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Bruxelas considera, "nesta fase", que injeções de capital dos Açores na Sata são ajuda ilegal

Este artigo tem mais de 4 anos

Carta da vice-presidente da Comissão ao Governo considera, nesta fase, que aumentos de capital feitos por Governo açoriano são ajuda ilegal. Portugal pode invocar exceção na Sata, mas tem de provar.

Vice-presidente da Comissão, Margrethe Vestager tem o pelouro da concorrência
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Vice-presidente da Comissão, Margrethe Vestager tem o pelouro da concorrência

Vice-presidente da Comissão, Margrethe Vestager tem o pelouro da concorrência

A Comissão Europeia considera, nesta fase, que os aumentos de capital aprovados pelo Governo regional dos Açores na Sata constituem uma ajuda de Estado ilegal, o que fundamentou a abertura de um processo de investigação aos apoios dados à companhia área açoriana desde 2017. Esta avaliação, ainda preliminar, consta da carta enviada às autoridades portuguesas pela vice-presidente Margrethe Vestager, que tem o pelouro da concorrência e que acompanha a autorização dada Bruxelas a um apoio adicional de emergência, no valor de 113 milhões de euros à Sata.

Nesta carta dirigida ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, a Comissão Europeia invoca três aumentos de capital aprovados entre 2017 e 2020 e que não foram notificados a Bruxelas, no quadro do regime de ajudas de Estado. Se a investigação confirmar esta conclusão preliminar, o apoio dado pelo governo açoriano constitui uma ajuda ou resgate ilegal, dada a situação difícil em que a companhia aérea estava em 2017, com capital próprio negativo, e devido a problemas estruturais e que não são atribuíveis à Covid-19.

Neste cenário, e para além da devolução da ajuda, pode estar em causa a regra europeia que permite a atribuição de ajudas de Estado a companhias áreas —  como os 113 milhões de euros agora aprovados — apenas no caso de as empresas não terem recebido qualquer apoio nos últimos dez anos. A Comissão reconhece o carácter periférico dos Açores, as obrigações de serviço público prestadas pela Sata e a necessidade de assegurar a conetividade da região, bem como a insuficiência atual de ofertas concorrentes nos voos para a região e entre ilhas. Permite por isso avançar com o apoio de emergência, enquanto corre a investigação às ajudas dadas no passado.

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Em causa estão três aumentos de capital aprovados pelo acionista único da Sata, o governo açoriano, entre 2017 e 2020, no valor total de 128,6 milhões de euros. Deste montante, foram realizados até agora 72,6 milhões de euros (o resto seria entregue até 2023). Estas operações foram justificadas com a necessidade de a empresa cumprir o artigo 35 do código das sociedades comerciais, segundo o qual os prejuízos acumulados não podem “comer” mais de metade do capital social da empresa (uma situação que é classificada como de falência técnica e que existe por exemplo há vários anos na TAP).

Portugal argumenta que não são ajudas de Estado — não tendo sido notificadas como tal à Comissão Europeia —  porque o Governo regional atuou como um investidor privado em condições normais de mercado numa intervenção estrutural que tem como perspetiva o retorno a longo prazo do capital investido. Além de que uma eventual situação de incumprimento dos compromissos da Sata teria tido um impacto financeiro maior e os fundos são suportados pelo orçamento regional.

É ainda assinalada a circunstância específica de uma companhia regional que presta um serviço público fundamental de transporte da população local e da comunidades açorianas no estrangeiro numa região ultraperiférica e que não poderia ser colmatada por concorrentes privados. Ou seja, a Sata cumpre obrigações de serviço público, para além de assegurar serviços de interesse geral.

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Bruxelas nota que há outras companhias a voar para os Açores, como a Ryanair, a Jetairfly e a Arkefly, que não tiveram acesso aos mesmos apoios, logo os aumentos de capital, tal como o empréstimo aprovado recentemente “distorcem ou ameaçam distorcer a concorrência.” E questiona o argumento do investidor privado. A Sata tem prejuízos pelo menos desde 2014 e o valor dos seus ativos seria insuficientes para cobrir todas reclamações de credores em caso de insolvência, pelo que, conclui a Comissão, um investidor privado teria pouco a perder neste cenário. Nestas circunstâncias, o acionista da transportadora não poderia esperar um retorno do capital aplicado em 2017 e não ser que essa expetativa estivesse “sustentada em pressupostos irrealistas ou irrazoáveis”.

A não ser que Portugal forneça dados ou respostas adicionais que sustentem a alegação de que o aumento de capital decidido pelos Açores poderia ter sido realizado por um investidor privado, Bruxelas defende nesta fase que as operações parecem ter dado uma vantagem ao seu destinatário face aos concorrentes. E a conclusão de que houve uma ajuda de Estado dada no passado ilícita torna duvidosa a sua compatibilidade com o apoio agora atribuído, acrescenta o documento que acompanha a decisão publicada sobre a companhia aérea açoriana.

A Sata tinha seis aeroanves em 2019

GREGÓRIO CUNHA/LUSA

Portugal pode ainda invocar uma exceção com base na existência de circunstâncias imprevistas e pelas quais a beneficiária não é responsável. “Cabe às autoridades portuguesas identificar essas circunstâncias e demonstrar que a beneficiária não é responsável e porque são excecionais e imprevisíveis”, refere a missiva enviada por Margrethe Vestager.

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Dito isto, a Comissão reconhece que a Sata fornece serviços essenciais em rotas que são fundamentais para a mobilidade e transportes da região. E ponderou as informações apresentadas por Portugal de que as rotas asseguradas pela companhia (nomeadamente entre as ilhas) não atraíram voos de outras companhias. Da mesma forma, o número de rotas asseguradas entre os Açores e o resto da União Europeia por outras companhias é reduzido. Logo a oferta assegurada pela Sata garante a indispensável conetividade aérea na região.

Por isso, e apesar das dúvidas sobre a compatibilidade das ajudas com o regime comunitário, Bruxelas também admite que sem a liquidez necessária para operar, a Sata seria colocada numa situação que poderia ser irreversível e que a impediria de assegurar os serviços de interesse geral. E neste cenário, seria altamente improvável que  surgissem operadores alternativos para fornecer um serviço mínimo ou a atual oferta, o que representaria “uma ameaça séria” à conetividade das ilhas, numa região que já é ultraperiférica.

Aeroporto de Ponta Delgada,

Aeroporto de Ponta Delgada

EDUARDO COSTA/LUSA

Uma das exigências de Bruxelas às autoridades portuguesas é que prove que a decisão de aumentar o capital da Sata foi realizada com base em avaliações económicas comparáveis com as que um investidor privado tomaria em circunstâncias similares. Caso essas provas não sejam remetidas, e validadas, os serviços da Comissão Europeia querem receber dados que suportem a tese de que estas operações foram concedidas de forma excecional e não prevista, com provas de que os aumentos de capital permitiram corrigir falhas ou um serviço insuficiente, ou ainda compensar a empresa pela prestação de obrigações de serviço público que não poderia recusar assegurar.

É ainda pedida uma explicação detalhada das circunstâncias e passos concretos dados para assegurar e manter as obrigações de serviço público por parte da Sata, e no caso dessas obrigações não serem atribuídas à empresa, qual o tempo necessário para escolher fornecedores alternativos de transporte aéreo. E por fim, Bruxelas quer conhecer as condições e um calendário para lançar um concurso público para recolher propostas alternativas de vários interessados em fornecer serviços públicos e serviços de interesse geral, a um custo mais baixo para a região e com uma compensação definida previamente e de forma objetiva que cubra os custos necessários para garantir esta oferta.

A abertura da investigação à Sata foi divulgada na semana passada na sequência da autorização dada por Bruxelas a um apoio de emergência de 113 milhões de euros para garantir a liquidez da companhia aérea até janeiro do próximo ano. Tal como na TAP, o pedido de Portugal para dar ajuda pública à Sata surgiu na sequência do impacto da pandemia nas operações da empresa. O apoio à transportadora açoriana será concedido sob a forma de garantia de Estado a um empréstimo a contrair junto de entidades financeiras privadas, enquanto no caso da TAP é o próprio Estado que empresta até 1,2 mil milhões de euros, quase dez vezes mais que o apoio concedido à Sata.

Mas nos dois casos, as ajudas foram enquadrados ao abrigo do regime comunitário de ajuda de Estado que impõe uma reestruturação se, no prazo de seis meses, o financiamento não for devolvido. Tal como a TAP, também a Sata ter de um plano de reestruturação negociado com a Comissão Europeia por Portugal, confirmou ao Observador fonte oficial da Comissão.

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