Só 6,2% dos crimes de poluição e danos contra a natureza chegaram a julgamento ao longo da última década — e terminaram todos em multas, apesar de o Código Penal prever penas duras para este tipo de crimes, que podem ir até aos 12 anos de prisão —, de acordo com números publicados esta segunda-feira pelo Jornal de Notícias.
Entre 2010 e 2019, foram denunciados em Portugal 82.166 crimes ambientais: a esmagadora maioria (80.595) diz respeito a incêndios florestais, seguindo-se 1.013 denúncias de danos contra a natureza e 558 denúncias por poluição. De todo este universo, apenas 1.503 processos (1,8%) foram julgados em tribunal.
O Jornal de Notícias apresenta também as contas sem o peso desproporcional dos incêndios florestais, focando-se exclusivamente nos crimes de danos contra a natureza e de poluição. Desse universo (1.571 denúncias no total), só 98 foram julgados, ou seja, 6,2% do total. Chegaram à fase de julgamento 16 crimes de poluição e 82 por danos contra a natureza. Nesse pequeno universo, estiveram envolvidos 167 arguidos, dos quais 108 foram condenados — 94 por danos contra a natureza e 14 por poluição.
Como recorda o mesmo jornal, os crimes de poluição podem ser punidos com uma pena de prisão até aos oito anos, nos casos em que a vida humana seja colocada em perigo, e os danos contra a natureza podem ser punidos com uma pena até aos cinco anos de prisão. Todavia, uma pena de prisão efetiva nunca foi aplicada em Portugal a esses crimes.
De acordo com o inspetor-geral da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (IGAMAOT), José Manuel Brito e Silva, isto deve-se à diferença entre a perceção pública dos crimes ambientais e o modo como estão codificados na lei.
“Em matéria ambiental, a definição de crime apresenta-se eivada de conceitos vagos e indeterminados, dificilmente compagináveis com a certeza e a segurança inerentes à aplicação do direito penal, o que dificulta em muito a tarefa do Ministério Público e dos tribunais“, disse Brito e Silva ao JN, assinalando que na quase totalidade dos casos acabam por ser aplicadas penas administrativas e multas, mesmo nas situações “merecedoras de sanção criminal”.