Se o governo socialista pensa que assustar o PCP com “uma crise institucional” vai fazer com que os comunistas validem o Orçamento do Estado para o próximo ano, está enganado. O secretário-geral já tinha aproveitado o discurso de encerramento da Festa do Avante para avisar Costa que “não valia a pena ameaças de crise política” e reiterou uma vez mais: “Não pensem em chantagear e pressionar o PCP em nome de uma crise institucional. Procurem responder ao PCP com propostas concretas“.

Em entrevista à Antena 1, Jerónimo de Sousa não descarta a hipótese de o PCP voltar a votar contra no Orçamento do Estado — depois do chumbo dado ao Orçamento Suplementar — e diz que será preciso mais que “reconhecer duas ou três propostas do PCP”, deixando “claro que este é um momento de opções”. “O grande problema é que Portugal tem défices estruturais tremendos e, para responder a esses défices, não tem havido uma opção concreta de romper com o caminho do passado e romper com esses défices que nos estrangulam”, afirmou o secretário-geral do partido vincando que o PCP continuará o seu caminho “independentemente de jogos de poder que possam estar em curso”.

No momento em que esse orçamento tiver como conteúdo repetição de mais do mesmo e benefício dos do costume e prejuízo para quem trabalha ou trabalhou pergunto como podem exigir do PCP um voto a favor de um documento que reflita opções de classe e dos poderosos. Que fique claro: este é um momento de opções”, afirmou Jerónimo.

E sobre os jogos de poder, o PCP também já foi claro e, agora que já apresentou o candidato próprio à Presidência da República, continua a endurecer as críticas a Marcelo. Acusa o atual Presidente da República de estar a promover um branqueamento do PSD, procurando “trazê-lo para o campo governativo com entendimentos entre o PS e o PSD”. Tendo em vista esses entendimentos entre o PS e o PSD, caso o Governo não consiga os tão desejados acordos à esquerda, Jerónimo vai já avisando: “O PS, o PSD, tal como o PCP, são livres nas opções que entenderem. Repetir uma experiência falhada como foi o bloco central que existiu será da responsabilidade do PS e do PSD. Não vamos, em nenhuma circunstância, perder o poder soberano que temos em relação à nossa intervenção e aos conteúdos”.

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Ainda sobre a prestação de Marcelo Rebelo de Sousa em Belém, Jerónimo diz que Marcelo foi “mais o Presidente dos poderosos do que dos trabalhadores”. “Em momentos decisivos em que o Presidente da República foi chamado a pronunciar-se muitas vezes ficou do seu lado [dos poderosos]. No fundo tem a sua opção política e lógica e não foi capaz de dar corpo, substância e realização a esse principio de defesa [da Constituição da República Portuguesa]”, apontou o secretário-geral do PCP.

Jerónimo de Sousa negou que as negociações para o OE já estejam a decorrer, lamentando ainda que não exista uma “proposta de Orçamento”. Segundo o líder comunista até aqui só têm acontecido “contactos institucionais”.

Relativamente a uma nova paragem na economia, com a necessidade de imposição de um confinamento obrigatório para conter o crescimento da pandemia, Jerónimo considera que “é preciso manter o país a trabalhar, garantindo todas as normas de segurança e sanitárias”. Questionado sobre se a realização da Festa do Avante foi também sinal dessa necessidade de continuar e não parar todas as atividades, Jerónimo de Sousa recordou a “campanha e barbaridades” que foram ditas até à realização da Festa e avançou que o partido está a ponderar realizar um dossier sobre todo o processo até à realização da Festa.

“A verdade é que fomos para a frente com sentido de responsabilidade, mas coragem, porque sabíamos que tínhamos capacidade para encontrar as soluções de defesa da saúde. Ao 14.º dia afinal não se verificaram nenhum daqueles argumentos tremendistas. A perceção resultou da manipulação. Agora dão a comparação com o Chega ou com a Igreja Católica. Não devem dar esses exemplos, encetaram uma operação de grande envergadura que foi derrotada com a iniciativa”, apontou ainda o líder do PCP depois de terem sido noticiados os milhares de peregrinos em Fátima a 12 e 13 de setembro e o incumprimento geral das normas na II Convenção do Chega, em Évora no último fim de semana.

Já sobre a aproximação da data do Congresso do partido e a eventual substituição do secretário-geral, Jerónimo de Sousa escusou-se uma vez mais a dar qualquer garantia do que irá acontecer no futuro. Sobre a hipótese de João Ferreira assumir a liderança do partido, mesmo que seja um quadro do PCP que já nasceu depois do 25 de Abril — numa altura em que o PCP já está envolvido na comemoração dos 100 anos do partido —, Jerónimo negou que haja qualquer “conflito de gerações neste PCP”.

Em relação à aposta, uma vez mais, em João Ferreira para encabeçar umas eleições Jerónimo repete que o partido não trabalha para percentagens eleitorais. “Quando fizemos esta opção do João Ferreira não procuramos percentagens eleitorais. Há um critério diferente. Geralmente nos outros partidos fazem-se as contas em relação às percentagens eleitorais com responsabilização individual. Nós assumimos os resultados positivos ou negativos como uma questão do nosso coletivo partidário. As contas ainda não estão feitas,  falta o decisor principal, o povo português, decidir como vai votar”, apontou.