O Governo vai voltar a impor o dever cívico de recolhimento, que já tinha sido levantado em todo o país, nas 19 freguesias da região de Lisboa que vão permanecer em estado de calamidade, confirmou o Observador, depois de o jornal Público avançar que essa era uma hipótese em cima da mesa na reunião do Conselho de Ministros que decorre esta manhã.

Depois de, na segunda-feira, um Conselho de Ministros extraordinário e não presencial ter legislado no sentido de apertar as regras na Área Metropolitana de Lisboa para travar a fundo os ajuntamentos em cafés, esplanadas e na rua, o Conselho de Ministros desta quinta-feira está a trabalhar em legislação específica para as 19 freguesias que o Governo identificou como mais críticas na região de Lisboa, de modo a vigiar e isolar os casos de contágio para quebrar aquelas cadeias de transmissão ativas, mas também em legislação mais alargada a todo o território nacional.

É um travão a fundo no desconfinamento, que o próprio António Costa sempre disse que não iria ter pudor em fazer, caso a estratégia não corresse como planeado. Os especialistas da DGS e epidemiologistas que esta quarta-feira estiveram reunidos com os decisores políticos na sede do Infarmed não conseguiram tranquilizar o país sobre o que se estava a passar na região de Lisboa e não alinharam no discurso de que só há mais casos porque há mais testes. Há mais testes, sim, mas também há mais casos positivos por teste feito — o que não é um bom indicador. Também não é nos jovens que desconfinam de forma mais “pujante” que estará todo o problema, uma vez que, segundo os peritos, é na coabitação, primeiro, que está o problema dos contágios, seguido do contexto laboral e só depois vem o contexto social, no fim da lista de comportamentos de risco para o contágio, pelo menos nas freguesias em questão.

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É com este contexto todo, sem respostas claras dos especialistas e com o número de casos na região de Lisboa a aumentar diariamente às centenas, que o Conselho de Ministros está reunido. E vai dar passos atrás. Tal como o primeiro-ministro tinha dito aos jornalistas na conferência de imprensa que se seguiu à reunião de emergência com autarcas de Lisboa, o objetivo das novas leis vai ser otimizar a atuação dos serviços de saúde pública no acompanhamento dos casos ativos de Covid-19, mas também daqueles que estão em vigilância por terem estado em contacto com casos positivos mesmo não tendo sintomas.

Daí que uma das medidas que vai ser decretada, sabe o Observador, seja a imposição que vigorou durante os meses de março e abril em todo o país de que apenas se pode sair de casa para trabalhar ou para adquirir bens essenciais como alimentos e medicamentos. Isto nas 19 freguesias onde estão localizados os maiores focos do vírus — que vão permanecer em estado de calamidade.

Trata-se de todas as seis freguesias do concelho da Amadora e todas as quatro freguesias do concelho de Odivelas. Em Sintra são seis as freguesias abrangidas: Queluz-Belas, Massamá-Monte Abraão, Agualva-Mira Sintra, Algueirão-Mem Martins, Rio de Mouro e Cacém-São Marcos. Em Loures são: Camarate, Unhos e Apelação e Sacavém-Prior Velho. E em Lisboa, apenas a freguesia de Santa Clara ficou abrangida por este cerco mais apertado, apesar de o Lumiar também ter sido referenciado pela DGS devido aos casos detetados no Lar dos Inválidos do Comércio. O Governo entendeu, contudo, que esses casos já estão confinados ao espaço físico do lar, tal como acontece também num lar da freguesia de Arroios, pelo que as medidas não devem ser estendidas a toda a freguesia.

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A ideia é reforçar a vigilância dos casos identificados para travar o contágio. Por outras palavras, é controlar as cadeias de contágio que, neste momento, estão descontroladas. Vai por isso haver um reforço da vigilância de proximidade que será feita não só pelas forças de segurança da PSP e GNR, mas também por serviços de proteção civil municipal e estruturas ligadas à Segurança Social.

O projeto comunitário anunciado pelo Governo chama-se “bairros saudáveis” e, como o Observador já tinha avançado, vai pôr funcionários das autarquias, da área da proteção civil, da saúde ou da ação social a visitar os infetados e a acompanhar de perto a sua situação. Desta forma os delegados de saúde pública ficam mais libertos para outras tarefas, nomeadamente para acelerar a obtenção dos resultados dos testes. O problema tem sido muitas vezes motivado pelo grande intervalo de tempo que dista entre a realização do teste e a oficialização da situação, o que faz com que, sem sintomas, as pessoas continuem a fazer a sua vida ‘normal’ já tendo o vírus consigo. Tal como o presidente da câmara de Sintra, Basílio Horta, tinha afirmado ao Observador, essas equipas “multidisciplinares” vão apostar num “trabalho de georreferenciação para seguir os casos” controlando ao máximo o surto na sua zona. Segundo o Público, o Governo admite mesmo vir a recorrer às Forças Armadas, se a vigilância de proximidade não for suficiente.

Este será o eixo de atuação do Governo no terreno, ao nível localizado. Mas haverá mais leis para toda a Área Metropolitana de Lisboa, que irão complementar aquelas que foram conhecidas na segunda-feira e que procuram travar a fundo os ajuntamentos. Estas regras, que passam pela proibição de consumo de álcool na via pública, pela limitação dos ajuntamentos a 10 pessoas ou pela obrigatoriedade de todos os estabelecimentos, supermercados incluídos, fecharem às 20h em toda a região de Lisboa (deixando apenas de fora os restaurantes), vão estar associadas a um quadro sancionatório mais pesado.

Segundo o Público, os estabelecimentos que não respeitarem o horário de encerramento às 20h podem ser multados até 600 euros, e as pessoas que não respeitarem as regras dos ajuntamentos ou de consumo de álcool na rua estarão a incorrer numa contra-ordenação equiparada à do não-uso de máscara em transportes públicos. A polícia vai estar ativa na vigilância destes incumprimentos e vai identificar todas as pessoas que estejam numa situação dessas, para posterior aplicação de coima. As multas, segundo aquele jornal, podem ir de 120 a 350 euros.