Um laboratório português em conjunto com um outro israelita querem desenvolver uma nanoplataforma vacinal — criada para estimular anticorpos contra o cancro — para conseguir imunidade contra a doença provocada pelo novo coronavírus, a Covid-19. O projeto é um dos que receberá um financiamento de cerca de 300 mil euros da Fundação La Caixa para avançar.
Helena Florindo, da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, e Ronit Satchi-Fainaro, da Universidade de Telaviv, são as duas investigadoras à frente desta plataforma de nanovacinas que já mostrou ser capaz de estimular um reforço do sistema imunitário contra o melanoma. Agora a dupla quer adaptar esta plataforma para desenvolver uma nanovacina que possa prevenir a infeção pelo novo coronavírus e está já a testar em ratos cinco candidatas a essa vacina, avaliando a resposta do seu sistema imunitário. Quando houver uma candidata à vacina, poderá começar-se os ensaios clínicos.
Os resultados do trabalho de investigação de Helenda Florindo e Ronit Satchi-Fainaro foram publicados em agosto de 2019 na revista Nature Nanotechnology. Com a combinação de dois anticorpos e um fármaco conseguiram dar armas ao sistema imunitário para combater as células cancerígenas. Neste caso, os ratos testados tinham melanoma e o tumor quase deixou de crescer, pelo que se está a tentar usar esta fórmula para combater outro tipo de cancros. Agora a ideia é usar a mesma arma para impedir que o vírus que causa a Covid-19 entre no organismo.
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“Neste caso, estamos a adaptar a nanoplataforma que tínhamos desenvolvido contra o cancro. Para isso, substituímos os tais compostos ativos por outros específicos para o SARS-CoV-2, e optimizamos a formulação tendo em conta a resposta que pretendemos”, explica.
Mas afinal o que é uma nanovacina? Em resposta ao Observador, Helena Florindo revela que é uma partícula sólida à escala nanométrica, composta por polímeros (ou seja macromoléculas) que no seu interior transportam agentes (por exemplo os antigénios como proteínas, sequências de aminoácido) que irão estimular a resposta imunológica de cada um.
A diferença para uma vacina convencional, é que as vacinas nanométricas protegem os “compostos que irão regular a resposta imunológica e permitem uma libertação prolongada dos mesmos”, explica. Assim, é possível usar doses mais baixas, e mesmo reduzir o número de doses da vacina necessária para conseguir essa imunidade. Na verdade, “a nanopartícula em si funciona como um adjuvante”, explica a investigadora por escrito, que de acordo com os resultados que já tem pode afirmar que esta nanovacina reforça os anticorpos e por isso ajuda a obter os resultados desejados.
Atualmente ainda não existem nanovacinas no mercado, mas há já vários candidatas em ensaios clínicos, contra o cancro e agora contra a Covid-19. Uma outra vantagem desta nanovacina é também a forma de administração, que se pode escolher de acordo com o resultado que se pretende, seja pela via subcutânea ou muscular, ou ainda pela via nasal.
“O que é interessante no caso de uma vacina contra a Covid-19, uma vez que o agente patogénico entra pelas mucosas”, explica.
Ao entrarem no organismo, estas partículas poderão “ser reconhecidas e ‘engolidas’ pelas células apresentadoras de antigénio; poderão também migrar diretamente para os nódulos linfáticos e aí serem reconhecidas por estas células, as quais irão processar os compostos que transportam e desta forma, iniciar a resposta imunológica”.
Para já estas nanovacinas estão a ser testadas em ratos de laboratório, mas é difícil arriscar uma data até que elas possam chegar ao ser humano. “Percebo a urgência desta vacina, mas penso que temos que ser criteriosos e cuidadosos no seu desenvolvimento, para que tenhamos a resposta biológica bem conhecida, mas também o produto bem caracterizado, para que não tenhamos surpresas depois em fases mais avançadas dos ensaios clínicos”, diz com cautela.
“Não digo que seja impossível, mas penso que será difícil para que tenhamos uma vacina disponível antes de um ano”, diz.