O ex-banqueiro João Rendeiro viu o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) rejeitar o seu recurso sobre a pena de prisão efetiva de cinco anos e 8 meses aplicada pelo Tribunal da Relação de Lisboa em julho de 2020 pela prática dos crimes de falsidade informática e falsificação de contabilidade. Está em causa a alegada falsificação da contabilidade do BPP, que terá sido levada a cabo pela administração liderada por João Rendeiro para esconder os prejuízos financeiros da instituição.

Através de um acórdão de 20 de janeiro assinado pelo conselheiro Sénio Alves, a cúpula do poder judicial considerou que a pena única de cinco anos e 8 anos de prisão se mostra “justa, adequada e proporcional, sendo, por isso, de manter”, lê-se no acórdão a que o Observador teve acesso e que foi noticiado em primeira mão pela TVI.

No mesmo processo, também o ex-administrador Paulo Guichard foi condenado a 4 anos e 8 meses de prisão pela Relação de Lisboa. O STJ recusou apreciar o seu recurso por entender que a pena de Guichard não lhe permite recorrer para aquele tribunal superior.

João Rendeiro condenado a 5 anos e 8 meses de prisão efetiva

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Recorde-se que Rendeiro e Guichard tinham sido condenados a pena suspensa pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa em outubro de 2018. Após um recurso do Ministério Público (MP), a Relação de Lisboa inverteu a pena em julho de 2020, tendo decidido as penas de prisão efetiva que o Supremo confirmou agora.

João Rendeiro e Paulo Guichard podem ainda recorrer para o Tribunal Constitucional, o que suspenderá a execução da pena e evitará o respetivo trânsito em julgado.

O caso que pode levar à prisão de Rendeiro

João Rendeiro foi acusado em Junho de 2014 pelo DIAP de Lisboa de seis crimes de falsidade informática e um crime de falsificação de documento. Foram ainda acusados os ex-administradores Paulo Guichard, Salvador Fezas Vital e Fernando Lima e um quadro do BPP chamado Paulo Lopes.

Estando em causa a alegada falsificação da contabilidade do banco, a acusação deduzida pelos procuradores Inês Bonina e Hugo Neto tinham uma inovação: em vez do habitual crime de falsificação de documento, o MP optou por acusar João Rendeiro e os restantes ex-responsáveis do crime de falsidade informática, porque a informatização e a digitalização documental em vigor no dia-a-dia das sociedades comerciais faz com que apenas exista uma contabilidade em suporte informático — e não em papel.

Mas não só. O crime de falsidade informática tem também uma pena máxima de prisão até cinco anos — muito superior à pena máxima do crime de falsificação de documento, que não vai além dos três anos. A diferença entre as penas máximas faz também com que os prazos de prescrição do crime de falsidade sejam maiores.

Fundador do BPP, João Rendeiro, condenado a cinco anos de prisão por falsidade informática e falsificação

Estava em causa na acusação um esquema de ocultação das condições de venda de produtos bancários aos revisores de contas e ao Banco de Portugal. Os famosos produtos de retorno absoluto (capital e juros garantidos) tinha garantias que eram alegadamente escondidas de quem tinha que fiscalizar as contas. Assim, e sem acesso a essa documentação das garantias, os revisores das contas e o supervisor da banca entendiam que o banco ofereciam “robustez financeira”.

Só quando o banco entrou em situação de possível insolvência em 2008, o que obrigou à intervenção do Banco de Portugal, é que se descobriu que tais produtos de retorno absoluto tinham gerado um alegado prejuízo de 40 milhões de euros que foram alegadamente ocultados por via da utilização de várias sociedades sediadas em paraísos fiscais.

Os outros processos

João Rendeiro, Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital têm ainda outros dois processos em curso, a aguardar decisão — no caso Privado Financeira, que está à espera de decisão no Tribunal da Relação, os ex-administradores do BPP foram acusados de burla qualificada pelo Ministério Público, que entende estar na origem do prejuízo de 40 milhões de euros provocado a cerca de 100 investidores. Foram absolvidos pela primeira instância, mas o Ministério Público recorreu para a Relação de Lisboa.

Há ainda um caso de fraude fiscal e abuso de confiança, que está em fase de julgamento, e que, além daqueles três antigos responsáveis do BPP, envolve também o ex-administrador Fernando Lima. Neste caso, vão ser julgados pelos crimes de abuso de confiança, fraude fiscal e branqueamento de capitais por terem alegadamente desviado cerca de 30 milhões de euros do BPP em prémios e outro tipo de remunerações sem a aprovação dos acionistas do banco. O MP pediu nas alegações finais, que decorreram a 15 de janeiro último, uma pena de prisão de efetiva de sete anos prisão para João Rendeiro, penas suspensas para os restantes arguidos e a absolvição do advogado João Ramalho.

Caso BPP. Como ficaram os processos?

A decisão de deixar cair o BPP  foi tomada há uma década pelo Banco de Portugal — na altura era ainda Vítor Constâncio governador —, embora o processo de liquidação ainda decorra. O banco, criado por João Rendeiro em 1996 e que centrava o negócio na gestão de fortunas, durou apenas 14 anos. A crise financeira global acabou por expor as debilidades do BPP, bem como do BPN (que seria nacionalizado).

Com graves problemas de liquidez, o BPP deixou de ver a luz ao fundo do túnel quando lhe foi negado pelas autoridades o pedido de auxílio de 750 milhões de euros, em 2008. Até abril de 2010, decorreria a intervenção do Banco de Portugal na instituição.

Acrescentada informação às 15h38 sobre o pedido de pena de sete anos de prisão efetiva para João Rendeiro no processo relacionado com fraude fiscal, cujo julgamento ainda não terminou no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa