Um adiamento, dois adiamentos, três adiamentos. Mais de mil dias depois, o julgamento da morte de Marco Ficini começou no Campus da Justiça, rodeado de medidas extra de segurança após as altercações num dos dias da fase de instrução entre adeptos do Benfica e do Sporting. Menos de um mês depois, chegava à quarta sessão e, antes do arranque, já era falada entre os advogados a possibilidade de começarem as alegações finais. A falta de celeridade para o arranque contrastou com a velocidade dos trabalhos depois do início, sendo que, entretanto, o “momento” mais aguardado ainda em falta era a mais do que provável audição de Luís Pina, adepto dos encarnados que está acusado de um crime de homicídio qualificado e mais quatro na forma tentada.

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Antes, houve um pouco de tudo. No primeiro dia de julgamento, marcado por essas medidas de segurança mais apertadas pedidas pelo juiz presidente, Francisco Henriques, houve novas tentativas de adiamento do arranque (até porque dois dos 22 arguidos neste caso estavam também no julgamento da invasão à Academia do Sporting, em Alcochete), alguns depoimentos de arguidos que estiveram presentes nessa madrugada de 22 de abril de 2017 junto ao estádio da Luz e a presença surpresa de Alano Silva, um dos 21 acusados de participação em rixa, que foi apontado pelas autoridades como um dos principais elementos organizadores da ida a Alcochete, que entretanto foi para Angola e que posteriormente foi detido na sequência do mandado de detenção internacional.

Seguiu-se uma segunda sessão que começou com a presença de um arguido que marcou apenas presença na sala para dizer que não tinha estado na Luz nessa madrugada, que teve continuidade com uma espécie de “guerra surda” entre os elementos da Unidade Metropolitana de Informações Desportivas e a investigação que foi feita pelos inspetores da Polícia Judiciária e que terminou com seis testemunhas apresentadas pelo advogado de Marco Ficini, todos italianos, entre irmão (mais velho), cunhada, melhor amiga da mãe e amigos de infância.

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Por fim, e antes da paragem de uma semana devido ao feriado, a terceira sessão que se voltou a realizar apenas da parte da manhã contou com uma espécie de volte face hitchcockiano, quando, já depois dos depoimentos de uma testemunha residente em frente à rotunda Cosme Damião (que acabou por ter um impacto nulo em termos de prova pelas discrepâncias no depoimento, como foi admitido pelo próprio advogado de Luís Pina, Carlos Melo Alves) e de um engenheiro mecânico de formação que é perito neste tipo de casos, o coletivo de juízes apresentou novas imagens do atropelamento que acabaram por deitar por terra todas as explicações antes apresentadas.

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Esta segunda-feira, com a presença de alguns arguidos na sala (entre os quais Valter Semedo, um dos que está também no julgamento do caso de Alcochete que terminou na última sexta-feira a produção de prova e arranca com as alegações finais no próximo dia 11), a quarta sessão arrancou mais de uma hora depois do previsto. Já com a presença de Luís Pina, que se apresentou por volta das 10h30, sem a presença da testemunha que deveria ser logo ouvida, Tiago Ribeiro, e com a identificação de Valter Semedo, que respondeu a algumas perguntas. “Sou solteiro, estou desempregado. Já fui servente de construção civil, antes”, explicou, antes de continuar os habituais procedimentos, dizendo que o pai se chama Eusébio e que vive em Benfica, o que motivou desde logo comentários em surdina entre dois dos três arguidos sentados no lado direito da sala (afeto aos encarnados).

– O que pensa fazer no futuro?
– Começar a trabalhar, construir uma carreira, construir uma família e estar longe de problemas.
– Qual é a carreira que quer construir?, perguntou depois o juiz presidente Francisco Henriques.
– Acabar os estudos…
– Estudos de quê?
– Acabar o 12.º ano…
– E depois o que quer fazer?
– Quero trabalhar…
– Sim mas…
– Hoje em dia não conseguimos trabalhar sempre no que queremos, é no que conseguimos…
– Sim mas o que disse foi tudo muito genérico…
– Em primeiro lugar, quero ir trabalhar para fora, para o estrangeiro…
– Ok então. Pronto, pode sentar, obrigado.

Voltou então Rui Silva, o perito chamada pela defesa de Luís Pina e que entretanto passou a ser considerado como consultor técnico. “Se calhar começamos por ver o seu vídeo”, atirou Carlos Melo Alves. “Não é o nosso vídeo, é um vídeo do processo, dei a toda a gente. Parece que deu a ideia que escondemos alguma coisa quando isto está sempre lá. Não sabíamos que isto fazia zoom mas estávamos ali e olha, deu, aumentou…”, respondeu um dos juízes, aludindo à parte final da terceira sessão quando foi apresentado um vídeo nunca antes escalpelizado.

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“Estas imagens colocam em causa alguma coisa?”, questionou o advogado. “Corroboram as conclusões que tinha. Fui ao local ver a perspetiva da câmara. É uma subida. A única referência é uma tampa de saneamento, que consta no processo. Este instante é sensivelmente, mais centímetro menos centímetro em que o tejadilho passa por essa tampa e o impacto, o atropelamento, dá-se antes”, começou por responder Rui Silva.

“Comecei a concluir que os factos no vídeo são da tampa para a frente. Outro elemento que me saltou à vista é que entre o primeiro salto e o segundo salto do veículo é um segundo, tenho nove décimos de segundo que não consigo quantificar e calculei uma velocidade média baseada nesses dois ressaltos. O primeiro é dado com o eixo da frente, o segundo de trás. Isso faz-me uma distância de eixos, o que dá uma velocidade média de 17km/hora. Determinei que para 17km/hora e considerando que o veículo percorre dois metros e meio, falta a parte anterior. Ou seja, há três metros e meio a quatro metros que não vejo. Esta é a parte final da dinâmica do acidente. Outro ponto que me salta à vista é que nunca consigo ver o peão, o que me faz crer que estava tombado”, salientou.

“O peão estava tombado no chão, o veículo calca… Impacto no BMW? Os elementos que tenho, sobretudo a trajetória do vestígio hemático, que flete para a esquerda, mostra que houve um impacto. Porquê? Porque há os vestígios dos farolins junto da posição final do veículo, uma parte da roda do Renault Clio e existem vestígios de tinta cinzenta no Clio. O veículo que vai à frente do Clio parece que sofre uma aceleração. Aliás, até parece que o BMW altera a sua dinâmica”, continuou, antes de ser interrompido por um dos juízes: “Mas se é assim, o embate se existisse era antes de aparecer o peão, como se pode ver nas imagens…”.

Rui Silva continuou a fazer prevalecer aquilo que tinha apresentado no primeiro relatório da terceira sessão, com essa explicação de que teriam sido dois embates no peão e não apenas um – que era a questão levantada perante o que estava a ser dito do coletivo de juízes, sendo que nessa apresentação inicial há duas semanas o perito tinha referido também que parecia ter sido o embate no BMW a fazer com que o corpo se desprendesse do Clio. “O vidro da frente estava 43% partido, sendo que a parte do condutor era 54%. Ou seja, não conseguia ver, tinha de se desviar para o lado direito ou para o lado esquerdo de cabeça de fora para poder ver. Pode ter escorregado, porque a cabeça ficou do lado direito e o resto do corpo ao centro do carro. Até me parece que é no impacto entre o Clio e o BMW que o corpo acaba por desprender”, argumentara na terceira sessão do julgamento.

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“Aquilo que vejo deste vídeo é que o Renault Clio nunca para. A verdade é que o impacto entre dois veículos pode colocá-lo nesta velocidade… Considerando o tempo que o carro demorou a sair da rotunda e chegar a essa posição, comparando as câmaras 279 e 282, esses 50 metros, é compatível com o embate. A velocidade aí era inferior aos 55 km/hora. É possível fazer isso sem estar a acelerar. Travando, mesmo tendo em conta a inclinação da estrada, nunca haveria hipótese de parar antes de 12/13 metros mas é um cenário, uma hipótese. Ou então o embate com o BMW consegue travar o Clio de uma forma muito mais brusca do que os travões”, referiu.

Seguiu-se uma curta pausa de cinco minutos, a notícia de que o Ministério Público teria de abdicar da referida testemunha que todos aguardavam de manhã e o depoimento de Luís Pina, não que sem antes Carlos Melo Alves, advogado do principal arguido do caso, tivesse feito um alerta para as “dificuldades de expressão”.

“Quero falar dos factos, quero falar a verdade… O que aconteceu foi um azar para mim e um azar para o falecido. Fui ao Estádio da Luz, era o dia antes do jogo Sporting-Benfica, fui buscar 12 bilhetes para mim. Até porque tinha vindo m casal de amigos meus dos Estados Unidos. Cheguei, estavam muitas pessoas na casinha, deixei os meus cartões de sócio, o meu, o do meu compadre, o dos meus filhos, o das minhas filhas, para ter direito aos bilhetes. Depois fui para casa, voltei para ir buscar os bilhetes, saí da casinha, telefonei para o meu compadre e para os amigos que vieram dos Estados Unidos. Estava dentro do carro, arranquei, estou a chegar dentro do carro e aconteceu aquilo…”, começou por referir Luís Pina no arranque do depoimento.

Aparecem aquelas pessoas… Para assustar as pessoas pensava que conseguia passar. Não consegui passar e depois foi uma questão de segundos e aconteceu esta fatalidade que aconteceu”, explicou.

– Estou a chegar perto da rotunda, vejo os indivíduos a chegar e tentei assustar. Quis ir para a frente porque um caiu à minha frente, meti a marcha atrás mas também não conseguia porque fui atacado novamente com pedras, ferros, não me lembro mais do quê…
– Foi atacado, o carro?
– Eu e o carro.
– Também levou?
– Também
– O que é que lhe fizeram?
– Tentei sair do carro e levei um pontapé…
– Um pontapé ou um apertão na porta?
– Sim, deram o pontapé e fiquei apertado na porta. Tentei safar o meu corpo e depois fui tirar o carro…
– Fugiu até onde, que não me lembro?
– Não me lembro…

“Comecei a correr para trás, não veio ninguém atrás de mim, vejo uma pessoa, vi depois o meu carro… Corri para o lado da casinha, onde tinha ido buscar os bilhetes. Fui nesse sentido. Quando vejo que o indivíduo que vinha atrás de mim virou e correu para cima outra vez, decidi voltar para o carro. Há coisas que não me lembro… Depois voltei para ir apanhar o meu carro. Estava no meio da confusão, só queria salvar a minha pele…”, recordou.

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– Então porque é que volta para a confusão?
– Não voltei para a confusão!
– Então?
– Queria era tirar dali o meu carro.
– Então porque é que fugiu antes?
– Se não tivesse fugido, se calhar nem estava aqui a falar, tive medo de ficar pelo caminho…
– E voltou porquê?
– Para tirar o carro, fui tirar o carro…

“Quis tirar dali o carro, já estava todo partido e não sabia se iam partir mais. Estava muita gente, não sabia se ia haver mais confusão, caí ali de paraquedas… Se havia mais pessoas? Estava muita gente na rotunda ainda, estava, estava… Como estava com o vidro partido, tive de ir a conduzir assim de lado [desviando-se para a direita, para o lado das mudanças] e no momento em que acelerei… Foi uma questão de segundos, de milésimos e senti o embate… Queria ir para o lado do Colombo, para ir apanhar o IC19, que é o caminho que faço sempre. Foi uma questão de segundos para sentir o embate. Quando acelerei senti que passei em cima de alguma cosia e depois bato na traseira do BMW. Foi ao mesmo tempo. sinto que passei por cima e bati em alguma coisa. Foi ao mesmo tempo, se não me engano, pá, questão de segundos, pensava que era só o carro”, descreveu Luís Pina.

“Quando parei aparece um indivíduo a dizer que achava que tinha feito asneira, a dizer para desaparecer dali. ‘Desaparece, desaparece’. Já estava em pânico e fiquei ainda mais pânico. Portanto, parei, não ia com muita velocidade. Foi a cena do impacto. Quando parei, saí do carro. Veio uma pessoa a correr em direção a mim, a pessoa vinha de baixo. Estava a dizer para sair dali porque tinha acontecido uma coisa grave. Entrei em pânico, voltei ao carro e fui para casa. Cheguei, a cabeça não estava bem com o pânico todos, consegui apanhar o sono no sofá, de manhã tinha de levar o meu filho para jogar a bola e é aí que vejo nas notícias”, prosseguiu.

Comecei logo a chorar, a dizer à minha mulher que tinha sido comigo, mais em pânico fiquei. Depois fui pedir ajuda a um amigo meu, que é meu primo direito. Pedi ajuda, como vamos ver a bola do Benfica juntos, e aconselharam-me a ir a um advogado no sábado de manhã. Telefonámos logo ao doutor, que não podia, que não estava cá e disse para ser segunda. Na segunda falei mas estava cada vez mais em pânico. Tenho família, não queria estar nesta situação… Na quarta ligo ao doutor a dizer que na quinta sem falta me ia entregar”, contou a propósito do momento em que se apresentou.

– Meti o carro naquela madrugada logo naquela garagem, guardo lá a minha mota também…
– É ali que costuma guardar?
– Quando quisesse…
– Oh senhores, no dia a dia…
– No dia a dia não.
– Então foi lá deixar porquê?
– Porque estava em pânico, o carro estava todo partido…
– Então mas não tinha de levar o seu filho à bola?
– Sim mas o campo da bola é perto da minha casa.
– Mas tapou o carro quando lá deixou…
– Cheguei, estacionei, tapei só alguma cosia que dava para ver
– Mas porquê?
– Porque estava partido, não queria que os vizinhos vissem, não sei explicar…

“A primeira vez que fui ao Estádio da Luz foi às oito e qualquer coisa, sete e tal, oito. Não me lembro bem. Deixei lá os cartões porque estava muita gente e voltei por volta da uma da manhã, uma e qualquer coisa. Entrei lá dentro, estive meia hora e qualquer coisa e fui para o meu carro. Aquela confusão é sempre assim nos jogos grandes quando vou buscar bilhetes, estão a pintar… Estava mais confiante porque costuma haver segurança à volta do estádio, esses jogos até chamam sempre segurança… Só dei conta quando vi pessoas com pedras e ferros na mão. Vou para a direita a dizer ‘O que é que é isso’ e depois tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum-tum! Foi assim senhor juiz, eu quero estar é longe da confusão!”, garantiu já na parte final do depoimento e quando estava a ser questionado por outro dos juízes do coletivo, que a certa altura se chegou a exaltar com o arguido.

– Quando voltei para trás, queria tirar dali o meu carro. Não queria que partissem mais, não queria que houvesse mais desgraças. Não sabia o que me podiam fazer mais. Para mim dava para andar a olhar de lado pelo vidro mas era perigoso, sim. Era uma condução perigosa, para mim e para as outras pessoas. Só quando aconteceu a tragédia é que pensei no perigo porque naquele momento só queria era tirar dali o carro. Depois pensei que era melhor deixar estar ali o carro…
– Não se apercebeu de haver gente a correr para a rotunda quando vai para lá?
– Não, não me apercebi…
– Não se apercebeu?
– Queria tirar o carro dali…
– Porque é que escolheu ir por aquela saída e não voltar para trás?
– Porque era o caminho mais rápido para ir para casa…
– Então não foram todos por ali?
– Não se enfiaram todos ali, só o cinzento
– Não percebeu que tinham saído por ali?
– Vi que subiram a ponte mas não saíram por ali…
– Ok, fica essa resposta que não vou perder mais tempo. O que vai com o vidro partido?
– Via assim [fazendo o movimento para o lado direito, das mudanças]…
– Viu o BMW antes de bater nele?
– Senti o impacto.
– Mas viu?
– Não até bater.
– Concentre-se na minha pergunta: viu o BMW?
– Só senti o BMW, não o vi.
– E o senhor atropelado?
– Não, não vi.
– Quem ia no carro consigo?
– Ia sozinho, só eu e Deus.
– Então como sabe que bateu no BMW?
– Foi depois de ver a acusação, na altura não sabia em que carro tinha batido, só que era cinzento.

“Partiram-me os vidros do carro mas não sou capaz de reconhecer quem foi. Quando volto para trás vejo as pessoas do Sporting a fugir, como estava a correr e a olhar para trás vi isso porque vinha um indivíduo atrás de mim. Só queria salvar o meu corpo… Quando entrei no carro é que aconteceu aquilo, aí é que vi o corpo estendido. Não sabia o que era e o indivíduo disse o que tinha feito… Vi qualquer coisa atrás, uns metros, não sabia se era o corpo ou se era o parachoques. Se a pessoa podia estar com vida? Estavam lá mais pessoas, nem sabia o que era. Sim, tinha curiosidade em ver mas uma pessoa não me deixou chegar mais perto, disse ‘Aconteceu algo grave’ e que tinha de ir embora. Já estava em pânico a pensar ‘Que asneira é que fiz?’, respondeu à procuradora.

– Atropelar uma pessoa é mau, fugir é pior…, comentou o juiz presidente
– Não queria ser lixado…
– Mas porquê, por quem?
– No momento da confusão, não sabia se ia continuar ou não a confusão…

A sessão da parte da tarde começou com as alegações de Leonor Machado, procuradora do Ministério Público. “Este caso é um arquétipo de como podem ser culpados mas por força de regras processuais serem absolvidos”, começou por dizer, antes de propor a absolvição de Diogo Medeiros “porque mesmo estando munido de pedras da calçada não quer dizer que estivesse a participar numa rixa” e de Hugo Firme, Valter Semedo ou Alano Silva, “que não prestaram declarações no primeiro interrogatório e na fase de instrução, confessaram os crimes de dano com violência mas deverão ser absolvidos até porque as imagens não precisam que fossem eles”.

“O embate no BMW não retira a parte do homicídio porque se demonstrou à sociedade que imprime uma margem bastante superior à marcha e às circunstâncias de ter os vidros a impedirem a visualização da estrada. Daí que se possa entender um dolo eventual. Também se prova a omissão de auxílio porque o próprio assim o confessou. As imagens mostram que vai em frente deles e que sobem o passeio para não serem atropelados, mesmo não sendo aí a uma velocidade elevada”, começou por dizer já em relação ao arguido Luís Pina.

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“Foi um momento de profunda exaltação, a que se pode acrescer por medo. Não há dúvida que o carro foi selvaticamente atacado e que podia estar com uma perturbação mínima decorrente da dinâmica destes acontecimentos em que o fenómeno do grupo tem particular acuidade e resvalam para situação graves. O dolo que tratamos é o eventual, dentro da gravidade do crime, que é grave, o dolo é médio, o grau de culpa também. É também alguém que tem antecedentes criminais e no âmbito do futebol, que cada vez mais se afasta da ética que deve ter e que se tornou chauvinista e uma barbárie”, prosseguiu na explicação, antes de finalizar: o Ministério Público pede ao coletivo de juízes que Luís Pina seja condenado por um crime de homicídio com dolo eventual (e não qualificado), quatro ofensas graves à integridade física (em vez de quatro homicídios sob a forma tentada) e omissão de auxílio (que acrescentou nesta fase), ao passo que todos os 21 restantes arguidos ficam absolvidos dos crimes de participação em rixa, dano com violência e também de omissão de auxílio.

“Como fica explícito pelas leões apresentadas, pelo testemunho de Nuno Tavares e pelas revistas da especialidade, a vítima foi apanhada por trás enquanto corriam e foi apanhado pelas costas. Se houve dolo eventual ou não, pelo contexto, será o tribunal a decidir, mas a qualificação como se fosse um homicídio por negligência isso é que não poderá ser pelas lesões existentes”, argumentou, após a declaração da procuradora do Ministério Público, o advogado da família de Marco Ficini, pedindo assim a manutenção da moldura do homicídio qualificado.

Por questões pessoais de um dos juízes, Fernando Henriques, o juiz presidente, pediu depois para que só os advogados que não pudessem alegar dia 16 o fizessem antes de terminar a sessão, havendo num de dois casos não só a concordância com o entendimento do Ministério Público mas também que fosse absolvido de qualquer indemnização. Assim, Carlos Melo Alves, irá fazer as alegações só daqui a duas semanas, sendo que, após o final da sessão, falou aos jornalistas. “A senhora procuradora pede que seja punido por um crime de omissão de auxílio, o que não pode do ponto de vista técnico. A defesa não concorda com isso e quando chegar a nossa vez o coletivo de juízes poderá ver que temos razão. Até nos crimes de ofensa à integridade física: qualquer pessoa que estivesse naquele cenário ou fugia ou era vandalizado, ele tentou obrigar que as pessoas que estavam à frente se desviassem. Sobre a omissão de auxílio, não pode ser julgado e condenado por um crime pelo qual não foi acusado. Nota-se que houve muitas coisas mal feitas e a nossa defesa é pertinente”, disse o advogado de Luís Pina.