Começaram a chegar esta quinta-feira aos agentes culturais as regras provisórias do Ministério da Cultura para reabertura, a 1 de junho, de salas de teatro e recintos de espetáculos ao ar livre.

O Ministério não quer que haja intervalos nos espetáculos de palco e recomenda que os espectadores nunca se levantem até ao fim da peça. “De forma a reduzir a movimentação de pessoas dentro da sala ou recinto de espetáculos não devem existir intervalos durante os espetáculos”, diz o ministério de Graça Fonseca, sugerindo que as exceções são mínimas e devem ter fundamento técnico e não artístico. “Nos espetáculos onde tal não seja possível (exemplo: necessidade de alteração de cenário), a duração do intervalo deve ser reduzida ao mínimo possível”. Além disso, “deve-se recomendar aos espectadores para permanecerem sentados até ao reinício do espetáculo”.

As regras constam de documentos elaborados pelo Ministério da Cultura, no contexto do plano governamental de desconfinamento, e enviados por correio eletrónico ao início da tarde de quinta-feira a empresas e entidades representativas do setor das artes performativas e dos espetáculos, com um pedido de “comentários e sugestões” até segunda-feira, dia 18. Depois disso, o Ministério da Cultura deverá coordenar-se com a DGS e aprovar uma versão definitiva das regras no decorrer da próxima semana.

Os teatros, as salas de espetáculo e os espetáculos ao ar livre, “pelas suas características, podem ser locais de transmissão” do coronavírus, sustenta o Ministério, que resume nos documentos hoje enviados a “evidência científica atual”. Por isso, entende serem necessárias “medidas adicionais para assegurar a minimização da transmissão da doença nestes contextos”.

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“E no palco? Como é que vai ser quando subirmos ao palco?” As dúvidas que assombram as artes performativas

Relativamente aos artistas, o Ministério entende que “cada estrutura avaliará” se o acesso destes ao edifício e ao palco “deve ou não ser precedido da realização de testes para a covid-19”, o que torna facultativo o que a Direção-Geral da Saúde (DGS) quis que fosse obrigatório para jogadores das competições da Liga Portuguesa de Futebol. Em todo o caso, aos artistas deve ser feita a “medição da temperatura à chegada ao edifício, sem registo”, o que aparentemente contraria a Comissão Nacional de Proteção de Dados, segundo a qual “não pode uma entidade empregadora proceder à recolha e registo da temperatura corporal dos trabalhadores ou de outra informação relativa à saúde ou a eventuais comportamentos de risco dos seus trabalhadores”. Nos ensaios, é incentivada o trabalho parcelar ou individual, o que também pode ter efeitos sobre os objetos artísticos a criar.

Os espectadores serão obrigados a usar máscara “no acesso ao interior dos teatros”, “respeitar a distância entre pessoas de pelo menos dois metros” e “considerar a utilização de máscara no decorrer dos espetáculos”. Terá de haver “distância de pelo menos dois metros” entre a boca de cena e a primeira fila”, é apontada a impossibilidade de “orquestras a tocar em fosso”. Também aqui, os documentos reconhecem adaptações: “É de relevar que dada a natureza e especificidade de alguns corpos artísticos, nomeadamente cantores, músicos de instrumentos de sopro e bailarinos, terá de existir alguma flexibilidade no que diz respeito às distâncias a manter em prol de uma atuação ou prestação artística de qualidade”.

No que respeita à acomodação de espectadores, surgem nos documentos duas opções: ou os lugares “deverão ter uma fila de intervalo e pelo menos dois lugares de intervalo entre espetadores que não sejam coabitantes”, ou então “pelo menos três lugares de intervalo entre espetadores que não sejam coabitantes, sendo que na fila seguinte os lugares ocupados deverão ficar desencontrados”.

Vigilantes à entrada da casa de banho e uma pessoa a cada 20m²

No caso dos espetáculos ao ar livre, o Ministério da Cultura fala de “vigilância à entrada das instalações sanitárias por forma a garantir que na respetiva utilização se mantém a lotação máxima por metro quadrado” e pretende apenas autorizar um espectador por cada 20 metros quadrados. Em rigor: “Ocupação máxima indicativa de 0,05 pessoas por metro quadrado”, lê-se.

Os artistas e técnicos desses espetáculos ao ar livre também devem ter a temperatura medida e, tal como nos teatros, “cada estrutura avaliará e decidirá se o acesso das equipas artísticas ao palco do espetáculo deve ou não ser precedido da realização de testes para a covid-19”. O uso de máscara pelos espectadores, no acesso e no decorrer, está igualmente previsto.

Contactada, a assessoria de Graça Fonseca não facultou uma cópia nem confirmou o teor dos documentos. O Observador verificou depois que os documentos foram mesmo remetidos pelo gabinete da ministra. Trata-se de dois ofícios com propostas, sem carácter definitivo: um de 12 páginas, com “procedimentos em teatros e salas de espetáculos”, e outro de nove páginas, com “procedimentos em espetáculos ao ar livre”.

No primeiro, lê-se que as medidas devem ir ao encontro do “caráter excecional das artes performativas” e ter em conta “elementos da equipa, relações de trabalho, espaços e fases de produção e apresentação dos espetáculos”. O segundo não refere qualquer excecionalidade dos espetáculos ao ar livre. Em ambos os casos, são citadas diversas normas e orientações produzidas nas últimas semanas pela DGS.

Entretanto, o Ministério tem vindo a reunir-se com essas mesmas entidades representativas, que por sua vez, antes de responderem ao Governo, estão a recolher contributos das estruturas artísticas que representam. Várias dessas entidades não quiseram comentar ao Observador as normas agora propostas, por entenderem que é em diálogo com a tutela que se devem expressar. Fonte próxima do gabinete de Graça Fonseca mostrou algum desconforto com a divulgação de documentos de trabalho e argumentou que “se o Ministério da Cultura tivesse querido fazer o diálogo com as associações representativas do setor através da comunicação social, teria remetido as propostas através dos órgãos de comunicação social”.