O Conselho de Finanças Públicas saúda os “aperfeiçoamentos” na transposição de legislação europeia, constantes das alterações à Lei de Enquadramento Orçamental, mas critica os “novos adiamentos” previstos e o “claro retrocesso” na disponibilização de informação previsional na base do acréscimo.

“A proposta de alteração da LEO [Lei de Enquadramento Orçamental] introduz alguns aperfeiçoamentos relativos à transposição de legislação europeia, o que se saúda, mas também introduz novos adiamentos na entrada em vigor de disposições da LEO de 2015, assim como um claro retrocesso na disponibilização de informação previsional na base do acréscimo, defraudando a expetativa da lei original de colocar Portugal na vanguarda europeia de aplicação da base do acréscimo”, lê-se no parecer do Conselho das Finanças Públicas (CFP) sobre a proposta de Lei 37/XIV, que altera a LEO e deu entrada na Assembleia da República em 17 de junho.

Aprovada pela lei n.º 151/2015, de 11 de setembro, a LEO “entraria plenamente em vigor na elaboração do Orçamento do Estado para 2019”, mas por iniciativa do Governo, através da lei n.º 37/2018, de 07 de agosto, o artigo 8.º, n.º 2, da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro, foi alterado no sentido de os artigos 3.º e 20.º a 76.º somente produzirem efeitos a partir de abril de 2020, ou seja, com impacto no orçamento de 2021.

Segundo a análise do CFP, esta terça-feira divulgada, a proposta de lei agora em debate no parlamento introduz novos adiamentos, designadamente no que respeita à entrada em vigor da Entidade Contabilística Estado e à orçamentação por programas.

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Entre os “vários adiamentos” de disposições da LEO agora previstos está a aprovação do decreto-lei com as especificações e orientações relativas à concretização dos programas orçamentais (a que se refere o n.º 12 do artigo 45.º da LEO e que nos termos da lei n.º 37/2018, de 7 de agosto), que deveria ter sido aprovado até ao final do primeiro semestre de 2019 e passa a ter de o ser apenas até ao final do primeiro semestre de 2021.

Também adiada é a adoção do modelo de programas orçamentais estabelecido na LEO, a criação da Entidade Contabilística Estado, as demonstrações financeiras intercalares e a certificação da Conta Geral do Estado pelo Tribunal de Contas, que passam a concretizar-se apenas no Orçamento do Estado para 2023.

No que se refere à eliminação da informação previsional na base do acréscimo, o CFP considera que esta proposta de alteração à LEO “pretende o regresso à base de caixa como a única ótica possível de preparação de informação previsional, o que não é compatível com um conjunto de objetivos de boa gestão pública”.

“A orçamentação na base do acréscimo, tal como prevista na versão inicial da LEO, implicaria a preparação de informação sobre o futuro, adotando uma perspetiva diferente da usada até então, assente exclusivamente na base de caixa”, sustenta, salientando que incentivaria “uma melhor gestão dos ativos públicos”, limitaria “as motivações políticas visando privilegiar a gestão de curto prazo” e possibilitaria “a divulgação transparente dos efeitos económicos das decisões orçamentais, bem como o apuramento de desvios e responsabilização associada”.

Por estes motivos, o CFP considera que a orçamentação na base do acréscimo “deverá ser mantida na LEO, já que se trata de efetivo instrumento de boa gestão, transparência e prestação de contas”.

Outras das críticas apontadas pelo Conselho às alterações à LEO têm a ver com o Quadro Plurianual de Despesa Pública (QPDP), considerando a instituição liderada por Nazaré Costa Cabral “indesejável” que este “possa sofrer alterações subsequentes por parte do Governo”.

Recordando que “este aspeto já resultava indevidamente da versão inicial”, o CFP alerta que “agora se acentua com a proposta de alteração”.

“De um ponto de vista formal, o que está em causa não é ainda a possibilidade de os limites de despesa poderem ser revistos, mas a forma como se desvirtua a relação paramétrica existente entre duas leis, a Lei das Grandes Opções do Plano (de que o QPDP faz parte) e a Lei do OE [Orçamento do Estado], a primeira uma lei vinculante, a segunda uma lei vinculada”, sustenta.

Para o CFP, alterações à Lei das GOP, designadamente para o efeito de revisão dos limites de despesa contidos no QPDP, só deve poder fazer-se “através de processos legislativos específicos, ou seja, da própria Lei das GOP”.

No que se refere aos aperfeiçoamentos introduzidos pela proposta de lei na transposição das regras orçamentais, o CFP considera que essas alterações “melhoram inequivocamente a redação” dos artigos relativos à transposição para a legislação nacional do Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação (TECG) na União Económica e Monetária.

Contudo, nota que “ainda se verificam lacunas na transposição, que podem ser melhoradas em sede de discussão na especialidade”, nomeadamente ao nível da justificação a dar pelo Governo para a necessidade de reconhecimento da existência de desvio significativo na LEO e à “insuficiência de disposições quanto à operacionalização do mecanismo de correção” desse desvio.