Frankline Ndifor era conhecido nos Camarões como o “profeta”, um pastor religioso que chegou a ser candidato presidencial em 2018. Dizia curar a Covid-19 apenas colocando as suas mãos na cabeça dos doentes, mas morreu, aos 39 anos, vítima do vírus. Os seus fiéis cercaram a casa passaram horas a tentar ressuscitá-lo, rezando – e as forças policiais tiveram de recorrer à força e usar gás-pimenta para conseguir entrar na casa onde o corpo do “profeta” se encontrava.
A morte de Ndifor terá ocorrido em meados do mês de maio (uma das primeiras notícias, feita pela delegação em Douala da BBC, é de dia 17). Ndifor era o rosto da igreja Kingship International Ministries e “nos últimos tempos tinha vindo a colocar as suas mãos [nos doentes] alegando que esse gesto os curaria da infeção” pelo novo coronavírus, disse à Voice of America Rigobert Che, um dos seus seguidores. “Se alguém que afirma que é capaz de curar a Covid-19, se essa pessoa morre, o que é que isso significa para as outras pessoas que foram afetadas pela Covid-19? Agora que ele está morto, não sei se as pessoas em quem ele colocou as suas mãos serão mesmo curadas”, acrescentou.
Foi descrita como uma situação de “pânico” a que se viveu na região, com centenas de fiéis da igreja de Ndifor a impedir o acesso das forças de segurança e autoridades de saúde à casa do “profeta”, onde este sucumbiu ao vírus. Os seus seguidores alegavam que o “profeta” não estava morto, apenas estava num retiro espiritual com Deus e voltaria à vida em breve. Mas, depois de forçarem a entrada, as autoridades acabaram por recolher o corpo de Ndifor, ao mesmo tempo que as rádios locais transmitiam as preces dos seus muitos seguidores.
Um médico que esteve no local, Gaelle Nnanga, falou com a mesma publicação – a Voice of America – através de mensagens eletrónicas e explicou que Ndifor tinha morrido menos de uma semana depois de lhe ter sido diagnosticada a infeção pelo vírus. Mas já estaria doente há várias semanas. Este médico terá sido chamado por membros da igreja, segundo o próprio, para ir até à casa do “profeta” tentar ajudá-lo, já que este estava “em agonia”. Quando a equipa médica de Nnanga chegou ao local, Ndifor já estaria em graves dificuldades respiratórias e acabou por morrer nos minutos seguintes.
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Quando se confirmou o óbito, o governador da região onde fica Douala terá pedido às forças de autoridade para forçar a entrada na casa, já que os fiéis do “profeta” começaram a expulsar os profissionais de saúde da casa, impedindo que o cadáver fosse retirado. Segundo o Cameroon Tribune, os fiéis exigiam, pelo menos, ter 48 horas para poder rezar pela ressureição do corpo – só depois, diziam, poderiam permitir às autoridades que levassem o seu “profeta” (caso este não ressuscitasse, é claro, como os seguidores garantiram que aconteceria).
Viveram-se momentos de pânico, segundo o médico Gaelle Nnanga, à Voice of America. A BBC descreveu aquele dia como um “dia insano”, em que até a mãe do pastor ameaçou barricar-se com o corpo, sozinha, no quarto. Só quando chegaram veículos da polícia de intervenção é que foi possível, com a utilização de gás-pimenta, desmobilizar os seguidores de Ndifor que cercaram a casa e que ao longo de mais de uma hora impediram as forças da autoridade de entrar no local.
O “profeta” mereceu elogios após a sua morte, designadamente por parte de Akere Muna, um advogado camaronês que é presidente de um organismo anti-corrupção em África. Frankline Ndifor era “um homem de grande espiritualidade”. “Se deixou este mundo devido à Covid-19, então que isso sirva para nos lembrar da realidade desta pandemia. Que a sua alma gentil descanse em paz”, acrescentou, no Twitter.
Pastor Franklin Ndifor Afanwi – Gone too soon. A man of great spirituality. This guided his entry into the political arena. If he left this world due to COVID19, then it must be to remind us of the reality of this pandemic. May his gentle soul rest in peace. pic.twitter.com/W6Hj6leu6m
— Akere Muna (@AkereMuna) May 17, 2020