Esta sexta-feira foi dia de gabinete de crise em São Bento, o primeiro desde o final de junho, quando o país estava com metade do número de casos de Covid-19 do que agora. Este disparar de casos no fim do Verão apanhou de surpresa o Governo que esperava que uma subida acontecesse apenas já em pleno outono, início do inverno. Por isso o discurso sobre a necessidade de conter o vírus vai apertar, até porque — e o primeiro-ministro tem insistido nesta ideia — o país “não pode parar como em março”. Mesmo que os casos venham a subir acima do que aconteceu nessa altura.

Neste momento navega-se à vista. Nos próximos quinze dias o Governo quer avaliar o impacto do regresso à escola e ao trabalho e depois disso acertar medidas, sendo certo o entendimento de que “já se gastaram todas as armas“, como diz fonte do Executivo ao Observador para explicar que o Estado de Emergência é uma carta afastada por princípio, porque o país não pode parar. Sobretudo pelas consequências económicas brutais que essa nova paragem significaria, quando as empresas e o Estado “já gastaram a almofada” que tinham em abril.

À saída da reunião com os ministros da Economia, Negócios Estrangeiros, Finanças, Defesa, Administração Interna, Trabalho, Educação, Saúde e Infraestruturas, o primeiro-ministro avisou que na próxima semana o número de novo casos disparará para mil diários, mas isso não significa um regresso ao mesmo estado de exceção que vigorava nessa altura.

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A avaliação feita é que hoje 1500 casos — e nestas últimas 24 horas foram 780 novos — não querem dizer a mesma coisa que os 1500 casos registados a 10 de abril, data do valor recorde. Ou seja, não faz soar as mesmas campainhas que fez soar nessa altura, já que “a capacidade de testagem é incomparável“, a capacidade de resposta do SNS é maior em termos de cuidados intensivos e a faixa etária onde se concentram os assintomáticos é mais baixa,  argumenta-se no Governo.

Uma base de confiança, mas comedida. Até porque o disparar de casos veio mais cedo do que o previsto, na medida em que é possível prever alguma coisa a longo prazo neste campo. A queixa maior face aos especialistas que aconselham o Governo em matéria de Covid-19, aliás, mantém-se intacta: as análises do que passou chegam, mas previsões que apoiem as decisões futuras nem por isso. Por isso, neste momento não há propriamente um quadro desenhado para precaver medidas futuras, pelo menos para lá daquilo que António Costa estabeleceu por agora e que se resume a isto: “Não podemos parar como em março”.

Não há sequer uma fasquia colocada — em casos novos ou internamentos em Unidades de Cuidados Intensivos — a partir da qual as medidas tenham de apertar, nestas contas que se fazem no gabinete de crise. Afinal, a subida de casos apareceu numa altura prematura, quando se esperava que isso pudesse acontecer apenas e só quando o país estivesse em plena atividade, nomeadamente com os alunos nas escolas. E esse dado não está ainda a rolar, já que só esta semana arrancou o ano letivo, depois de uma paragem de seis meses — ainda não houve aulas desde que a pandemia está à solta. E quanto a essa nova realidade, a avaliação só se fará dentro de quinze dias e as medidas ajustadas depois de passado este primeiro período em que o país voltou a estar todo em estado de contingência, a contar de 15 de setembro.

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E o Natal? António Costa já fez um primeiro aviso esta sexta-feira sobre essa época. E ao que o Observador apurou a ideia é manter essa época festiva longe das medidas restritivas que foram impostas na Páscoa. Nessa altura, a circulação para fora do concelho de residência foi proibida, uma medida a que o Governo não quer ter de voltar.

O quadro de uma subida ainda mais acentuada é visto com desconfiança, já que a expectativa é que o regresso à rotina traga também o regresso a comportamentos mais disciplinados no uso de máscara e no cumprimento do distanciamento físico, mais do que aconteceu durante o Verão. Aliás, o aumento de casos nas últimas semanas está a ser avaliado dentro do Governo como uma consequência do relaxamento que aconteceu durante o verão.