Não é só a vitória de Marcelo Rebelo de Sousa nas eleições presidenciais que é notícia em jornais de vários países. Aliado ao ênfase que é dada à reeleição do Presidente , surge um outro destaque: o facto de ter feito a sua campanha e ter sido eleito em plena pandemia e num país que tem estado no top mundial de infetados e mortos por milhão de habitantes.
Aliás, o jornal espanhol El País refere mesmo que o Presidente português foi reeleito “no pior dia da pandemia”, no que diz respeito ao número de vítimas mortais por Covid-19 e que “milhões de portugueses desafiaram os piores dados” da doença para votar: este domingo registaram-se mais 275 mortes.
Também o jornal espanhol El Mundo relata que os portugueses foram às urnas “com o país em colapso devido à Covid-19″ escolher o seu presidente. “Anónimos por detrás das suas máscaras, distanciados socialmente e cada eleitor com a sua caneta para evitar a propagação do vírus”, lê-se. Além da notícia que dá conta da vitória de Marcelo, o El Mundo dedica ainda um perfil sobre o Presidente reeleito, a quem apelidam de “líder popular low cost”. “Em Portugal, há um homem que faz de tudo”, começa o texto que depois recorda alguns momentos associados ao Presidente: as selfies, os discursos improvisados, os beijos (pré-pandemia) e ainda o episódio em que Marcelo ajudou duas jovens em dificuldades no mar, em agosto passado.
O perfil do El Mundo descreve Marcelo como um “homem prático”, com um “carisma inato” e uma espécie de Jean-Paul Belmondo português, numa alusão ao ator francês e estrela do cinema nos anos 60. “Esta maneira de ser prático e dialogar, traduziu-se numa enorme popularidade e respeito entre todas as forças políticas como chefe de Estado”, lê-se. O texto, que se refere a Marcelo como um líder “low cost”, diz que o Presidente contrastou com muitos outros pela “certa moderação nos gastos” durante a campanha.
O texto relata que, ao longo dos cinco anos do mandato, Marcelo “conviveu muito bem” com o primeiro-ministro, António Costa, apesar das “ideologias distintas”. “Segundo este perfil, o único confronto sério entre os dois foi quando Marcelo pressionou Costa para demitir a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, na sequência dos incêndios de 2017.
Também para o jornal El País o momento em que Marcelo Rebelo de Sousa — ou “simplesmente Marcelo” — salvou duas jovens em dificuldades no mar, no Algarve, é incontornável. Num perfil que dedicou ao chefe de Estado português, começa exatamente por lembrar esse episódio, entre outros: “Adora abraçar e beijar as pessoas, ao ponto de o chamarem de Presidente dos afetos, vai ao supermercado de calções de banho e apareceu de tronco nu para tomar a vacina” contra a gripe.
O site do jornal francês Le Monde chegou a ter em manchete a reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa, cujo “desejo” de não ter de ir à segunda volta com o país em confinamento total terá sido concedido. E publicou um perfil sobre o Presidente português, que o descreve como a “antítese de Trump”, logo no título, mas também como “brilhante, culto e próximo do povo”. No trabalho do Le Monde, é dito que o “senhor Presidente da República é simplesmente Marcelo” — “como se o seu círculo de amigos íntimos se estendesse aos seus 10 milhões de compatriotas”.
O jornal francês Le Figaro optou por publicar um vídeo com “cinco coisas para saber sobre Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente reeleito”. Nele, é descrito como um “estudante brilhante” e um chefe de Estado com uma “espontaneidade natural”. “É um dos raros homens da política que os portugueses tratam pelo seu primeiro nome”, indica ainda o vídeo.
Em países mais afastados, o destaque dado às eleições presidenciais portugueses vai diminuindo. Muitos jornais internacionais publicaram a notícia da agência Reuters que dá conta da vitória de Marcelo, numa “eleição marcada por rígidas regras de saúde e segurança, enquanto o país luta contra uma terceira onda de contágio do novo coronavírus”. Outros, como o britânico Guardian, fizeram o mesmo, mas com a versão da Agência France-Presse, que destaca igualmente o contexto em que decorreram as eleições, no dia em que “Portugal registou o seu pior número diário de mortes por coronavírus”, e a subida da extrema-direita.
Não foi o caso do New York Times que, para além de em texto próprio ter noticiado a reeleição do Presidente português, fez questão de realçar, logo em título, que a extrema-direita também ganhou. “Portugal destacou-se em tempos na Europa por não ter uma presença real da extrema-direita na política. Esses dias parecem ter acabado”, destaca o correspondente do jornal americano para Espanha e Portugal, a abrir o texto.
Ao longo do artigo, que também faz referência ao contexto pandémico, ao confinamento e à consequente abstenção, o New York Times concentra-se menos em Marcelo Rebelo de Sousa, desde o início um “forte favorito” à vitória, do que na figura do líder do Chega, que é descrito como “um advogado de formação que ganhou fama como comentador de futebol” com “exigências” decalcadas dos programas de “políticos de extrema-direita mais antigos como Marine Le Pen, de França”.
Sobre o Presidente da República, papel que o jornal descreve como “secundário” em Portugal mas “mais do que cerimonial”, o New York Times refere que um dos primeiros atos de Marcelo Rebelo de Sousa neste segundo mandato será decidir sobre se “aprova ou bloqueia” a nova lei da eutanásia, aprovada pelo Parlamento em 2020.
O italiano La Repubblica também faz referência a este ponto na agenda de Marcelo, que descreve como um líder “natural e espontâneo”, “sempre pronto a ser fotografado com os seus admiradores para uma “marselfie”, uma hashtag popular e um neologismo reconhecido mesmo por certos dicionários”.
Nos jornais brasileiros também é dada alguma atenção às eleições portuguesas. A Folha de São Paulo relata que “com níveis de popularidade superiores a 70% durante a maior parte do mandato, a reeleição de Rebelo de Sousa já era dada como certa“. O Estadão, como fez a maioria dos jornais, optou por destacar que o Presidente foi reeleito “no auge da pandemia”, mas também que a “taxa de abstenção foi a maior em democracia”. Já o G1, o portal de notícias da Rede Globo, a juntar a tudo isto escolheu ainda destacar a presença de um inelegível Eduardo Baptista no boletim de voto entregue este domingo aos portugueses. E muito provavelmente terá sido o único jornal de todo o mundo a chamar ao presidente reeleito de Portugal simplesmente “Rebelo”.