos e ainda sobre a presença de Bruno de Carvalho. “No final vi o Bas Dost a levar os pontos da cabeça, vi o mister Jorge Jesus que vinha a sangrar do nariz e da boca quando veio ter connosco ao balneário. Se havia alvos específicos? Foram direito ao William e depois foram também à minha procura… Ainda ficámos dentro do balneário porque não sabíamos se tinham saído ou se podiam voltar, depois viemos cá para fora. Cá fora vi pessoas de rosto descoberto, conhecia de vista o Fernando Mendes da claque. Estava acompanhado. Vi o mister e o William a falarem com ele. Após o ataque vi o presidente Bruno de Carvalho, não sei quanto tempo depois apareceu lá na Academia. Se falou com os jogadores? Comigo não e acho que com os outros também não. Os adeptos irem lá acontecia no máximo uma vez por época mas éramos avisados”, explicou.

Foi aqui que a habitual ordem inverteu e, em vez do jogo da Madeira frente ao Marítimo ou da reunião em Alvalade na véspera do ataque, a procuradora do Ministério Público quis saber mais pormenores sobre a reunião entre Bruno de Carvalho e o plantel após o encontro com o Atl. Madrid em Espanha para a Liga Europa. “Reunião, quer dizer as duas reuniões”, começou por soltar Patrício, antes de detalhar todos os episódios dessa “novela”.

[O resumo do dia 12 do julgamento do caso de Alcochete]

Dia 12 do caso de Alcochete. Podence recusou segurança e diz que “Bruno de Carvalho sabia que plantel não estava com ele”

“A seguir ao jogo com o Atlético [de Madrid] houve um post público do presidente a criticar a equipa. Pedimos uma reunião para o dia seguinte, falámos com o Geraldes ainda no hotel em Espanha, disse-nos que ia comunicar ao Bruno de Carvalho. Viemos para Lisboa na sexta-feira e quando chegámos foi-nos dito que o presidente não ia fazer a reunião e que ficava para domingo depois do jogo [com o P. Ferreira]. Ficámos boquiabertos porque depois de uma situação grave daquelas não queria fazer a reunião e quando percebemos que ele tinha marcado a reunião para domingo, juntámo-nos todos no balneário e decidimos publicar também nós um post. A reunião passou para sábado depois de fazermos o post e entretanto fomos suspensos, tivemos processos disciplinares. Começaram a ligar para os jogadores a perguntar e a dizer quem tinha feito aquilo etc. e que afinal sempre havia essa reunião em Alvalade no sábado à tarde”, contou o então capitão do conjunto verde e branco.

“Foi com jogadores, treinadores, André Geraldes e presidente. Foi uma reunião num ambiente muito mau…  Começámos a dizer que esteve mal, ele não aceitava isso, dizia que fazia o que queria porque era presidente e que eu e o William estávamos a fazer isso porque queríamos ir embora do clube. Como capitães estávamos a transmitir que tinha estado mal porque não devia ter feito aquilo publicamente e não se tirou nada dali porque ele achou que não tinha nada de mal. Eu e o William falávamos em nome do grupo e começou a atacar-nos a dizer que queríamos sair. Até aí não tínhamos sentido nenhuma animosidade, o que sentimos com o post foi que podia vir a acontecer alguma coisa”, disse o número 1, que acrescentou ainda a chamada para Mustafá, o líder da Juve Leo.

[O resumo do dia 11 do julgamento do caso de Alcochete]

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“Falar mal dos jogadores publicamente tinha impacto pela imagem forte que [Bruno de Carvalho] tinha perante os adeptos, falando assim. Se houve uma conversa também sobre claques? Sei que ouvi o William a falar nisso, disse que o presidente tinha mandado partir os carros e ameaçar e ele negou. O William disse que o Mustafá lhe tinha dito que o presidente lhe tinha dito isso, foi assim. O presidente disse que se quisesse bater em alguém não precisava de mandar ninguém. Depois saiu da reunião, começámos a falar entre nós e entra com o telefone em voz alta a perguntar se tinha mandado partir carros e o Musta disse que não, em alta voz”, acrescentou.

Mais tarde, em resposta ao advogado do Sporting (que é assistente no processo), Miguel Coutinho, Rui Patrício fez mais revelações a esse propósito. “Não partiram os carros antes dessa reunião, isso não. Se houve uma segunda reunião depois? Sim. A seguir a essa reunião fomos para a Academia e houve outra, até foi o Bruno de Carvalho que foi lá. A partir daí nunca mais falei com ele, disse que nunca mais falava com ele. Falaram o William e o Seba [Coates] que voltaram a dizer que não devia ter feito aquele post e ele continuava a dizer que não tinha feito nada de mal. Penso que a segunda reunião ia existir para ir pedir desculpa, segundo aquilo que o mister Jorge Jesus nos tinha dito. E o mister Jorge Jesus disse-lhe ‘Então você vinha aqui pedir desculpa à malta’ e ele ‘Não vou pedir desculpa, não fiz nada de mal’. Disse que ia a levantar suspensão, que o mister podia convocar quem quisesse e que ele ia embora para ao pé da família que era quem o tratava bem”, destacou.

[O resumo do dia 10 do julgamento do caso de Alcochete]

O dia 10 do caso de Alcochete. Ameaças, estaladas (ou “tapas”) e os diferentes estados de Bruno nas reuniões

“Nessa primeira reunião em Alvalade estávamos suspensos. Primeiro foi pelo Facebook, à noite recebemos uma nota de culpa por email, no dia do post. Disse que ia levantar a suspensão, que o mister podia convocar quem quisesse mas que os processos disciplinares iam continuar. Nesse jogo com o P. Ferreira não me lembro como fomos recebidos mas sei que no autocarro a caminho do jogo meteu um post a manipular o que se tinha passado e ficámos chateados com isso, claro. Quando foi para começar a segunda reunião, na Academia, disse-lhe que nunca mais falava com ele”, adiantou. Miguel A. Fonseca, advogado do antigo líder leonino, pediu a Patrício que fosse à procura do email para que explicasse os fundamentos para essa medida mas o guarda-redes não encontrou. No entanto, os mesmos estavam explicados na rescisão com o Sporting, a que o Observador teve acesso.

Sem embargo, nesse mesmo dia [6 de maio], por volta das 23 horas, os jogadores receberam, por email, uma nota de culpa de abertura do procedimento disciplinar em que, no essencial, são imputadas as seguintes infrações: não terem feito o gesto do coração com as mãos na fotografia de grupo do jogo de 18 de março; terem feito um post no Facebook que foi considerado ‘uma clara afronta e desrespeito dirigidos à mais alta figura da Sporting SAD, o seu presidente, que foi claramente desrespeitado’; e acresce que, com a nota de culpa, os jogadores foram também suspensos da sua atividade.”

“[BdC] atiçou a ira dos adeptos contra mim”. Leia aqui na íntegra as 34 páginas da rescisão de Rui Patrício e Podence

Rui Patrício falou depois do encontro frente ao Marítimo. “No final desse jogo na Madeira os adeptos estavam a chamar nome se a insultar, depois cá fora também ao pé do autocarro. Ia agradecer, até chamei os meus outros companheiros, mas como estavam a insultar e a chamar nomes fui direto para o balneário. No aeroporto quando entrei e estava mais perto da equipa reparei que o Fernando Mendes estava a falar não me lembro com quem, vi uma pequena confusão com o Nelson a separar Fernando Mendes e fui tentar acalmar. Ainda não me tinha apercebido ainda aí com quem estava zangado. Jorge Jesus também estava lá mas não ouvi o Fernando Mendes dizer que ia à Academia. Foi uma coisa rápida, só lhe disse que não valia a pena estar assim, não me tratou mal”, referiu, acrescentando mais tarde que não tinha ouvido nenhuma conversa, apesar de, na mesma carta de rescisão a 1 de junho, dizer que tinha ouvido alguém atirar um “Na próxima semana fazemo-vos uma visita”.

[O resumo do dia 9 do julgamento do caso de Alcochete]

O dia 9 do caso de Alcochete. A mudança do treino, o terror no balneário entre “abrunhos e bordoadas” e o desabafo dos invasores

“Depois desse jogo na Madeira foi marcada uma reunião nessa segunda-feira de manhã para estarmos presentes às 18h em Alvalade. Na nossa estavam os jogadores, o Geraldes, o Bruno de Carvalho e mais dois ou três dirigentes, não sei se era o Carlos Vieira um deles. Foi uma reunião estranha desde o início, pela forma completamente diferente das últimas reuniões que tivemos. O conteúdo e a forma de falar em relação às outras reuniões foi logo estranho em relação ao que se estava passar. Não havia relação nossa com o presidente mas apareceu num tom mais calmo. Uma das coisas que disse no final foi ‘Se precisarem de alguma coisa liguem para mim ou para o Geraldes, somos uma família. Aconteça o que acontecer, têm de estar bem para a final da Taça. Depois disse ao Acuña que não devia ter feito aquilo, que lhe tinha arranjado um problema tremendo, que as claques lhe tinham ligado a noite toda mas que ia tentar resolver e o Acuña disse que queria as coisas”, frisou, antes de assumir ter ficado com a perceção que “existia a intenção de despedir o mister Jorge Jesus”.

Em resposta aos advogados, Rui Patrício foi deixando mais algumas informações “soltas”. Por exemplo, que Bruno de Carvalho lhe ia mandando mensagens mas que não respondia e que cortara relações com o antigo presidente do Sporting. E que o sentimento generalizado que existia era que o então líder “estava a tentar virar os adeptos contra os jogadores, com os posts e a entrevista que deu antes do jogo com o Marítimo”. Foi aí que a juíza Sílvia Rosa Pires perguntou pela primeira vez pelas tochas atiradas no dérbi em Alvalade frente ao Benfica.

[O resumo do dia 8 do julgamento do caso de Alcochete]

Dia 8 de Alcochete. O vídeo com Varandas, a reunião de Bruno, a agressão a Acuña, o pedido dos jogadores e o “chibo”

– Recorda-se do jogo do Sporting com o Benfica, das tochas arremessadas?
– Sim.
– E o que sentiu nesse momento?
– O que senti foi que tinha de ir para a frente para não ser atingido…
– Isso vimos nas imagens. Mas o que sentiu?
– Pelas imagens depois…
– Não, pergunto mesmo o que sentiu nesse momento?
– Fiquei fodido!
– Pronto, ficou chateado… Antes do jogo estar a levar com aquilo…
– No momento não pensei em nada, só me queria focar no jogo. Já houve jogos em que atiraram tochas mas depois de ver as imagens percebi que nunca tinha sido assim…

“Como era a relação com o presidente antes do Atlético [de Madrid]? Normal, já tinha coisas que não gostávamos, mensagens que não saíam para o exterior mas como não era público era ver e calar, como se costuma dizer. Pública, muito grave, sim, essa foi a primeira. Mas já tínhamos recebido antes mensagens dele. Fomos suspensos e recebemos a nota de culpa por termos denegrido a imagem do presidente. Porque fomos treinar? Porque estávamos a servir os interesses do Sporting Clube de Portugal. Decidimos ainda mais depois da reunião e treinámos”, contou mais à frente, dizendo ainda que “tochas já tinha havido, mas tantas e tão direitinhas não…”. “Depois fiquei lixado, vi que era muito direitinho nas imagens”, acrescentaria mais à frente antes do primeiro diálogo mais aceso com o advogado de Bruno de Carvalho, Miguel A. Fonseca, onde Patrício mudou até o próprio tom.

[O resumo do dia 7 do julgamento do caso de Alcochete]

Dia 7 do caso de Alcochete. As ameaças, as agressões, as imagens não desaparecidas e as reuniões com Bruno de Carvalho

– O presidente alterou a voz consigo nessa reunião de abril?
– Sim
– Porquê?
– Porque disse que eu e o William estávamos a organizar aquilo porque queríamos sair há muito tempo.
– Por causa disso falou mais alto?
– Não, isso foi depois… Quer que lhe explique?
– Como se costumava referir ao presidente?
– Você…
– E os seus colegas dirigiam-se como à entidade patronal?
– Sei lá! Mas vou dizer-lhe porque é que o tratei por você, está aí com essa conversa…

“Um bocadinho mais de paciência, para você não faz muito sentido mas para nós faz. Sabe se ele gostava de ser tratado por presidente?”, interrompeu e perguntou a juíza. “Eu tratava-o por senhor presidente mas depois da conversa comecei a tratá-lo por você e estávamos a falar mais alto, sim”, respondeu entre algumas notas que Miguel A. Fonseca ia deixando e que colocaram algumas vezes o guarda-redes a abanar a cabeça.

[O resumo do dia 6 do julgamento do caso de Alcochete]

Do gozo do senhor do Ecoponto (que não era) à cor do cinto que abriu cabeça a Dost: o dia 6 do caso de Alcochete

“Antes do jogo com o Benfica, o mister Jorge Jesus veio falar comigo como capitão porque o presidente queria dar um prémio de meio milhão em caso de vitória. A condição era ser ele a entregar no balneário. Falei com o grupo e, depois do que tinha acontecido, do que tinha escrito e do que tinha insinuado, não aceitámos porque todos imaginávamos o que iria dizer se aceitássemos”, confirmou o ex-jogador dos leões, a propósito de algo que já tinha sido referido por Bruno de Carvalho na fase de instrução. “Ainda hoje em Portugal, quando estou com a minha família, não me sinto em segurança, por tudo o que se falou, passou e inventaram. Um ano e meio depois, ainda me sinto assim. Se fiz alguma coisa depois do ataque? Falei com as pessoas da Seleção porque precisava de segurança, apresentei queixa pelas ameaças que recebi na Polícia. Tinha de sair de Portugal. Se ainda hoje mexe comigo, se ainda hoje há momentos que revivo estando em Inglaterra…”, concluiu.

“Ouvi ‘Vamos embora, temos que ir que isto correu mal'”, recordou Márcio Sampaio

Márcio Sampaio foi a primeira testemunha ouvida esta segunda-feira, tendo falado da parte da manhã. O antigo recuperador físico dos leões de 40 anos, que já antes da chegada de Jorge Jesus ao Sporting tinha trabalhado na Academia como no corpo técnico da equipa B, começou por recordar o momento da chegada dos invasores às imediações do balneário e recordou, à semelhança de outros jogadores já ouvidos, a frase de “debandada” dos elementos de cara tapada.

[O resumo do dia 5 do julgamento do caso de Alcochete]

Alcochete. Arguido levado para a esquadra teve “comportamentos impróprios” com os polícias

“Estava no ginásio com o André Pinto quando começo a ver pelo vidro elementos de cara tapada a chegar. Foram chegando mas não em grupo grande. A primeira reação foi de estupefação. Dirigi-me depois para o corredor. O receio era que entrassem por aquele lado da formação e mandei fechar as portas. Quando cheguei ao balneário já lá estavam alguns de cara tapada. Entraram pela porta principal”, referiu. “Ouvi dos encapuzados que entraram ‘Vamos embora, temos que ir embora que isto correu mal’ ou algo assim. Não consigo quantificar quantos estavam no balneário. Havia fumo, eram muitos. Alguém referiu ‘Não ganhem domingo e vão ver’. Era o jogo da Taça. Fiquei no corredor, com tanta gente nem consegui entrar no balneário”, acrescentou, citado pelo jornal O Jogo.

“Feridos? “Vi o Bas Dost, vi o Raul José, que tinha levado com um cinto, e o Mário Monteiro, que tinha sido atingido com uma tocha. O Raul José tinha uma marca na zona do ombro”, continuou Márcio Sampaio, que não esteve no jogo do Sporting frente ao Marítimo na Madeira por se encontrar em Alcochete a trabalhar com os atletas não convocados. “Senti um pouco de receio depois porque perdemos a final da Taça de Portugal. Tinha um receio generalizado porque não os identificava e eles sabiam quem éramos. Se vi no dia da invasão Bruno de Carvalho na Academia? Passado algum tempo vi, com André Geraldes. Perguntou-me o que aconteceu e respondi ‘Isto que está a ver’ e saí'”, comentou, antes de abordar a reunião que houve na véspera em Alvalade.

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Dia 4 do caso Alcochete. O sistema de videovigilância que falhou a minutos do ataque, Fernando Mendes e uma fivela

“Estive na reunião com a administração da SAD em que Bruno de Carvalho disse que não havia condições para continuar. Entendemos que estávamos despedidos. Bruno de Carvalho disse que ainda não tinha falado com o departamento jurídico e para marcar treino para a tarde. ‘Estou a ser vosso amigo. Se de manhã não vos entregarem nada, apareçam à tarde’. Da equipa técnica, como eu morava no Montijo, combinámos que seria o primeiro a ir à Academia para ver se nos deixavam entrar, para evitar alguma vergonha. Bruno disse que tinha passado a noite a acalmar as claques ao telefone, com a mulher e a filha a mandarem-no calar”, salientou.

[O resumo do dia 3 do julgamento do caso de Alcochete]

A chamada de William, o arguido 39, cocaína no sótão, haxixe no exaustor e uma camisola do Benfica: o dia 3 do caso de Alcochete

“Disse-nos ‘Vocês nem sabem o que é que estava a ser preparado’ e que o Acuña não devia ter confrontado o líder da claque, que isso não se viu em lado nenhum. Que teve depois de acalmar o Fernando Mendes. A reunião foi para falar do fim da linha e para esclarecer o que tinha acontecido com jogadores e adeptos no estádio e no aeroporto. Foi uma reunião surreal, pela quantidade de coisas que foram ditas”, prosseguiu o antigo recuperador físico leonino, no final do período de respostas à procuradora do Ministério Público.

“Essa frase de Bruno de Carvalho? A sensação com que fiquei foi que o que a claque tinha montado tinha sido desmontado”, acrescentou depois em resposta aos advogados, salientando que foi o ex-presidente leonino que sugeriu que o treino passasse para a parte da tarde – até pelas explicações que tinha dado durante a reunião que manteve com os membros da equipa técnica no dia seguinte à derrota com o Marítimo. Já Miguel A. Fonseca, advogado de Bruno de Carvalho, considerou que os relatos da reunião eram “fantasiosos”, na medida em que, para dizer que era um “fim de linha”, “seriam necessários apenas 30 segundos e não uma hora”.

[O resumo do dia 2 do julgamento do caso de Alcochete]

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“Vi Frederico Varandas. Estava no corredor, junto ao balneário. Ainda lá estavam indivíduos encapuçados e ele estava ali. Tenho a certeza, porque quando me encaminhava para a zona do departamento médico vi-o a dirigir-se para a zona do balneário”, esclareceu também Márcio Sampaio, em resposta a Miguel A. Fonseca, que foi chamado à atenção pela juíza Sílvia Rosa Pires para que mantivesse “a seriedade e objetividade” nas questões. “Algum dos senhores da equipa técnica foi despedido pela administração presidida por Bruno de Carvalho?”, perguntou por fim o advogado do ex-presidente. “Não, ninguém foi. Como não recebemos notificação nenhuma, apresentámo-nos no nosso local de trabalho”, esclareceu o recuperador físico, a terminar cerca de hora e meia de depoimento.

[O resumo do dia 1 do julgamento do caso de Alcochete]

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