Elon Musk, o famoso multimilionário por detrás da SpaceX e da Tesla, fez uma promessa e cumpriu — ou mais ou menos. A jura de Musk era a de que ia mostrar um protótipo funcional de um aparelho que se liga ao cérebro da Neuralink, a sua empresa de neurotecnologia. Tecnicamente, fê-lo, mas com a ajuda de “três porquinhos”. Contudo, depois de muitas explicações sobre o potencial da tecnologia, acabou tudo por revelar um vídeo de recrutamento para os engenheiros informáticos enviarem o seu currículo para esta empresa e ajudarem a construir o aparelho.

O Neuralink é como uma Fitbit [marca de pulseira inteligente] no vosso crânio, com fios pequeninos” , disse Musk.

Não estamos a tentar ganhar dinheiro, estamos a tentar convencer pessoas fantásticas para virem trabalhar na Neuralink“, disse Musk no início da apresentação sem rodeios. Mesmo assim, não deixou de mostrar um protótipo de um gadget que quer ajudar a resolver problemas de saúde no futuro e criar uma ligação mais fluida entre humanos e máquinas.

Precisamos de pessoas que nos ajudem na engenharia, se trabalhavam em aparelhos como smartwatches e smartphones queremos que nos contactem. Atenção, não é preciso experiência prévia em cérebros. Por favor, mandem os vossos currículos”, disse Musk.

Na prática, o neuralink — o aparelho tem o mesmo nome da empresa — ainda é um protótipo e promete realmente ter potencial, mas nada é certo. Pode vê-lo na imagem deste artigo. Tem o tamanho de “uma moeda”, substitui uma pequena parte do crânio para se ligar ao cérebro e é instalado através de uma pequena operação feita por um robô. Sim, leu tudo bem. Depois, é como qualquer outro gadget atual: carrega-se sem fios como um “relógio inteligente ou um smartwatch” e permite transmitir sinais do cérebro diretamente para uma app no telemóvel através de Bluetooth. Ao todo, comunica com o cérebro através de 1.024 pequenos elétrodos que ficam ligados ao cérebro.

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O robô com que Musk quer fazer a instalação do neuralink no cérebro

Isto permite ligar o cérebro a outros gadgets para substituir olhos por câmaras ou “saber se uma pessoa vai ter um ataque cardíaco e avisá-la antes”, como explicou Musk. E quanto é que isto custar? “Vai ser muito caro no início, mas vai deixar de o ser rapidamente”, diz Musk. “Queremos reduzir o preço ao máximo”. “Com a cirurgia, queremos que custe uns milhares de dólares, acho possível”, disse o empresário que quer lançá-los no futuro, mas não avançou com uma data em concreto.

A evolução do neuralink que Musk apresentou em 2019 e o que mostrou agora. Só tem o tamanho de “uma moeda”, diz

“Três porquinhos” para mostrar como um neuralink não mata e pode ser atualizado por um melhor, como um smartphone

A conferência em digital estava marcada para as 11 horas da noite desta sexta-feira e começou com mais de 40 minutos de atraso. A certa altura, foi Elon Musk que deu algum sinal de vida e disse, no Twitter, que o evento ia “começar brevemente”. O que aconteceu a seguir foi ao estilo fora do comum de Musk.

Como será feita a instalação de um neuralink

Começou a apresentação com várias promessas e mostrou os “três porquinhos” como apelidou o milionário, que utiliza para os testes. Uma, a Gertrude, tinha um Neuralink implementado no cérebro e isso permitia que uma máquina reconhecesse sempre que cheirava comida. Do lado tecnológico físico, além da máquina, foi isto que Musk mostrou. Depois, vieram as promessas do potencial da tecnologia.

A melhor maneira de explicar o que é o neuralink é mostrar como o corpo humano pode ser melhorado através da tecnologia. Até agora, a resposta tem sido respondida pela ficção científica, seja o Robocop dos anos 80, o super-herói da D.C. Cyborg ou, mais recentemente, com Bethany Bisme-Lyons da série da BBC “Year and Years”.

Pegando na última série que mostra um futuro próximo do nosso como exemplo — não fazendo demasiados spoilers [revelações] –, Bethany afirma que quer ser “transhumana”. O que é que isso significa? Aquilo que a Neuralink quer tentar dar ao mercado e mostrou nesta conferência: permitir através da tecnologia que, a pouco e pouco, o nosso corpo possa estar cada vez mais ligado com as máquinas. Infelizmente, como também esta série mostra, pode haver desvantagens — imagine que tem de atualizar um software no seu corpo para continuar a viver normalmente, por exemplo.

Uma das porcas que Musk levou a palco. Esta era a Dorothy, que teve um neuralink instalado e foi retirado

Cada um dos porcos que Musk levou ao palco digital tinha um propósito e um dos dois que não tinha nenhum neuralink foi “a prova” de como o multimilionário até já pensa em substituir aparelhos que, se calhar, vamos querer ligar aos nossos cérebros. A porca Dorothy “teve um neuralink instalado e foi retirado”, explicou o empresário. “Isto serve para mostrar como quem quiser remover o aparelho pode fazê-lo sem danos ou atualizá-lo. Ninguém quer andar com um modelo antigo de smartphone“, ilustrou Musk.

“[Com o Neuralink instalado] Só se vê uma pequena cicatriz. Eu podia ter um agora e nem iam perceber com o cabelo. Se calhar tenho”, explicou Musk entre risos. Além do aparelho, mostrou também a máquina que poderá ajudar médicos a fazerem a cirurgia para se implantar um neuralink. O empresário explicou: “Em menos de uma hora instala-se, é o objetivo. Podemos entrar numa manhã no hospital e sair no final da tarde. Fechamos com uma supercola e pode-se andar depois, é muito fixe”. Musk diz já a trabalhar com as autoridades de saúde dos EUA — a FDA (Food and Drug Admnistration) — para poder desenvolver tudo.

Queremos que este robô possa fazer toda a cirurgia. Queremos ter um sistema completamente autónomo”, disse Musk.

O resto da conferência foi dedicado a responder a perguntas enviadas pelo Twitter sobre o que a equipa que está atualmente a desenvolver o neuralink e Elon Musk esperam que este aparelho possa fazer. “Vai ser possível jogar videojogos?”; “Posso um dia chamar o meu Tesla por telepatia?”; “Vamos poder falar por telepatia com outras pessoas com um Neuralink?”; “Vou poder guardar as minhas memórias como ficheiros informáticos?”. O que não faltaram foram perguntas quase de ficção científica que tiveram, por norma, um “sim, será possível”, como resposta. É o que o neuralink vai fazer? Depois da apresentação, não parece certo. Porém, Musk e a equipa mostraram estar cativados e ter imaginação para pensar nestes cenários que querem que o gadget faça.

[Veja no vídeo abaixo a apresentação desta sexta-feira da Neuralink]

Musk já afirmou em várias ocasiões que acredita que a inteligência artificial avançada, não controlada e não regulamentada, representa um risco existencial para a humanidade. Por causa disso, voltou a repetir a ideia de que o Neuralink pretende ser um meio de proteção contra essa ameaça. Adicionalmente, Musk tem também referido nos últimos anos que a ligação com um computador através de um rato ou teclado é limitada e que um sistema mais avançado pode colmatar estas falhas.

A Neuralink Corporation é uma empresa registada no estado norte-americano da Califórnia na área da neurotecnologia e foi fundada em 2016. Pretende desenvolver interfaces entre cérebros humanos e computadores sob a forma de implantes. Elon Musk chegou a adjetivar em 2019 essa ligação de “simbiótica”. Um “laço neural”, como batizou o empresário, que adiantou que funcionaria como “uma espécie de terceira camada digital sobre o córtex cerebral, que cobre o sistema límbico”.

Em julho de 2019, Musk chegou a afirmar que a empresa tinha conseguido realizar testes bem sucedidos destes implantes em macacos e ratos. Na altura, o multimilionário disse que havia a expetativa de começar a fazer testes em humanos já em 2020.

[O multimilionário tem partilhado no Twitter as novidades sobre a Neuralink até agora]

A Neuralink tinha em 2019 alguns cientistas reconhecidos na área, a trabalhar para Elon Musk. Alguns deles — Timothy L. Hanson, Camilo A. Diaz-Botia, Viktor Kharazia, Michel M. Maharbiz e Philip N. Sabes — publicaram, em abril, um estudo chamado “A máquina de costura para gravações neurais minimamente invasivas”, que disserta sobre uma forma de implantar essas interfaces de forma célere em cérebros de ratos.