A Federação Europeia dos Transportes e Ambiente concluiu, com base num estudo que analisou dois dos modelos automóveis mais vendidos na Europa, que “a poluição dos novos veículos a gasóleo atinge níveis mil vezes acima dos valores normais”.

A conclusão “preocupante” do estudo foi esta segunda-feira divulgada pela associação ambientalista ZERO, que faz parte da Federação Europeia dos Transportes e Ambiente, que escreve em comunicado que “testes realizados em dois dos veículos mais vendidos na Europa, a poluição dos novos veículos a gasóleo atinge níveis mil vezes acima dos valores normais”.

A federação que, salienta a Zero, “encomendou os testes a laboratórios independentes”, defende que “os legisladores europeus e nacionais devem aceitar definitivamente que os veículos a gasóleo ainda são altamente poluentes e devem tomar medidas urgentes, como apertar os limites de emissão e os testes de emissões serem mais rigorosos”.

A Zero recorda que “aquando da limpeza/regeneração dos filtros de partículas dos veículos atingem-se picos de emissão que são particularmente graves para o coração”, sendo que “estas situações podem verificar-se em áreas urbanas a cada 15 quilómetros e são efetivamente ignoradas pelos testes oficiais de emissões”.

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De uma forma geral, as partículas inaláveis podem aumentar significativamente o risco de doenças cardiorrespiratórias. Mais de 45 milhões de veículos contêm estes filtros de partículas na Europa, o que representa um total de 1,3 mil milhões de limpezas (“regenerações”) por ano. Em Portugal, os cerca de 775 mil veículos a gasóleo equipados com filtros de partículas efetuarão, por estimativa, 23 milhões de limpezas por ano”, refere a associação ambientalista.

Nos testes encomendados pela Federação Europeia dos Transportes e Ambiente foram analisados o modelo Qashqai da Nissan e o modelo Astra da Opel, “segundo e quarto modelos mais vendidos no mercado europeu nos seus segmentos”. Os dois “apresentaram valores entre 32% e 115% acima do limite legal de partículas, quando efetuavam estas limpezas do filtro de partículas em testes independentes”.

No entanto, salienta a Zero, “existe uma falha ao nível da legislação em que o limite legal não se aplica quando a limpeza do filtro ocorre em testes oficiais, o que significa que 60-99% das emissões reguladas de partículas dos veículos testados são ignoradas”.

Já quando as partículas ultrafinas, que não estão regulamentadas, foram medidas em laboratório, “as emissões totais de partículas do Nissan Qashqai e Opel Astra aumentaram ainda entre 11 e 184%”. A Zero explica que apesar de as partículas ultrafinas não serem medidas em testes oficiais, “são consideradas as mais nocivas para a saúde humana, pois penetram profundamente no organismo e estão associadas com o risco de cancro”.

Para a associação ambientalista, “o próximo regulamento europeu que defina os limites de emissão Euro deve acabar com estas falhas e estabelecer limites para todos os poluentes”.

A Zero admite que “não há dúvidas que os filtros de partículas são um elemento fundamental e proporcionam uma enorme redução da poluição dos veículos a gasóleo”. No entanto, para a associação ambientalista, “fica claro que a legislação tem problemas de aplicação e que as emissões de partículas, nomeadamente de partículas finas e ultrafinas são ainda significativas, pelo que só a retirada progressiva dos veículos a gasóleo permitirá resolver os problemas de poluição por eles causados”.

No comunicado esta segunda-feira divulgado, a Zero destaca ainda que “três em cada quatro habitantes das cidades europeias estão expostos a níveis perigosos de partículas, um poluente relacionado com o risco de cancro e cuja exposição crónica afeta o coração e os pulmões”.

A associação ambientalista reforça que “estes testes mostram que os novos veículos a gasóleo continuam a emitir níveis elevados de partículas nas cidades e estradas todos os dias, enquanto os fabricantes continuam a vender os seus veículos, ignorando a legislação, com consequências para a saúde da população”.

“A nova Comissão Europeia deve exigir e dar mais poderes para que as autoridades nacionais de homologação, no caso de Portugal o IMT – Instituto de Mobilidade e dos Transportes I.P., fiscalizem e penalizem os fabricantes que continuam a vender veículos a gasóleo altamente poluentes, como faz a Agência de Proteção Ambiental dos EUA”, defende a Zero.

ACAP critica “alarmismo sem base científica” de estudo

A ACAP – Associação Automóvel de Portugal considerou o estudo “um alarmismo sem base científica”, motivado por uma “agenda ideológica”.

“Na nossa opinião é um alarmismo sem base científica, porque não respeita os regulamentos europeus, e, por outro lado, tem uma agenda ideológica que é combater o uso de automóveis, tentando iludir que, de facto, os veículos da nova norma [europeia de emissões Euro 6d-TEMP] emitem muito menos do que os anteriores”, afirmou Hélder Pedro, secretário-geral da ACAP, em declarações à agência Lusa.

“O setor automóvel é um dos mais regulamentados na União Europeia”, obedecendo a “regulamentos muito específicos” que obrigam à realização de “testes aos carros em condições reais”, destacou Hélder Pedro.

“Não é à toa que existem normas europeias e um regulamento europeu que é aprovado. A indústria automóvel é a indústria com mais regulamentos e mais regras para cumprir, sobretudo na União Europeia, que é o espaço geopolítico mais exigente nesta matéria”, sustenta.

Por outro lado, disse Hélder Pedro, “em termos europeus a indústria automóvel é das que mais investe em Investigação & Desenvolvimento [I&D]”, estando comprovado que “reduziu já em 42% as emissões nos últimos 15 anos”, o que faz dela “o setor que percentualmente mais contribuiu para a descarbonização”.

O estudo não está dentro daquilo que é a regulamentação, faz testes pontuais, sem qualquer rigor científico, porque não estão dentro daquilo que são as leis da Europa, portanto está contra a própria Comissão Europeia e a regulamentação”, considera a ACAP.

Recordando que a associação Zero “pontualmente vem a público com vários estudos que não cumprem tudo aquilo que é o regulamento europeu”, a ACAP considera que estes trabalhos são elaborados “sem uma base científica e sem uma amostra fiável e, com isso, iludem as pessoas que são os destinatários da notícia”.

“Na nossa opinião, o que está mais aqui por trás é uma agenda política e ideológica de ser contra os automóveis e, por outro lado, também esquecem que os diesel emitem menos CO2 [dióxido de carbono] do que os carros a gasolina. Portanto, achamos que há aqui mais uma perseguição ao automóvel como bem das famílias, das pessoas e das empresas, do que outra coisa”, afirmou Hélder Pedro.

É uma clara postura ideológica de perseguição ao gasóleo. Certamente esta associação desejaria que toda a gente andasse de carros elétricos que, apesar dos incentivos que os governos dão, neste momento representam 1,7% do mercado na União Europeia. Tem de haver respeito pela opção dos consumidores e das empresas e isto não está a acontecer por parte desta associação, que quer, de uma forma alarmista, influenciar a escolha dos consumidores”, acrescentou.