Com o país inteiro em isolamento total e os hospitais à beira do colapso, o governo de Itália, país europeu mais afetado pelo surto de coronavírus, está a tentar garantir que toda a população do país — mais de 60 milhões de pessoas — fica em casa. A tarefa é difícil e, para o assegurar, o Ministério da Administração Interna do país criou um formulário de auto-certificação, que tem de ser impresso e preenchido por qualquer cidadão italiano que precise de sair de casa. Ao ser abordado pela polícia, o cidadão tem de apresentar o documento e o agente tem de o assinar, caso considere a justificação aceitável.

Segundo a imprensa italiana, o documento foi publicado no site do governo italiano na segunda-feira, depois de o primeiro-ministro Giuseppe Conte ter anunciado a medida mais drástica conhecida na Europa até agora: o isolamento total do país.

De acordo com as regras, devem ser evitados “todos os movimentos de pessoas físicas, de entrada ou de saída” do território, “bem como dentro do território” — proibição que se aplica a toda a população. Só serão permitidos movimentos excecionais com justificações consideradas válidas. Já relativamente às pessoas que, por estarem infetadas ou terem contactado diretamente com pessoas infetadas e que, por isso, tenham de estar em isolamento, é-lhes imposta uma “proibição absoluta” de mobilidade.

A declaração de auto-certificação inclui as quatro justificações que podem ser apresentadas às autoridades e que podem permitir uma saída de casa:

  • “comprovadas exigências laborais”;
  • “situações de necessidade;
  • “motivos de saúde”;
  • “e o regresso ao próprio domicílio, habitação e residência”.

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O não cumprimento destas normas pode resultar em “consequências penais“, como recorda a própria declaração que tem de ser assinada pelos cidadãos italianos que pretendam sair de casa. Por um lado, há penas “previstas em caso de prestar declarações falsas a oficiais públicas”; por outro, há penas específicas previstas no decreto do governo italiano para quem não cumprir o isolamento imposto a todo o território nacional.

Segundo os jornais italianos, os cidadãos podem ser interrogados pelos agentes da polícia no momento em que tentarem atravessar limites municipais ou circularem nas ruas e apresentarem o documento, momento em que a polícia tentará comprovar que a justificação apresentada na declaração é válida. Se a pessoa não conseguir comprovar a veracidade da justificação, pode ser detida e condenada a uma pena até três meses de cadeia por crimes contra a saúde pública.

Quem não tiver acesso à internet ou a uma impressora pode escrever o texto da declaração à mão numa folha de papel e apresentar essa folha manuscrita à polícia. Já quem precisar de efetuar os mesmos movimentos diariamente ou várias vezes deve especificar na declaração a frequência com que necessita de se deslocar a determinado lugar.

De acordo com os números oficiais mais recentes, já se registaram um total de 10.149 casos de infeção em Itália e 631 mortes. Cerca de mil pessoas já tiveram alta e mais de 8.500 continuam internadas. Itália é o país europeu mais afetado pelo surto e o segundo mais afetado a nível global, apenas atrás da China.

https://observador.pt/2020/03/11/conselho-nacional-de-saude-publica-decide-hoje-medidas-de-contencao/

O surto está a afetar, acima de tudo, a zona norte do país, com a região de Lombardia (cuja capital é Milão) a registar 57% dos casos. Essa foi a primeira região a ser abrangida pelas medidas de isolamento anunciadas no fim de semana pelo governo italiano, que na segunda-feira estendeu o isolamento à totalidade do território nacional.

Neste momento, as entradas e saídas do país estão fortemente condicionadas e vários países e companhias aéreas já suspenderam as viagens de e para Itália. O governo português anunciou ao fim da tarde de terça-feira a suspensão de todos os voos de e para Itália a partir dos aeroportos e aeródromos de Portugal.

Leia a tradução da declaração de auto-certificação na íntegra:

“O abaixo assinado _, nascido em _ a _, residente em _, rua _, identificado pelo documento _ número _, contacto telefónico _, consciente das consequências penais previstas em caso de prestar declarações falsas a oficiais públicos (art. 495 do código penal)

DECLARA SOB A PRÓPRIA RESPONSABILIDADE

  • Está consciente das medidas de contenção do contágio decorrentes do artigo 1, alínea 1, do decreto do presidente do Conselho de Ministros de 9 de março de 2020 relativo ao movimento de pessoas físicas dentro de todo o território nacional, bem como as penalizações referidas no artigo 4, alínea 1, do decreto do presidente do Conselho de Ministros de 8 de março de 2020 em caso de não-cumprimento (art. 650 do código penal, a não ser que o facto constitua um crime mais grave)
  • Que o movimento é motivado por:
    • comprovadas exigências laborais;
    • situações de necessidade;
    • motivos de saúde;
    • regresso ao próprio domicílio, habitação e residência.

Neste sentido, declara que _ (trabalho em…; estou a regressar a minha casa, localizada em…; preciso de fazer um exame médico em…; outras razões especiais; etc.)

Data, hora e local do controlo

Assinatura do declarante | O agente da polícia”