Marcelo Rebelo de Sousa já respondeu por escrito, enquanto testemunha, ao coletivo de juízes que está a julgar o caso Tancos. O Presidente da República publicou esta quinta-feira na página da Presidência as duas perguntas e as respostas que deu. Uma sobre a primeira reunião em Tancos, no dia 4 de julho de 2017, após o assalto e, a outra,  sobre como teve conhecimento, a 18 de outubro de 2017, do aparecimento das armas. Só a 25 de julho do ano seguinte, garante, diz ter sabido de “uma encenação” da PJM, pela então Procuradora Geral da República, Joana Marques Vidal.

O Presidente da República mantém o que já dissera em comunicado, durante a comissão de inquérito ao caso. Mas acrescentou mais informações. Disse que logo após o furto a Tancos, quando passou nos Paióis Nacionais para ver as instalações e falar com os militares, o então diretor nacional da Polícia Judiciária Militar manifestou a sua insatisfação pela Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, ter atribuído a investigação à PJ civil. O Presidente diz que nesse dia 4 de julho de 2017, no final da reunião, foi o próprio então ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que lhe pediu que falasse com Luís Vieira, o então diretor da PJM. Marcelo acedeu e, ainda nesse dia, disse ao diretor que falaria com a magistrada e que depois falaria “oportunamente” com Vieira. Mas nunca o chegou a fazer. 

Após falar com Joana Marques Vidal e de ouvir a sua explicação, Marcelo decidiu manter conversações apenas com ela “naturalmente sempre dentro dos estritos limites da lei”, assume.

Marcelo Rebelo de Sousa diz ainda que soube da recuperação das armas pela comunicação social, mas que foi informado por Joana Marques Vidal que aquela operação seria, afinal, uma “encenação”. Essa informação foi-lhe dada em julho de 2018, mas as primeiras detenções no processo, à data em segredo de justiça, só aconteceram cerca de meses depois.

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Leia de seguida as duas perguntas e as respostas que deu ao Tribunal de Santarém:

“Em resposta às questões formuladas, na sequência da preocupação insistentemente afirmada, desde o dia 4 de julho de 2017 – dia da visita a Tancos –, de se fazer justiça “de alto a baixo, doa a quem doer”, o Presidente da República de Portugal tem a dizer o seguinte:

“No dia 4 de julho de 2017, durante a visita ao território atingido pela tragédia dos fogos florestais de junho, decidiu deslocar-se a Tancos para observar, no local, o sucedido.

Depois de ter visitado toda a área dos paióis, visto os postos de vigia e as redes de proteção, percorrido a pé o caminho entre o paiol em causa e as redes e, muito em particular, o aludido paiol, sugeriu reunião para esclarecimento do acontecido.

No decurso dessa reunião, agentes da Polícia Judiciária Militar expuseram diligências e conclusões, aludindo a escuta levada ao conhecimento do Ministério Público – tempos antes do desaparecimento do material militar – com eventual utilidade para o mais tarde acontecido, que não teria sido reportada a nenhuma autoridade militar, bem como a intervenção da Polícia Judiciária, sob a direção do Ministério Público, que estaria a criar problemas à sua atuação.

Na sequência das mencionadas alusões, secundadas pelo Diretor da instituição, pedindo ao Presidente da República que interviesse junto do Ministério Público, também quanto à avocação da investigação, o Presidente tomou nota do que ouvira e disse que iria transmitir essas preocupações à Senhora Procuradora-Geral da República e, sendo caso disso, à Senhora Ministra da Justiça.

No termo da reunião, já à saída, por sugestão do Senhor Ministro da Defesa Nacional para que falasse com o Diretor da Polícia Judiciária Militar, o Presidente da República chamou-o e disse-lhe que iria falar com ele, oportunamente. O que não viria afinal a ocorrer, por razões adiante aduzidas.

Tal como houvera dito, o Presidente da República falou com a Senhora Procuradora-Geral da República, que explicou as diligências promovidas pelo Ministério Público e o seu não acolhimento pelos magistrados judiciais competentes, a razão de ter despachado avocando a investigação sobre Tancos e, portanto, que o Ministério Público iria dirigir essa investigação.

Perante o exposto, o Presidente da República decidiu ter, no caso de Tancos, como interlocutor, apenas, a Senhora Procuradora-Geral da República, naturalmente sempre dentro dos estritos limites da lei, nomeadamente, da autonomia do Ministério Público.

Isto assim seria com a Senhora Procuradora-Geral da República em funções, a Senhora Dra. Joana Marques Vidal, durante mais de um ano, tal como, depois, com a sua sucessora, a Senhora Dra. Lucília Gago.

Em conformidade, nunca falou com o Diretor da Polícia Judiciária Militar.”

Ex-diretor da PJM diz que Marcelo aceitou interceder junto da PGR por causa de investigação a Tancos

Sobre como soube da operação encenada dois meses antes das detenções:

“Totalmente ocupado com a, e mais vasta, segunda vaga de fogos florestais, e, tendo feito, em Oliveira do Hospital, uma comunicação ao País sobre a matéria, na noite do dia 17 de outubro de 2017, nessa mesma noite o Presidente da República regressou à sua residência em Cascais.

Encontrava-se nessa residência, quando, no fim da manhã seguinte – no meio da atenção prioritária dada à tragédia dos fogos e à situação política emergente – soube, pela comunicação social, com base em informação veiculada pela Agência Lusa, do aparecimento do material de Tancos.

Não recebera, sobre esse aparecimento, qualquer outra comunicação anterior, nem do Governo, nem de chefias militares, nem de Belém, nomeadamente da Casa Militar, seu Chefe, Assessores ou Ajudantes de Campo.

No mesmo dia, ou no seguinte, falou-lhe a Senhora Procuradora-Geral da República indignada com a marginalização do Ministério Público, que considerava ilegal e muito grave.

Apenas tomaria conhecimento de que poderia ter existido eventual encenação no aparecimento do material, no dia 25 de julho de 2018, através da Senhora Procuradora-Geral da República.