É um dois em um: Rio, o colaborador, Rio, o líder da oposição. Com a passagem da emergência para a calamidade, o presidente do PSD também baixou um grau na cooperação com o governo. O presidente do PSD — que deu esta quarta-feira uma entrevista à CMTV — continua a sugerir que irá mesmo aprovar um orçamento complementar, mas ao mesmo tempo denunciou uma “habilidade saloia” do governo numa proposta para as microempresas. Diz que o governo é “adversário e não inimigo”, mas diz ser “inadmissível” que alguém no PS possa ter aproveitado a pandemia para ajustes diretos para “amigo de aqui, amigo de lá” e pede ao Ministério Público para estar “atento“. Pelo caminho, admite o Estado como acionista maioritário na TAP, mas com cautela e com hipótese “vender mais tarde”. E avisa: chamem-lhe o que quiserem, mas a austeridade já chegou.
Tem agora a palavra, Rui Rio, líder da oposição. Começando pelas críticas, Rui Rio diz que vê “muito mal” os últimos desenvolvimento de suspeitas de favorecimento por parte do membro do governo que sugeriu a empresa de um ex-sócio para testes Covid-19. O presidente diz que percebe quando as autarquias têm urgência em fazer contratações para responder à pandemia, mas “quando não são coisas de milhares de euros, mas de milhões de euros, e de amigo de aqui e de amigo de lá, isso é inadmissível”.
Rui Rio diz que tem identificado o PS e o governo como “adversários” e não como “inimigo“, mas avisa se alguém quiser “privilegiar os amigos à custa do vírus”, o presidente do PSD vai estar “muito atento” e espera que “o Ministério Público também esteja atento”.
Sobre o facto do governo ter antecipado uma proposta permite aos sócios-gerentes de microempresas acederem ao “lay-off” um dia antes do PSD apresentar a proposta no Parlamento, Rui Rio definiu como “habilidade saloia” do executivo socialista.
Rui Rio disse ainda que a “austeridade é meramente uma questão de português“, lembrando que “no tempo de Mário Soares, o PS não praticava austeridade, apertava o cinto”. Para o presidente do PSD os socialistas “criticaram tanto o tempo da troika, que existiu por culpa do PS e não do PSD, baniram a palavra”. Aqui carregou, como gosta a ala passista, nas tintas de que a austeridade foi culpa do PS. Rio lembrou depois que “o facto de [os socialistas] banirem a palavra austeridade”, não significa que ela não exista. E questionou: “Neste momento não estamos em austeridade? Pessoas com cortes de salário de um terço, já há pessoas no desemprego, isto não corresponde a um quadro [de austeridade].”
Continua o líder da oposição. Rio voltou a lembrar que “quando o governo soltou prisioneiros aos magotes sem nenhum critério ligado ao vírus eu critiquei e critiquei forte”. E deixou uma alerta: “Espero que não venhamos a ter problemas de criminalidade por causa do que o governo fez“. Além disso, destacou ainda que não tem nenhuma “costela socialista de meter dinheiro em determinados setores a fundo perdido”. Para ele “as empresas de comunicação social são iguais às empresas de móveis, sapatos ou têxtil” e que o governo só lhes concedeu um apoio especial de 15 milhões de euros porque precisa desses órgãos para “passar a sua mensagem”. Nisso Rio não alinha, já que não é de “interesse nacional”.
Rio, o colaborador, não está “arrependido”
Apesar do rol de críticas, Rui Rio não abandonou por completo a colaboração com o governo e não se arrepende no apoio. “Não estou nada, nada, arrependido”. Tem então a palavar Rui Rio, o colaborador. Para o presidente do PSD o que o “preocupa em primeiro lugar” é que o “governo tenha êxito a salvar as pessoas e salvar o que se tem a salvar da economia.”
Rui Rio continua também muito disponível para aprovar um orçamento suplementar, que considera uma “mera constatação da realidade que nós temas: é mais despesa, menos receita”. Como o país precisa, a “latitude do PSD para aprovar o orçamento suplementar é muito grande.” E acrescenta: “Só numa situação limite [é que chumbaria], diria, isso aí já é demais. Agora, o país precisa”. Ainda assim, avisa que não “vai passar o cheque em branco”.
Relativamente à situação da TAP, o presidente do PSD até não se afasta completamente da ideia de Pedro Nuno Santos, que defende que se o Estado meter dinheiro na empresa e o privado não acompanhar, a fatia pública na empresa tem de aumentar. Como o Estado tem 50%, passaria a ser o acionista maioritário. Sobre isso Rui Rio diz que a “TAP precisa de capital” e, portanto, é necessário pôr dinheiro na TAP. Diz que se os acionistas acompanharem o aumento de capital, tudo fica como está, mas “se só o Estado mete dinheiro, naturalmente que a participação do Estado aumenta”. Rio já não acompanha o descontentamento do ministro das Infraestruturas com os acionistas privados: “Não é uma nacionalização, é um aumento de capital que o privado não está capaz de acompanhar. Espero que esteja, mas pode não estar”.
Mas deixa uma ressalva. Rui Rio diz que “o facto de intervir, o Estado não tem de lá ficar eternamente, pode sair quatro ou cinco anos depois se houver comprador”. O presidente do PSD diz que “a intervenção estratégica tem de ter limites” para proteger os contribuintes. O líder da oposição lembrou ainda que “a TAP é uma empresa tecnicamente falida”.