A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) propõe para o próximo ano uma variação nula nas tarifas reguladas da eletricidade que se aplicam a um milhão de consumidores domésticos. As tarifas agora propostas da pela ERSE, e que ainda terão de ser aprovadas até ao final do ano, representam uma mudança na tendência de queda verificada nos últimos três anos e que foi acentuada já em abril com uma baixa extraordinária dos preços de 3%.

No entanto, e ao contrário do que aconteceu em anos recentes, as tarifas de acesso à rede vão subir entre 1,6% para grandes empresas e 4,2% para clientes domésticos, de acordo com a proposta conhecida esta quinta-feira. E estes aumentos serão passado para os cinco milhões de consumidores de eletricidade que estão no mercado liberalizado a partir do início do próximo ano.

A ERSE recorda que a variação dos preços destes consumidores irá também refletir a componente de energia adquirida em mercado pelos comercializadores. Por isso, considera que face aos preços “historicamente baixos do mercado grossista  “é possível que estes permitam compensar o acréscimo das tarifas de acesso às redes e que o efeito líquido não resulte em acréscimos da fatura total da energia elétrica”.

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Já em maio, as maiores elétricas tinham atirado para o início do próximo ano a decisão de baixar o preço nos seus contratos, para o ajustar à queda das cotações no mercado. Mas agora terão de refletir também o agravamento das tarifas de acesso. Para baralhar ainda mais as contas da famílias, em dezembro entra em vigor a redução do IVA para consumos mínimos até ao escalão de 6,9 kVa, uma medida que o Governo diz que vai beneficiar quase todas as famílias.

As medidas excecionais para travar os preços (e a descida da dívida) da eletricidade

Os aumentos das tarifas de acesso refletem os impactos dos efeitos da pandemia que fez cair o consumo e os preços no mercado grossista, mas sobrecarregou custos que são suportados por estas tarifas, em parte porque tem de ser diluídos por uma quantidade menor de energia.

Ainda mais expressivo foi o aumento da tarifa geral de acesso que é paga por todos os consumidores e onde são refletidos os custos de interesse económico geral, como as compensações às renováveis e a outras centrais. Com a baixa dos preços no mercado, o sobrecusto contratado com as renováveis e a central do Pego disparou, pressionando as tarifas da eletricidade para 2021 que têm de suportar essa diferença.

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A tarifa de uso geral onde estão esses encargos subiu 10%. O impacto destes aumentos é travado por dois fatores, a acentuada descida dos preços da eletricidade no mercado grossista a opção de suspender a diminuição da dívida tarifária. Este travão resultou da autorização dada pelo Governo ao regulador para adiar a passagem dos sobrecustos com alguns contratos de produção de eletricidade para anos seguintes de forma a atenuar o seu impacto no sistema e evitar um aumento expressivos dos preços da eletricidade.

Fica assim interrompido um ciclo de cinco anos de eliminação gradual do défice tarifário que começou no ano de 2016, quando a dívida tarifária atingiu o valor recorde de cinco mil milhões de euros. Esta dívida (ou défice) resulta de sucessivas decisões políticas tomadas desde o tempo do ministro da Economia, Manuel Pinho, para evitar aumentos acentuados dos preços finais, atirando para o futuro o pagamento dos custos imputados ao sistema por vários governos.

Evolução da dívida tarifária da eletricidade

Esta dívida (que é dos consumidores às empresas — sobretudo a EDP) representa um dos maiores encargos dos preços da eletricidade já que tem ser amortizada, não apenas em capital, mas também com juros. E esses juros são em regra suficientemente atrativos para a EDP conseguir vender em mercado essa dívida, através de operações de titularização.

Quanto maior for a dívida, no final de 2021 ficará nos 2.757 milhões de euros, maior a fatura que os consumidores têm de pagar nos preços da eletricidade. Para o próximo ano essa fatura entre juros e capital vale mais de mil milhões de euros.

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Governo valida corte das sobrecompensações pagas a centrais da EDP

Outra decisão do Governo que travou o preço da eletricidade foi a aplicação do despacho relativo às sobrecompensações pagas às centrais da EDP apuradas em auditoria. Num despacho de 2017, o anterior secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, aprovou a devolução de 72 milhões de euros de ganhos em excesso no mercado dos serviços de sistema.

Mas o atual secretário de Estado, João Galamba, teve dúvidas jurídicas sobre a aplicação desta medida — a EDP foi condenada pela Autoridade da Concorrência por causa desta questão — e avançou com um pedido de parecer à Procuradoria-Geral da República anunciado depois de o Observador ter noticiado que este corte iria ficar na gaveta. O Observador questionou a ERSE e o Ministério do Ambiente e Ação Climática sobre a dimensão desta medida na redução dos custos que vão às tarifas da eletricidade, mas o regulador diz só dá números quando houver decisão final. O ministério ainda não respondeu.

Outras medidas referidas pela ERSE como tendo um efeito positivo nos preços passam pela receita da venda em leilão de licenças de CO2, o mecanismo de equilíbrio dos custos (fiscais) entre Portugal e Espanha, a previsão de transferência da receita com a contribuição extraordinária sobre as empresas de energia para o sistema elétrico e ainda a aplicação do despacho que declarou nulos uma parte dos pagamentos feitos à EDP, ao abrigo dos CMEC (custos de manutenção do equilíbrio contratual).