Filas grandes, longos tempos de espera e eventuais dificuldades a ter acesso seguro a determinados tipos de produtos ou alimentos (este último por culpa do açambarcamento irresponsável que as autoridades não se cansam de desaconselhar).

De forma geral, tem sido este o panorama dos últimos dias nas grandes superfícies comerciais espalhadas pelo país. O surto do novo coronavírus tem colocado em grande tensão este tipo de serviços — as entregas online, por exemplo, têm demonstrado grandes dificuldades — e por muito que seja praticamente heroico o trabalho de todos os que continuam a dar o seu melhor para que estes estabelecimentos funcionem o melhor possível (pessoal de caixa, repositores, talhantes, peixeiros, etc…) a verdade é que a exigência deste momento está a ser dura. Mas há alternativas.

Em plena semana da incompreensível corrida ao papel higiénico o Observador teve oportunidade de passar por três mercearias de bairro no centro de Lisboa que tinham os seus stocks deste tipo de bens praticamente intacto. Frutas e legumes? Mais que muitas no Mercado de Alvalade, por exemplo — cenário que foi possível verificar nesse mesmo dia em dois outros  mercados de Lisboa, o 31 de janeiro e o de Benfica. Isto mostra que há alternativas às grandes superfícies comerciais e isso é duplamente positivo: não só torna mais fácil o seu abastecimento de géneros alimentares como também permite apoiar pequenos negócios que agora, mais que nunca, vêm a sua sobrevivência em risco.

Mercados municipais e comercio tradicional

“Os mercados estão a funcionar e a 120%!”, garantiu ao Observador a Câmara Municipal de Lisboa (CML). Apesar de estarem a cumprir com ainda maior rigor as normas de segurança aconselhadas pelas autoridades de saúde, os mercados municipais da capital têm mantido os seus horários de funcionamento normal e até já estão a “montar a redes de entregas” que estão a priorizar o serviço a idosos e outras pessoas em grupos de risco. “Para acederem a estes serviços podem contactar as suas juntas de freguesia ou os mercados diretamente.  Só o mercado de Benfica está a ter 450 pedidos por dia”, revelou fonte na comunicação da CML.

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O Mercado de Benfica, por exemplo, está a ter 450 encomendas por dia. Filipe Amorim/Observador

Mais a norte, no Porto, a Câmara Municipal (CMP) também garantiu ao Observador que o Mercado do Bolhão está em pleno funcionamento, “das 8h às 16h” e a “cumprir rigorosamente as recomendações da DGS em termos de controlo de acessos, limpeza e higienização.” A mesma CMP ressalva que a ordem de encerramento de mercados emitida há umas semanas não abrange os de alimentos.

Tendo em conta que não existe (pelo menos por enquanto) medidas do Governo que deem por encerrados este tipo de estabelecimento comercial — apenas é exigido que não haja mais do que uma pessoa por cada 25 metros quadrados neste e em qualquer tipo de espaço comercial — , eles são boas alternativas para garantir que não lhe falta nada em casa e que os pequenos negócios de vendedores e produtores recebe alguma ajuda.

Da mesma forma, também as mercearias de bairro, talhos, peixarias e frutarias  continuam a ser uma boa alternativa para fugir à confusão do hipermercados. Aproveite então esta fase conturbada para visitar este tipo de espaços.Precisa de ajuda a dar com eles? Não se preocupe porque há solução para isso.

A recém criada plataforma “Go Small or Stay Home” quer ajudar a divulgar pequenos negócios que o podem ajudar.

“Conheces o teu bairro como a palma da tua mão? Ajuda quem esteja sozinho e não conheça estes espaços a que pode recorrer. Recomenda as pequenas mercearias, drogarias e serviços que conheces e que estão a ser afetados pela situação actual. Estes pequenos negócios merecem o nosso apoio – agora e daqui em diante”, lê-se no site da plataforma Go Small or Stay Home, criada por Ana Rodrigues, que lançou uma espécie de diretório partilhado que reúne uma série deste tipo de negócios para que eles se tornem mais visíveis aos olhos do consumidor. “Sinto que é um momento importante para despertar novos hábitos de consumo e salientar a importância de apoiar estes espaços”, destacou a criadora deste projeto que tem pouco mais de uma semana.

Outros pequenos negócios de comida (e bebida)

Nos últimos anos, quando o nome “covid-19” nem sequer existia no léxico da maior parte das pessoas, várias mercearias “modernas” foram aparecendo um pouco por to o país (e o mundo, de certa forma). Muito dedicadas à valorização de pequenos produtores, ao cultivo biológico e à maior noção de sazonalidade que também tem voltado à ribalta, também elas continuam abertas e muitas até dispõem de serviço de entregas. Espaços como a Comida Independente, a Mercearia Criativa ou a loja da Herdade do Freixo do Meio (todas em Lisboa), adaptaram o seu funcionamento à problemática conjuntura atual e sugerem opções aos seus clientes que passam pela encomenda de produtos que vão do vinho aos vegetais, passando pelas bolachas e as conservas. Por muito que nesta fase ainda se estejam a adaptar a este novo modelo de trabalho, são mais do que capazes de o ajudar com as compras.

Muitas padarias também já conseguiram adaptar o seu funcionamento às exigências impostas não só pelo estado de emergência em que vive o país como ao tão necessário distanciamento social. Estabelecimentos como o Isco, a Gleba e a Padaria Terra Pão, em Lisboa, por exemplo, ou a Kubidoce (mais a sul, em Olhão) e a Trindade Pão Artesanal (no Porto), já precaveram a sua operação e estão a funcionar em regime de entregas ou tipo grab n’go, “pegar e seguir” , numa tradução livre do inglês, que basicamente significa que só tem de ir à porta do dito estabelecimento, dizer o que quer, pagar (muitos destes espaços também tiveram o cuidado de adotar tipos de pagamento que evitem contacto direto) e ir embora.

A loja da Herdade do Freixo doMeio continua a receber clientes.

A par de tudo isto há serviços também totalmente (ou principalmente, pelo menos) dedicados à venda de frescos, a maioria deles biológicos, que podem ser comprados quer por encomenda ou através de cabazes, em muitos casos sempre para entregar em casa. Neste campeonato tem a recém criada Horta do Amigo, que faz entregas nas zonas de Lisboa, Cascais, Almada e Seixal de legumes, vegetais e frutas. O Hortelão do Oeste, por exemplo, já se dedicava a este tipo de serviço e continua a mantê-lo; as BioAlentejanices também, assim como a Maria Biológica. Qualquer um deles será uma boa opção para frescos made in Portugal.

Como em tempos de crise também é necessário haver algumas coisas talvez não tão essenciais mas boas para manter o espírito, existem pequenos negócios independentes que têm solução para isso ao manterem o seu trabalho na venda de vinho, por exemplo: veja-se o caso da Rebel Rebel Wine, o Vino Vero ou até o recém criado Dionísio (projeto criado do zero pelo grupo Sea Me), por exemplo, que estão a oferecer soluções para entrega desta bebida ao domicílio. Casas dedicadas a queijo como A Queijaria, em Lisboa, ou a Queijaria do Almada, no Porto, também mantêm o seu funcionamento.

Várias padarias mantêm a sua produção e até adotaram sistemas de entrega. Foto: Trindade Pão Artesanal

Finalmente já começam a haver também alguns restaurantes que, a par do serviço de take-away ou entrega de comida já feita, apostam também em cabazes feitos com produtos dos mesmos fornecedores que lhes dão os ingredientes para cozinhar — tanto o Attla como o Pigmeu, ambos em Lisboa, já dispõem destes serviços. Até o Talho da Esquina, do chef Vítor Sobral, já vende carne; enquanto o italiano Ruvida e a Taberna do Calhau, por exemplo, vendem caldos, purés e outras preparações (até vinho) para serem transformados em casa.