Porquê a República Dominicana? A pergunta começou a ser feita na comunicação social espanhola, depois de o jornal ABC ter avançado que foi para este país que se mudou o antigo rei de Espanha Juan Carlos — uma informação que ainda carece de confirmações e que foi entretanto refutada pela Direção Geral de Migrações da República Dominicana, que garante não ter registo da entrada do antigo Rei de Espanha no país.
Há, no entanto, um nome que poderia ajudar a explicar uma mudança de morada para a República Domicana do antigo monarca que está a ser investigado pela justiça espanhola: Pepe. Ou, mais prosaicamente, “rei do açúcar”.
A relação familiar
Pepe Fanjul, filho de Alfonso Fanjul e Liliana Rosa Gómez-Mena — e que na verdade se chama Jose, sendo “Pepe” o nome pelo qual é conhecido —, é um dos quatro irmãos que gerem o império Fanjul Corp, um vasto conglomerado empresarial que domina mundialmente a indústria do açúcar e que, além disso, investe ainda em negócios no setor imobiliário e turístico.
Pepe e Juan Carlos são “como irmãos”, escreve o jornal espanhol ABC, que dizia ainda que tinha sido “provavelmente” para se reunir com o amigo de longa data que o pai do atual monarca espanhol, o Rei Felipe VI, teria viajado para a República Dominicana, algo ainda por confirmar. Aliás, houve até rumores de que o rei poderia ter rumado até S. Domingo via Portugal, através de um avião particular enviado pelo próprio amigo; domingo, teria saído de Madrid para a Galiza, entrado no nosso país de carro até ao Porto e aí seguido no Falcon que já o esperava até à ilha do Caribe onde, apesar de existir acordo de extradição para Espanha, há muitas excepções que o protegem juridicamente.
A ligação entre os dois é antiga, por via familiar, mas obriga a alguma ginástica mental na explicação: a avó de Pepe Fanjul tinha uma irmã, Edelmira Sampedro, que esteve casada com um membro da família Real espanhola, o príncipe das Astúrias — e, mais importante para o caso, tio de Juan Carlos — Alfonso Borbón e Battenberg. Ou seja: o antigo rei de Espanha que saiu agora do país teve um tio que casou com uma irmã da avó deste “rei do Açúcar”.
Mais interessante, porém, é a história do amigo de Juan Carlos que poderia dar ao antigo Rei de Espanha o conforto e a privacidade que as suas luxuosas propriedades na República Dominicana garantem.
Pepe Fanjul cresceu em berço de ouro: o pai, o já falecido Alfonso Fanjul Sr., descendente de uma família de emigrantes espanhóis, aprofundou ao longo da vida os negócios familiares na indústria do açúcar, tendo para isso contribuído também o casamento com Liliana Rosa Gomez-Mena, mãe de Pepe, também ela de uma família que criara fortuna no setor. Era, ainda por cima, filha única. Num extenso perfil que fez da família Fanjul, a Vanity Fair conta que após a morte do pai, a mãe do amigo de Juan Carlos, Pepe, disse à madrasta que a herança ficaria toda para si — ela que vendesse as muitas joias que tinha e que se “remediasse” desse modo.
Unidas as famílias Fanjul e Gomez-Mena, o domínio no comércio de açúcar a partir de Cuba acentuou-se, mas a história teve um volte-face. No final da década de 1950, aconteceu aquilo que era “inconcebível” e inimaginável para os Fanjul: que um comunista tomasse o poder em Cuba.
Fidel atrapalhou, os EUA ajudaram
Com a ascensão do Castrismo, a situação em Cuba complicou-se para os Fanjul: o primeiro episódio foi a detenção e interrogatório do patriarca, que poucos meses depois partiria rumo aos Estados Unidos da América, aproveitando o facto de ser proprietário de alguns edifícios em Nova Iorque. Os filhos, expropriados dos negócios no país (embora tenham mantido as operações já iniciadas nos EUA e na República Dominicana), mudar-se-iam também e foi em Nova Iorque que os irmãos Pepe e Alfy ouviram palavras do avô que não esquecem, de acordo com a Vanity Fair: “Têm uma obrigação de reconstruir este império outra vez. O dinheiro não chegará para a próxima geração”.
Nos Estados Unidos da América, os irmãos “Pepe” e “Alfy”, apontados como os dois magnatas líderes do clã empresarial, reconstruíram o império Fanjul, curiosamente aproveitando os estímulos à produção de açúcar nos EUA, dado o embargo no país à importação deste produto da Cuba de Fidel. Além dos negócios na Florida e em Miami, continuaram a explorar a produção de açúcar na República Dominicana, fazendo crescer o império até patamares gigantescos — como diz o ABC, é hábito comentar-se nos EUA que duas em cada três colheres de açúcar consumidas em território norte-americano vêm do grupo Fanjul.
Incluído no ano passado na lista de pessoas mais ricas de Cuba pela revista Forbes, Pepe, agora falado devido à relação estreita com o antigo rei de Espanha Juan Carlos, é um dos empresários mais poderosos dos EUA (vive grande parte do tempo em Miami, embora passe temporadas fora do país) e tem um resort na República Dominicana onde, segundo o ABC, Juan Carlos poderia instalar-se. Trata-se do Casa de Campo, um luxuoso complexo com piscinas, uma sala de espectáculos com cinco mil lugares sentados, três campos de golfe, uma praia privada e outros luxos. No resort já ficaram instaladas celebridades como o basquetebolista Michael Jordan ou a socialite Kim Kardashian.
Outro ponto curioso é a orientação política de “Pepe” Faljun, que é distinta da orientação do seu irmão, “Alfy”: o segundo é democrata, o primeiro não só é um republicano convicto como é apoiante das políticas de Donald Trump. Uma das últimas vezes que o seu nome foi mencionado na imprensa norte-americana foi, aliás, em fevereiro, a propósito de um jantar de angariação de fundos com alguns dos empresários mais ricos que contribuem financeiramente para o Partido Republicano. Nesse jantar, escreveu então o Politico, esteve presente o amigo do antigo Rei de Espanha.