Um grupo de estudantes universitários dos Açores está “retido” no continente devido à pandemia da Covid-19. São cerca de 125, de quase todas as ilhas do arquipélago, e ficaram no continente a pedido do Governo Regional para fazer quarentena. Agora, querem regressar a casa e não têm o apoio necessário para o fazer.
No inicio do mês, pediram ajuda ao Governo Regional dos Açores — que garantiu a criação de apoio financeiro e psicológico e ainda uma linha telefónica. Contudo, os estudantes ainda não receberam o dinheiro prometido e consideram a resposta insuficiente. Por isso mesmo, decidiram pedir ajudar a Marcelo Rebelo de Sousa.
“O Governo [Regional] ignorou o nosso pedido para voltar a casa”, denuncia ao Observador Diana Batista, estudante que representa o grupo de universitários. “Ficámos exatamente na mesma situação. Então, decidimos pedir uma ajuda maior”, acrescenta.
Enviámos ainda hoje uma carta à Presidência da República Portuguesa a pedir ajuda. Estamos cá sozinhos, sem qualquer tipo de apoio. E, devido a doenças psicológicas ou a motivos financeiros, são poucos os que se conseguem manter aqui saudáveis em todos os termos: físicos, mentais, emocionais e financeiros”, alerta a estudante.
Os estudantes açorianos pedem assim a Marcelo Rebelo de Sousa que “interceda junto das restantes entidades competentes”, para que seja o resgate possa ser feito “em segurança”. “Todo o país está em casa e nós, mais tarde ou mais cedo, temos de voltar. Já existem medidas de segurança a serem cumpridas por todos os organismos, por isso, apesar de ser uma altura de elevado contágio, também é a altura em que há, à partida, melhores hábitos de higiene”, lê-se na carta citada pela agência Lusa.
Diana Batista descreve um grupo de alunos desgastado devido ao isolamento — que já dura há um mês — e com necessidade de recurso a apoio psicológico. A situação piora para quem não é das ilhas Terceira ou São Miguel, devido à falta de voos diretos. “Eu, por exemplo, sou do Pico. Arrisco-me a ir num voo da TAP sem saber quem vai ao meu lado, de onde vem, se fez quarentena, num voo comercial para uma ilha que não é a minha. Vejo-me sem certeza de voltar ou não à minha própria ilha”, explica a estudante de 20 anos.
Ao Observador, Diana Batista deixa um apelo ao Governo de Vasco Cordeiro: depois de terem seguido as recomendações, é agora a vez do executivo açoriano ouvir os estudantes. A jovem destaca ainda que a probabilidade de estes alunos estarem infetados é muito baixa, uma vez que todos cumpriram o isolamento.
Nós queremos que simplesmente nos ouçam. Nós também ouvimos o que nos foi pedido: ficámos cá porque nos pediram para não ir. Mas agora somos 125 alunos a querer regressar e ninguém nos ouve. Parece que não nos querem na nossa própria terra”, apela Diana Batista.
Governo Regional garante que apoio monetário vai chegar “nos próximos dias”, mas insiste no não regresso
Ao Observador, o secretário regional adjunto da presidência com a tutela da juventude afirma que o Governo Regional está a fazer o “esforço possível” para ajudar este grupo de alunos. Berto Messias fala ainda num grupo maior do que os 125 alunos referidos por Diana Batista. O responsável pela pasta da juventude explica que o Governo já contactou alguns alunos, que recorreram à linha de apoio, e adianta que o apoio monetário “varia mensalmente entre 150 e 250 euros” e que vai chegar “nos próximos dias”.
“Já estamos a contactar todos os estudantes que ligaram para a linha a solicitar apoio para materializar esse apoio. Até ao final de abril, vamos fazer o balanço do número de estudantes que já temos referenciados por esta linha para ver se é possível equacionar outro tipo de solução do ponto de vista do transporte aéreo”, garante o responsável pela pasta da juventude.
Está em causa a saúde pública. Solicitamos que os estudantes fiquem mais algum tempo no continente. Percebemos a angústia dos pais, percebemos o descontentamento dos estudantes. Mas é fundamental que se perceba que está em causa a saúde pública dos estudantes, dos país, das famílias. No fundo, de todos nós”, afirma Berto Messias.
Berto Messias destaca ainda o “contexto de grande excecionalidade” que vivemos devido ao estado de emergência, onde a “mobilidade está altamente condicionada”. O secretário regional renova por isso o pedido de permanência no continente: “O que entendemos ser mais adequado, para já, é que os estudantes possam ficar onde estão”.
125 estudantes açoreanos estão retidos no continente e sem apoio do Governo Regional
Estudantes não voltam por “segurança”, mas há voos constantes para os Açores a levar reclusos ou até continentais
Mas apesar de o Governo Regional se resguardar na segurança, a verdade é que há denúncias de pessoas que não são do arquipélago — e até portadores do novo coronavírus — a chegar às ilhas. Até mesmo a Força Aérea portuguesa tem levado reclusos libertados para as ilhas, dando a sensação de que apenas os estudantes ficam para trás. O alerta é deixado ao Observador pelo presidente da Juventude Social Democrata dos Açores.
“Estão a vir [para as ilhas] pessoas que não são residentes dos Açores em voos da TAP. Claro que a TAP não pode proibir um continental de vir para São Miguel — que foi o que aconteceu — de uma pessoa infetada que devia estar em quarentena domiciliária e que viajou de Lisboa para Ponta Delgada”, relata ao Observador Flávio Soares.
Sobre o grupo de 125 alunos, o presidente da JSD dos Açores explica que o regresso dos universitários a casa não significa perigo. “Não é pelo facto de virem [para as ilhas] que vão colocar outras pessoas em risco”, considera Flávio Soares.
JSD/Açores diz que Governo Regional deu resposta insuficiente a alunos deslocados
O líder da JSD dos Açores defende que os alunos, que estão “completamente isolados nas residências”, podiam fazer quarentena em hotéis disponibilizados pelo Governo Regional, para depois serem testados. “Depois dos 14 dias são submetidos a um teste. E se der negativo, então aí regressariam às suas ilhas. É tão simples quanto isto. Não há perigo nenhum”, afirma.
Diana Batista afirma que o grupo de estudantes está disponível para “qualquer solução”. “Estamos abertos a fazer quarentena em São Miguel e na Terceira e até duas quarentenas: uma nessas ilhas e depois outra nas nossas. Estamos abertos a ir em voos diretos e a fazer quarentena nas nossas próprias ilhas. Estamos abertos a qualquer tipo de solução desde que nos garantam a chegada às nossas ilhas”, afirma.
O último balanço da Autoridade de Saúde dos Açores indica que, até ao momento, já foram detetados nos Açores um total de 102 casos confirmados, verificando-se 10 recuperados, cinco óbitos e 87 casos positivos. Destes, 56 são em São Miguel, seis na ilha Terceira, quatro na Graciosa, seis em São Jorge, 10 no Pico e ainda cinco no Faial.