A TAP recebeu de alguns sindicatos propostas para cortar custos com a dimensão financeira prevista no plano de reestruturação, mas sem passar por despedimentos. No entanto, a empresa ainda não terá respondido. Essa foi a informação avançada pelos dirigentes de pelo menos um dos sindicatos que representam os trabalhadores do grupo numa audição no Parlamento, com várias estruturas sindicais do grupo a denunciar proposta “inaceitáveis” que reduzem rendimentos em mais do que 25% da meta indicada no plano de reestruturação da TAP para a redução da massa salarial na empresa.

Os dirigentes sindicais ouvidos esta quarta-feira de forma virtual pela comissão de economia e obras públicas, confirmaram que há propostas que podem por em causa o direito constitucional à greve, como a imposição de uma cláusula de estabilidade social para o período em que estiverem em vigor as condições acordadas. A imposição de condições que possam por em causa do direito constitucional à greve foi criticadas pelos deputados desde a esquerda à direita.

Entretanto, o Ministério das Infraestruturas veio esclarecer que é “falso que a Administração da TAP, S.A., tenha proposto aos sindicatos uma cláusula inconstitucional que proíbe o recurso do direito à greve”. A cláusula proposta de paz social coletiva faz parte do Código do Trabalho e “apenas propõe que, durante a vigência do Acordo, os sindicatos se comprometem a não recorrer a meios de luta laboral relativamente às matérias que sejam objeto de acordo, comprometendo-se a TAP, por sua vez, a tudo fazer para garantir a normalização da operação da companhia e a valorização das condições de trabalho dos trabalhadores”.

Ou seja, conclui, “os sindicatos poderiam sempre, em qualquer circunstância, exercer o direito de greve relativamente a outras matérias não previstas no Acordo ou, mesmo, em relação a estas matérias, caso entendessem que estas não estavam a ser cumpridas pela Administração da TAP“. “Em suma”, acrescenta, “o direito à greve, atenta a sua irrenunciabilidade constitucional, não foi – nem poderia ser – posto em causa.”

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As contra-propostas dos sindicatos surgiram num contexto em que a transportadora tenta fechar um acordo de emergência para o ano 2021 e que evite o recurso ao regime sucedâneo em que os acordos coletivos com os trabalhadores e as respetivas regalias ficam suspensos, na sequência da declaração da situação de empresa em dificuldade económica. Apesar das negociações em curso — com a empresa, mas também com o secretário de Estado adjunto e das Infraestruturas — , os sindicatos continuam a queixar-se de falta de informação financeira sobre o plano para fazerem contas e apresentarem propostas.

“É preciso negociar e saber qual é o plano de reestruturação do qual não conhecemos nada. Os números que fazem falta chegaram dia 18 . A empresa quer resolver em dez dias o que deveria ter feito em vários meses”, sublinhou Henrique Louro Martins, presidente do “Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC).

O presidente do SPAC (Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil), Alfredo Mendonça avisou em que o sindicato irá reagir contra a aplicação de um regime sucedâneo (não negociado) “em todas as instâncias nacionais e internacionais. Estamos a fazer tudo o que é possível para chegar a um acordo com a administração e a tutela para reverter o que estava previsto”. O SPAC também tem tentado atingir as metas financeiras defendidas pela empresa, mas através de “processos que irão minimizar o impacto social”.

Sindicato dos tripulantes diz que propôs medidas voluntárias que poupam 70 milhões

O SNPVAC fez uma proposta à TAP que com medidas de adesão voluntária — entre reformas antecipadas, rescisões por mútuo acordo e trabalho parcial (com redução salarial)  — que garante uma poupança de 70 milhões de euros na massa salarial destes profissionais, sem despedimentos, segundo referiu Henrique Louro Martins. “O sindicato consegue provar que conseguimos chegar ao valor que a TAP diz ser necessário através de propostas voluntárias e evitar despedimentos”. Sendo que os cortes salariais aceites de forma voluntária seriam temporários, quando a TAP pretende reduzir de forma estrutural os custos laborais, negociando novos acordos de empresa.

Louro Martins destaca que a classe já perdeu 1.500 postos de trabalho pela não renovação de contratos e que em cima da mesa está o despedimento de mais 750. E lembra que o próprio plano de reestruturação prevê a necessidade de recontratar tripulantes com a esperada retoma. A diferença entre os atuais e os que se prevê virem a ser necessários é de 80 profissionais.

Também o Sindicato dos Trabalhadores de Manutenção de Aeronaves (SITEMA) entregou um estudo ontem à administração da empresa o qual apontam soluções que podem ir de encontro ao plano — que não é conhecido — e que permitem a salvaguarda dos postos de trabalho. Segundo Paulo Manso, a TAP já tem um rácio de técnicos de manutenção por aeronave inferior à de outras companhias europeias, o que obrigava a recorrer a contratação externa.

Sindicato da manutenção propôs redução de horários com menos encargos salariais

Em comunicado, o SITEMA revela alguns dos pontos da proposta cuja condição é a participação dos trabalhadores na redefinição de um desenho operacional que contribua para o aumento da rentabilidade e para a redução de gastos desnecessários na operação da TAP, sobretudo com atrasos, cancelamentos e outsourcing.

“O SITEMA, e os trabalhadores que representa, estão disponíveis para implementar diversas medidas que incidem diretamente na redução dos encargos com trabalhadores, designadamente: limitação do horário de trabalho em um de dois modelo de part-time: períodos trimestrais, ou seja, três meses de trabalho para três meses de pausa, modelo que origina uma redução de encargos na ordem dos 50% ou redução de carga horária para 6horas/dia, modelo que origina uma redução de encargos na ordem dos 20%”.

“Chegamos a trabalhar com um técnico para um avião e isso não é seguro”, sinalizou ainda Paulo Manso no Parlamento, assinalando que esta classe perdeu 15% dos trabalhadores já depois da crise do Covid, por não renovação de contratos, mas também por saídas para a concorrência. Os cortes propostos pela administração implicam a perda de 43% dos rendimentos do trabalho e como exemplo do que foi posto em cima da mesa pela administração, cita a retirada da ambulância que está sempre a postos para responder em caso de acidente de trabalho na área da manutenção. “Não percebo o racional desta medida”.

Sindicato de pilotos denuncia cortes de 70% na Portugália

A segurança foi também um argumento usado pelo Sindicato dos Pilotos de Linha Aérea que representa sobretudo pilotos da Portugália. O presidente João Leão sinalizou aos deputados que foi feita uma proposta nas negociações para atingir a meta financeira pedida e que não afeta a segurança de voo, sem no entanto especificar. De acordo com o dirigente sindical, a proposta da administração para os profissionais que representa prevê um corte de 70% nos rendimentos que, do seu ponto de vista, colocaria os pilotos “numa curva de ineficiência” devido ao “desaparecimento das condições básicas de trabalho e de segurança de voo.

Apesar de ter sido anunciado que a PGA estaria fora dos cortes, até porque é apontada como a ponta de lança da retoma, o dirigente refere que a empresa não cumpriu a contratação de 15 pilotos, além de ter um quadro deficitário e que os seus pilotos já ganham menos de 20% que os congéneres do grupo.

Também André Teives da Plataforma de Sindicatos de Terra do Grupo TAP se queixou de que negociar “é tudo o que a TAP não quer”. “Enviaram-nos um intervalo entre  6 e 18 milhões de euros. Assim não se pode trabalhar nem chegar a um acordo.” O dirigente sublinhou ainda que o exemplo da Lufthansa, dizendo que foi possível evitar os despedimentos previstos pela via da negociação com os sindicatos.

Groundforce precisa de empréstimo de 35 milhões e denúncia pressões da TAP

Nas audições da tarde foram ouvidos o SITAVA (Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos), a comissão de trabalhadores da Grounforce e o Sindicato Nacional dos Engenheiros.

João Alves da comissão de trabalhadores dos serviços de handling, (Groundforce) indicou que a empresa precisa de um empréstimo urgente de 30 a 35 milhões de euros com aval do Estado. E denunciou pressões da administração da TAP, acionista da Groundforce, para a empresa implementar o mesmo plano de corte de custos e pessoal, em troca do pagamento antecipado dos serviços prestados.

Fernando Henriques do SITAVA voltou a referir a cláusula de confidencialidade que se fosse assinada o impediria de discutir as propostas até com os colegas da direção. E questiona a publicação do despacho que permite à empresa impor um regime sucedâneo um dia depois de a TAP ter feito chegar o primeiro documento com “propostas”. “Que raio de negociação é essa?”. E questionou ainda o foco dos cortes nos custos com pessoal que representam apenas 20% do total.

Também a presidente de comissão de trabalhadores da TAP, Cristina Carrilho, ouvida da parte da manhã indicou que a informação apresentada sobre o plano de reestruturação omite a dimensão financeira, em particular no que diz respeito aos fornecedores e aos obrigacionistas que emprestaram dinheiro à empresa em 2019 e pelo qual recebem juros.

Eduardo Coelho do Sindicato dos Engenheiros revelou que a administração da empresa apresentou um acordo de emergência no dia 18, que qualificou de “atentado” e que apresentou um dead line para aceitação de propostas até ao dia 31 de janeiro.