A EDP vai deixar cair os processos de impugnação do pagamento da contribuição extraordinária sobre a energia (CESE) contra o Estado. Em causa está uma litigância judicial que ascendia já a 474 milhões de euros, considerando a CESE paga e contestada, no valor de 388 milhões de euros, mas também IRC de 86 milhões de euros associado à reclamação da dedutibilidade da contribuição no imposto sobre os lucros.

A empresa liderada por Miguel Stilwell de Andrade justifica esta desistência com o “contexto da atual crise pandémica e no seguimento da análise periódica da probabilidade de sucesso e custos com processos judiciais em curso”. A informação é avançada pela empresa no relatório das contas do terceiro trimestre, divulgado esta quinta-feira e onde é anunciado um lucro consolidado de 422 milhões de euros até setembro, uma queda de 8% face ao mesmo período do ano passado.

A EDP tem vindo a pagar a CESE, desde que foi criada em 2014, tendo os pagamentos em dia, mas avançou no Tribunal Administrativo contra esta contribuição extraordinária que se tem prolongado no tempo. REN e Galp também contestam a CESE, mas só a petrolífera nunca pagou. A desistência  é anunciada também depois de a proposta do Orçamento do Estado para 2021 ter confirmado a intenção do Governo em reduzir as taxas de incidência desta contribuição cuja receita tem sido usada em parte para abater ao défice tarifário da eletricidade.

“A EDP continua a assumir a redução gradual desta contribuição ao longo dos próximos anos, em linha com a descida sustentada da divida tarifária do sector, tal como previsto no Orçamento de Estado”, refere o relatório trimestral.

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Empresa vai contestar corte de 73 milhões e o pagamento da tarifa social em Bruxelas

Em outra frente de litígio, a elétrica revela a intenção de contestar a imposição do pagamento da tarifa social às empresas produtoras de energia junto da Comissão Europeia, a quem será pedida uma “análise da conformidade relativamente ao futuro do mecanismo de financiamento da Tarifa Social, a cargo dos produtores em regime ordinário, face às normas e princípios do direito da União Europeia”.

A EDP contesta não a existência da tarifa social, mas sim o mecanismo do seu financiamento que desde 2011 foi imputado à empresa e a outras produtoras de eletricidade. Com o alargamento da tarifa social, via atribuição automática, a mais de 700 mil famílias já durante primeiro Governo socialista, os custos para EDP com esta medida chegam aos 460 milhões de euros, incluindo já o valor previsto para 2021.

No mesmo documento são divulgadas as intenções de avançar com contestações de outras decisões de natureza regulatória que prejudicaram a EDP, para baixar os custos do sistema elétrico com um impacto favorável nos preços da eletricidade.

Em causa está a sobrecompensação às centrais da empresa pelos serviços de sistema cobrados ao abrigo do regime CMEC até 2013. A devolução do “excesso” cobrado de 73 milhões de euros ao sistema elétrico, é uma das medidas que permite conter os preços da eletricidade em 2021. A perda desta receita teve já um impacto negativo nos resultados do terceiro trimestre da EDP. Outro ponto de conflito é a decisão deste Governo de considerar apenas o imposto sobre os produtos petrolíferos como custo que deve entrar nas contas que anulam os fatores fiscais entre Portugal e Espanha no preço grossista da energia elétrica.

As duas decisões tomadas pelo secretário de Estado da Energia, João Galamba, acabam por validar processos que tinham sido decididos durante o tempo do seu antecessor no cargo, Jorge Seguro Sanches, mas depois de obtidos pareceres sobre a sua legalidade e/ou adequação. No caso da sobrecompensação às centrais da EDP, a devolução às tarifas do sobreganho apurado por uma auditoria independente, já tinha sido objeto de despacho em 2017, mas só avançou nas tarifas de 2021, depois de um parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República, pedido por João Galamba.

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Já no caso do equilíbrio entre fatores fiscais e para-fiscais entre Portugal e Espanha, conhecido como o Clawback, uma portaria recente confirma que o único elemento a agravar os custos da produção de energia que pode ser neutralizado por este mecanismo é o imposto sobre os produtos petrolíferos.

As elétricas reclamavam que também os custos com a CESE e a tarifa social fossem considerado neste mecanismo, de acordo com legislação aprovada pelo secretário de Estado da Energia do Governo de Passos Coelho, Artur Trindade, mas esta decisão foi anulada pelo Governo socialista. Depois de uma avaliação pedida à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, João Galamba manteve o entendimento que vinha do seu antecessor, excluindo da fatura a passar para os preços da eletricidade os custos que as elétricas têm de assumir com a contribuição e a tarifa social.

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A EDP anunciou esta quinta-feira uma queda de 8% nos lucros consolidados, destacando os efeitos da pandemia na procura de energia, que acumula uma queda de 3,4% no mercado doméstico, na baixa dos preços da eletricidade.

A empresa voltou a ter prejuízos em Portugal de 23 milhões de euros, à semelhança do que sucede há dois anos. Esta situação é também explicada pela provisão para o encerramento da central de Sines, agendado para 2021, e pela devolução nos proveitos das centrais abrangidas pelos custos de manutenção do equilíbrio contratual, já referido. A elétrica refere ainda o aumento da provisão para as dívidas dos clientes.

Sem estes efeitos considerados não recorrentes, os resultados da EDP teriam sido de 669 milhões de euros, mais 14% que em igual período do ano passado.