O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) indica menos criminalidade geral e violenta e grave em 2020, mas alerta para as atividades da extrema-direita, que aproveitou a pandemia de Covid-19 para aumentar bases de apoio através da Internet.
O RASI congrega os dados referentes à criminalidade participada à GNR, PSP, Polícia Judiciária, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Polícia Marítima, Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e Polícia Judiciária Militar e foi entregue pelo Governo na Assembleia da República esta quarta-feira.
Migrantes e vítimas de tráfico humano
Portuguesas que casam no Chipre por conveniência
As autoridades identificaram em 2020 um “número significativo” de crimes de casamentos por conveniência no Chipre entre cidadãs portuguesas e cidadãos de países terceiros.
“No que se refere a crimes de casamento por conveniência, destaque para o número significativo de cidadãs nacionais que se deslocam ao Chipre para celebrarem casamentos com nacionais de países terceiros. Ressalta a transnacionalidade e a dimensão dos meios logísticos e financeiros associados a esta atividade criminosa”, lê-se no relatório.
29 crianças vítimas de tráfico humano
“Na vertente de exploração sexual foram sinalizadas seis vítimas. Salienta-se terem sido sinalizadas duas vítimas, do género feminino, menores de idade, oriundas do continente africano, com fortes indícios de se encontrarem a ser exploradas pela pretensa progenitora num contexto de adoção ilegal”, adianta o RASI.
No total de vítimas sinalizadas há 29 menores, destacando-se o caso de cinco crianças de casos classificados como pendentes ou em investigação, com origem em países africanos e com uma média de idades de 12 anos. Para além das duas crianças já referidas a ser exploradas pela mãe para fins de adoção ilegal, as restantes estariam a ser traficadas para exploração laboral/servidão doméstica ou situações indefinidas.
Menos inquéritos instaurados por causa da pandemia
Foram identificadas 229 possíveis vítimas de tráfico humano, maioritariamente em Portugal (219), que, ainda assim, representam uma quebra de 18,5% face aos 281 casos em 2019.
No âmbito da criminalidade relacionada com o tráfico de pessoas foram instaurados 64 processos de inquérito. No âmbito dos inquéritos sob investigação foram constituídos 29 arguidos e detidas sete pessoas”, lê-se no relatório, que esclarece que os inquéritos investigados podem ter sido instaurados em anos anteriores a 2020.
O relatório assinala uma diminuição nos inquéritos instaurados em 2020, justificada pelas “condições atípicas criadas pela pandemia”.
Ainda sobre tráfico humano, o RASI refere que “foram investigados 86 inquéritos relacionados com o crime de tráfico de pessoas” e que “em 16 destes processos foram sinalizadas 59 vítimas”.
Tráfico humano sobretudo para exploração laboral
A maioria dos casos de tráfico humano sinalizados em Portugal diz respeito a exploração laboral (155), tendo os casos sido associados maioritariamente a trabalho agrícola, com prevalência nos distritos de Santarém e Portalegre.
“Na vertente de exploração laboral verificou-se uma diminuição do número de vítimas sinalizadas, face a 2019”, refere o relatório. “Não obstante, num único processo foram sinalizadas mais de duas dezenas de vítimas.”
Vítimas com origem no Paquistão, Brasil, Moldávia e Portugal
O RASI adianta ainda que 23 presumíveis vítimas foram acolhidas nos cinco Centros de Acolhimento e Proteção para Vítimas de Tráfico de Seres Humanos, 17 das quais homens e seis mulheres, com idades entre os 15 e os 66 anos, com destaque para nacionais do Paquistão, Brasil, Moldávia e Portugal.
“A Estrutura de Autonomização para vítimas de tráfico de seres humanos, criada em 2019, acolheu em 2020, quatro vítimas, todas do género feminino, adultas, maioritariamente nacionais de países terceiros, vítimas de tráfico para fins de exploração laboral (servidão doméstica), casamento forçado”, adianta o relatório.
São ainda referidas 25 autorizações de residência concedidas e 15 inscritos no programa de retorno voluntário e assistido de cidadãos de países terceiros e de países comunitários.
Fluxo migratório principal: do Brasil para o espaço Schengen
Em relação aos emigrantes ilegais, o relatório lembra ainda a chegada à costa do Algarve de 97 cidadãos em situação ilegal presumivelmente de nacionalidade marroquina.
“Não se registaram alterações nas rotas e fluxos migratórios e manteve-se, até março de 2020, o fluxo massivo de migrantes, sobretudo cidadãos brasileiros, a tentar entrar no espaço Schengen”, nota o relatório.
Abuso sexual de menores e plataformas online
Aumenta exploração sexual de menores online
A criminalidade relacionada com exploração sexual de menores online aumentou em 2020, enquanto as detenções por abuso sexual de crianças, violação e pornografia de menor registaram ligeiras descidas. Em 2020, foram detidas 113 pessoas por abuso sexual de criança, 44 por violação e 32 por pornografia de menor. E em 2019, tinham sido detidas 117 por abuso sexual de criança, 69 por violação e 38 por pornografia de menor.
A posse, distribuição e venda de pornografia de menores online é, segundo o relatório, a forma de criminalidade que revela maior grau de organização e envolve fluxos entre diversos países.
As situações de abuso online são praticadas, em geral, por indivíduos isolados, portugueses ou vivendo em Portugal”, precisa o relatório, dando conta que “não assume características de crime organizado internacional”.
Aumenta o uso de plataformas encriptadas
No que se refere aos ‘modi operandi’, o RASI frisa que “terá como prevalência de distribuição os canais de comunicação comuns como o YouTube, Facebook, Google Drive e Instagram”, apesar de ser ter registado um aumento do uso de plataformas mobile encriptadas (Whatsapp, Telegram) para troca de imagens.
O documento destaca que foi igualmente detetada a utilização “da rede peer-to-peer, para aquisição e distribuição de ficheiros ilegais”, estimando ainda que, no futuro, se verifique “um aumento no uso de plataformas mobile, de conversação e troca de ficheiros standard, por natureza encriptadas”.
As vítimas são meninas e os agressores homens com relação próxima
Em relação ao abuso sexual de crianças, o RASI refere que maior parte das vítimas são meninas e, em contrapartida, os arguidos são homens sobretudo com idades entre os 31 e os 50 anos.
As crianças têm entre 8 e 13 anos e prevalece o contexto da relação familiar enquanto espaço de relacionamento entre autor e vítima, mas as investigações ainda não permitiram consolidar dados sobre o relacionamento.
Também no caso das violações, as vítimas são mulheres, essencialmente entre os 21 e os 30 anos, e os arguidos são homens entre os 21 e os 40 anos. O RASI refere ainda que a maior parte das violações acontece entre conhecidos e familiares.
Criminalidade em ambiente escolar e delinquência juvenil
Delinquência juvenil e criminalidade grupal em queda
Houve 148 casos de vandalismo, 84 ofensas sexuais, 81 roubos, 77 registos por posse ou uso de arma e três ameaças de bomba.
A delinquência juvenil e a segurança escolar encontram-se profundamente relacionadas por via do bullying, da subtração, por meio de ameaça ou mesmo do recurso à violência física, de roubos e pequeno tráfico de drogas, junto às escolas e mesmo no seu interior”, lê-se no documento.
O RASI dá ainda conta que a criminalidade grupal, quando estão envolvidos três ou mais suspeitos, registou 4.638 participações em 2020, menos 11,1% do que em 2019. Também a delinquência juvenil (praticada por jovens entre os 12 e os 16 anos) continua a tendência de descida observada desde 2015, ao diminuir 33,4% em 2020, totalizando 1.044 registos.
Crimes em ambiente escolar caem durante a pandemia
Os ilícitos em ambiente escolar diminuíram 8,1% — de 5.250 em 2018-2019, para 4.823 em 2019-2020 —, num ano em que as escolas encerraram durante cerca de três meses devido à pandemia de Covid-19.
À semelhança do ano passado, a maioria das ocorrências foi de natureza criminal, tendo-se registado 2.647 em 2019-2020, menos 646 do que no ano letivo anterior, com 3.293.
Em termos percentuais, a quebra entre os dois anos letivos é de 19,6%, mas o relatório ressalva que se registaram “períodos escolares não presenciais”, devido à pandemia de Covid-19, que obrigou ao encerramento de todos os estabelecimentos de ensino, sendo que a maioria se manteve fechada durante cerca de três meses.
Aumentam ilícitos não criminais em ambiente escolar
Por outro lado, o RASI 2020 aponta um aumento de 11,2% nas ocorrências de natureza não criminal, com 2.176 no ano letivo passado, mais 219 do que no ano anterior, em que se contabilizaram 1.957 ocorrências.
Mas o tipo de ilícitos não se regista alterações significativas comparativamente aos anos anteriores: ofensas à integridade física (1.111); injúrias e ameaças (678) e furtos (428) voltam a representar a maioria das ocorrências registadas dentro e fora das escolas.
Em termos geográficos, foi em Lisboa que se concentraram a maioria das ocorrências, com 1.832 registos em 2019-2020, seguindo-se Setúbal com 813 ocorrências e Porto, onde se contabilizaram 661. Braga, Faro, Aveiro, Leiria, Açores e Coimbra são os distritos que se seguem com mais ocorrências registadas, entre 100 e 200 ilícitos.
Évora, Madeira, Santarém, Viana do Castelo, Viseu, Vila Real, Portalegre, Guarda, Castelo Branco, Bragança e Beja são os distritos com menor número de ocorrências, cada um com um total abaixo da centena de ocorrências.
Escola Segura: 26.910 ações de sensibilização
O relatório refere ainda que durante ao ano letivo 2019-2020 foram conduzidas 26.910 ações de sensibilização no âmbito da Escola Segura, tendo sido afetos em exclusivo ao programa 750 elementos da GNR e da PSP.
Essas ações, refere o documento, incluíram “ações de policiamento e de sensibilização junto de escolas, complementadas com a distribuição de panfletos alusivos a matérias como a prevenção rodoviária, o bullying, os maus tratos, os abusos sexuais e os direitos das crianças”.
Foram ainda desenvolvidas 108 demonstrações de meios e 322 visitas a instalações das forças de segurança, e foram abrangidos aproximadamente 8.054 estabelecimentos de ensino em todo o território nacional envolvendo 1.825.767 alunos.
Mais de metade dos delinquentes tem menos de 16 anos
Um total de 1.102 jovens (delinquentes) encontrava-se a 31 de dezembro passado em cumprimento de medidas tutelares educativas. A maioria dos jovens (55%) tinha menos de 16 anos e 6,7% eram jovens estrangeiros, com destaque para Brasil (36) e Cabo Verde (32).
Do total de delinquentes, 90 (8,2%) estavam sujeitos a internamento em centro educativo — menos 41,6% (64) que em 2019. Destes 90, 78 (86,7%) eram rapazes. Entre os 90, cinco (5,6%) eram de nacionalidade estrangeira, três dos quais cabo-verdianos.
Quase metade dos crimes são contra pessoas
O número total de medidas em execução em matéria tutelar educativa, durante 2020, foi de 2.826 — menos 18,1% que em 2019 — e corresponderam a 2.301 jovens. Destes, 1.881 (81,7%) eram rapazes.
Continuou a destacar-se a medida de suspensão do processo (763), ainda na fase extrajudicial, e o acompanhamento educativo (814). As medidas de internamento em centro educativo representaram 8,8% do total e voltaram a diminuir face a 2019″, acentua o RASI.
Segundo o relatório, aos 2.301 jovens sujeitos a medidas em execução, corresponderam 2.965 tipos de crime, sendo que na categoria do crime contra as pessoas (48,9%) destaca-se o de ofensas à integridade física voluntária simples e grave.
Na categoria do crime contra o património (38,2%) praticado por jovens, o destaque vai para o crime de roubo e de furto. Relativamente a crimes previstos em legislação avulsa (8%), sobressai o crime de tráfico de droga e condução sem habilitação legal.
Aos 90 jovens internados em centros educativos corresponderam o total de 269 tipologias de crime, predominando crimes contra as pessoas (54,6%), com 147, designadamente ofensa à integridade física voluntária simples e grave. Segue-se crimes contra o património (38,7%) com 104, destacando-se ainda os crimes de roubo e furto.
Internamento em centro educativo diminuiu nos últimos anos
O regime semiaberto continuou em 2020 a predominar (65,6%) e, por situação jurídica, destacou-se a medida de internamento em centro educativo (96,7%). Paralelamente, a média mensal de jovens internados foi de 122,75 e a taxa de ocupação, reportada a 31 de dezembro, foi de 54,9%.
O relatório realça que o peso das medidas de internamento em centro educativo diminuiu nos últimos anos, nomeadamente desde 2018, relativamente às medidas tutelares educativas, mantendo-se agora nos 9%.
“Continuaram a destacar-se as idades dos 16 e 17 anos (60%). Dos jovens internados, 73, tinham entre 16 e 20 anos (81,1%), o que demonstra ser esta a medida mais gravosa associada a grupos etários mais altos”, revela o relatório.
Cibercrime e as dificuldades impostas pela proteção de dados
Phishing, vishing, ransomware e criptomoedas
O cibercrime foi responsável por 24 detenções e pela constituição de 398 arguidos, dos quais sete ficaram em prisão preventiva. Os cibercrimes registaram um aumento de 26,8%, e entre os 318 arguidos constituídos por burla informática, sete ficaram em prisão preventiva, aos quais se somam mais 22 por falsidade e outros três por sabotagem.
Os relatório mostra que houve um aumento acentuado no phishing bancário (envio de email para induzir o utilizador a fornecer dados pessoais e/ou financeiros) com recurso ao envio de SMS com um link bit.ly e ao vishing (chamada telefónica para validar dados ou transferência bancária ilicitamente efetuada), tendo a Polícia Judiciária identificado o grupo organizado responsável pela maioria das situações.
O ransomware (software malicioso) continua a ser a forma de sabotagem informática mais comum, afetando em particular instituições do Estado e pequenas e médias empresas.
As autoridades detetaram também um aumento de casos de extorsão, sob ameaça de divulgação de informação proprietária e/ou privada, com a exigência de pagamentos avultados, por meio de criptomoedas.
Money Mules e branqueamento de capitais
O branqueamento de capitais, com recurso ao cibercrime, regista uma “inevitável tendência de crescimento”, com um aumento das ‘Money Mules’ naturais dos Camarões e da Nigéria, mas residentes no espaço Europeu, nomeadamente em França, que se deslocam a Portugal para constituírem sociedades comerciais, com o propósito de branquearem fundos.
Este branqueamento de capitais proveniente do cibercrime começou por estar associado às chamadas Money Mules, que forneciam contas bancárias próprias para o trânsito de fundos ilicitamente obtidos no próprio país, mas nos últimos anos assistiu-se ao aparecimento das chamadas “Contas Mula”.
Nas “Contas Mula”, sempre criadas por cidadãos comunitários, segundo as autoridades, são criadas empresas fictícias que abrem contas bancárias, retirando ilicitamente verbas de contas de vítimas (por infeções de malware) ou recebemos verbas provenientes de um engano causado por técnicas de engenharia social. Aqui, os fundos são transferidos para IBAN de Estados não cooperantes, ou levados por “mulas” para países sede das organizações criminosas.
Sublinham as autoridades no relatório que “é percetível a apropriação, pelo crime organizado, da utilização de técnicas, de táticas e de procedimentos criminosos típicos de atores estatais, visando formas de enriquecimento ilegítimo e de branqueamento de capitais com recurso a criptomoedas”.
Espionagem, fraude e limitações das bases de dados
Observa-se também “um aumento da espionagem através de ameaças persistentes, tecnologicamente avançadas, de origem estatal, direcionados a importantes centros de informação do Estado”.
A PJ alerta para o facto da legislação sobre a retenção de dados ser um obstáculo à recolha de prova e sugere regulamentação mais eficaz para a emissão de cartões pré-pagos.
A emissão controlada e a existência de uma base de dados comum sobre titulares envolvidos em fraude, bastaria para prevenir grande parte das fraudes, permitiria aumentar a eficácia do bloqueio de transações ilícitas, e diminuiria o dano”, propõe.
Na fraude em meios de pagamento, houve um “grande aumento” no uso fraudulento de cartões de crédito em plataformas online. A crescente utilização da internet para a aquisição de produtos ou serviços tem facilitado as fraudes, verificando-se um crescimento do uso das características do sistema MBWAY para que sejam cometidas fraudes em massa.
Três mortos, sete feridos graves e 846 feridos ligeiros nas forças de segurança
Dois militares da GNR e um agente da PSP morreram em serviço no ano passado, depois de em 2019 não se ter registado qualquer morte em serviço nas polícias.
“Em resultado da atividade operacional das forças e serviços de segurança registaram-se três mortos, sete feridos com necessidade de internamento, e 846 feridos ligeiros.”
Dos sete feridos com necessidade de internamento, dois eram da Guarda Nacional Republicana, três da Polícia de Segurança Pública e dois da Polícia Judiciária, registando-se em 2020 menos um ferido do que em 2019.
O RASI dá conta que sofreram ferimentos ligeiros em 2020 menos 226 polícias em relação a 2019. De acordo com o documento, 582 agentes da PSP, 226 militares da GNR, 35 inspetores da PJ e três da Polícia Marítima sofreram ferimentos ligeiros.
Quase 45 mil agentes nas cinco polícias portuguesas
O número de efetivos nas forças e serviços de segurança aumentou 0,8% no ano passado em relação a 2019, num total de 44.969, sendo a PJ a única polícia sem registo de novas entradas em 2020.
Os efetivos na PSP, GNR, Polícia Judiciária, SEF e Polícia Marítima eram de 44.969 a 31 de dezembro de 2020, registando um aumento de 0,8% em relação a 2019, quando totalizavam 44.798. As cinco polícias registaram 1.290 saídas e 1.455 entradas em 2020.
A Polícia Judiciária, com um efetivo de 1.292, não registou qualquer nova entrada de inspetores no ano passado, mas em contrapartida saíram 45.
A Guarda Nacional Republicana foi a força de segurança que mais elementos recebeu no ano passado, 770, e registou a saída de 709, contabilizando um total de 22.251 militares.
Com um efetivo de 19.825, a Polícia de Segurança Pública registou o ingresso de 595 novos elementos e a saída de 515. Já no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que tem 1.084 inspetores, entraram 89 elementos no ano passado e saíram 15. Na Polícia Marítima entrou um militar e saíram seis, num total de 6.517.
Diminuiu criminalidade violenta e grave
A criminalidade violenta e grave registou uma diminuição de 13,4% no ano passado em relação a 2019, passando das 14.398 participações para as 12.469. A criminalidade geral registou menos 36.817 queixas às forças e serviços de segurança no ano passado em relação a 2019, passando das 335.614 para 298.797, o que corresponde à diminuição de 11%.
Os roubos a farmácias, residências, edifícios comerciais ou industriais, bombas de gasolina e viaturas, a extorsão e os homicídios são os crimes violentos e graves que mais subiram em 2020.
Na criminalidade geral subiram o crime de desobediência, burla informática e nas comunicações, burla de fraude bancária e lenocínio e pornografia de menores.
Furto por carteirista, ofensas à integridade física, contrafação, falsificação de moeda e passagem de moeda falsa, roubo a ourivesarias, violação e rapto, sequestro e tomada de reféns estão entre os crimes que mais desceram.
Evasões de presos aumentaram 200%
O número de presos preventivos em 2020 situou-se em 2.273 (19,9%) e o de condenados em 9.139 (80,1%), num universo de 11.412 reclusos, incluindo 345 inimputáveis.
Nas prisões aumentaram em 17,2% o número de mortes, em 200% as evasões de presos, em 0,1% os presos preventivos e em 4,5% os inimputáveis, enquanto a população prisional diminuiu 10,8% no ano passado em relação a 2019.
Violência doméstica é o crime mais participado
Apesar de ter diminuído (5,5%), o crime de violência doméstica contra cônjuge ou análogo continua a ser a tipologia criminal mais participada em Portugal, representando 23.439 das queixas às polícias em 2020.
Menos tráfico, mas mais droga apreendida
As quantidades de cocaína e haxixe apreendidas aumentaram em 2020, mas globalmente o tráfico de droga diminuiu 34,2%, em comparação com 2019. No ano passado foram apreendidas 35,3 toneladas de haxixe, o que representa um aumento de 593% em relação a 2019 e 10,1 toneladas de cocaína (mais 4%).
A pandemia e o crescimento da polarização e desinformação
Crescimento dos movimentos radicais de extrema-direita
A pandemia constituiu uma oportunidade para que os movimentos radicais de extrema-direita aumentassem, através da internet, “as suas bases de apoio”, em particular junto dos jovens. Estes movimentos de extrema-direita recorreram “a um discurso apelativo da violência e do ódio, num momento em que a sociedade portuguesa é, também, confrontada com fenómenos de polarização ideológica”, como foi o caso dos grupos negacionistas da pandemia.
O confinamento social imposto pela crise pandémica aumentou o tempo de exposição da sociedade em geral, e dos jovens em particular, ao meio ‘online’ e abriu um leque de oportunidades para que os movimentos radicais de extrema-direita disseminassem conteúdos de propaganda e de desinformação digital, com vista a aumentar as suas bases sociais de apoio, a galvanizar os sentimentos antissistema e a reforçar a radicalização de base xenófoba”, lê-se no documento hoje entregue no parlamento.
Racismo
No capítulo dedicado às ameaças globais da segurança, o RASI revela que no ano passado surgiu um novo grupo de extrema direita, denominado “Resistência Nacional”, que levou a cabo uma iniciativa junto à sede da SOS Racismo e o caso das ameaças, via e-mail, a deputados, militantes antifascistas e ativistas antirracistas.
Esta atividade pode também ser alegadamente da responsabilidade de um outro grupo extremista, o “Nova Ordem de Avis”, de acordo com o documento.
Movimento anarquista
O documento refere igualmente que o movimento anarquista e autónomo, bem como alguns setores da extrema-esquerda radical, “não registaram alterações significativas” em 2020, “mantendo-se pouco ativos na prossecução dos seus objetivos revolucionários”.
Segundo o documento, estes movimentos afirmaram-se sobretudo no campo do ativismo em reação a acontecimentos políticos, sociais e ambientais, e da militância antifascista de rua, numa vertente ativista de protesto, por vezes com intenção de desenvolver ações de cariz violento.
No entanto, no movimento anarquista, continuaram a verificar-se contactos com os seus congéneres europeus, alguns dos quais com atividade terrorista de baixa intensidade”, indica o RASI, recordando a detenção em Portugal, no início de 2020, de um militante anarquista espanhol.
O RASI dá também conta que, no universo da ciberespionagem, se registaram novos ciberataques contra infraestruturas críticas nacionais, com a finalidade de aceder a informação classificada, com valor político e económico.
Desinformação digital e saúde mental
De acordo com o documento, também se fez sentir em Portugal “o fenómeno da desinformação digital, particularmente através de campanhas sobre a origem da Covid-19 e sobre outras questões relacionadas com a pandemia, procurando enfraquecer a confiança da sociedade portuguesa na resposta à crise”.
“Os efeitos do confinamento na saúde mental e no aumento de vulnerabilidades sociais e emocionais, aliados à maior exposição da sociedade portuguesa ao ambiente digital, contribuíram para agravar os fatores propícios a processos de radicalização violenta”, refere, sublinhando que em 2020 “não houve indícios que justificassem a alteração do nível de ameaça terrorista em Portugal”.
O RASI indica que os efeitos da pandemia também se fizeram sentir na criminalidade organizada transnacional ao registar-se, na primeira metade de 2020, um abrandamento das atividades clássicas, mas, no segundo semestre, houve um “retomar de algumas atividades criminosas”, que se adaptaram “às novas circunstâncias e restrições”.
Criminalidade económico-financeira
No ano de 2020 foram deduzidas 43 acusações por corrupção, 432 arquivamentos e iniciadas 688 investigações pelo mesmo crime — tendo os casos findos (por acusação, arquivamento, suspensão provisória e outros motivos) atingido os 1.539. O documento revela ainda relativamente à corrupção, 259 suspensões provisórias do processo e 805 casos findos por “outros motivos”.
Quanto ao branqueamento de capitais, foram iniciados 408 processos, tendo-se registado 21 acusações, 92 arquivamentos e findado 173 casos por “outros motivos”. No total, o Ministério Público deu como findos 286 processos por branqueamento.
Em relação ao crime de prevaricação de titulares de cargos políticos, houve o registo de 140 casos iniciados, cinco acusações, 68 arquivamentos, duas suspensões provisórias do processo e 105 casos findos por “outros motivos”, num total de 180 casos dados como concluídos em 2020.
Relativamente ao tráfico de influência, houve 27 casos iniciados em 2020, nenhuma acusação, 21 arquivamentos e 25 casos findos por “outros motivos”, tendo sido considerados finalizados nesse ano 46 processos dessa tipologia criminal.
No tocante ao crime de participação económica em negócio, houve 157 casos iniciados, seis acusações, 132 arquivamentos, uma suspensão provisória do processo e 245 processos findos por “outros motivos”, num total de 386 processos concluídos.
Quanto ao crime de administração danosa em setor público, registaram-se 41 processos iniciados, tendo em 2020 havido uma acusação, 18 arquivamentos e 32 casos findos por outros motivos, num total de 51 casos concluídos.
Entre a panóplia de crimes de natureza económico-financeira, destaca-se o número de processos iniciados por burla (exceto tributárias) que atingiu os 50.017 em 2020, tendo havido nesse mesmo ano 1.499 acusações, 31.465 arquivamentos, 295 suspensões provisórias do processo e 8.997 casos findos por “outros motivos”, num cômputo geral de 42.256 processos dados como concluídos.
Em matéria de fraude fiscal, houve 742 casos iniciados, 194 acusações, 407 arquivamentos, 60 suspensões provisórias do processo e 283 casos findos por “outros motivos”, tendo sido dados como findos ou concluídos 944 processos desta natureza.
Em relação ao crime de peculato (apropriação indevida de bens ou dinheiro público), o maior número de casos iniciados foi na Comarca de Lisboa (94), seguida do Porto (24) e Leiria (19), mas em número de acusações surge a Comarca do Porto à frente com oito, seguida de Faro com seis e de Lisboa com cinco. A Comarca de Lisboa registou 18 arquivamentos por peculato e as Comarcas de Coimbra e Porto (17, ambas).
Proteção da natureza, animais e caça
Crimes relacionados com caça e apreensões de armas aumentaram
Os crimes relacionados com a caça quase duplicaram no ano passado em relação a 2019 e as apreensões de armas quase triplicaram. Nas operações Artémis, de fiscalização “ao exercício do ato venatório”, foram empenhados 8.735 elementos, que registaram 84 crimes (45 em 2019) e fizeram 71 detenções (29 em 2019). Foram apreendidas 98 armas, contra as 38 apreendidas no ano anterior, e levantados 271 autos de contra-ordenação, contra os 145 de 2019.
235 mil ações de fiscalização na área da proteção da natureza
O RASI indica que foram feitas no ano passado 235.008 ações de fiscalização na área da proteção da natureza e do ambiente, um aumento em relação ao ano anterior, quando tinham sido feitas 213.708 ações.
Daquelas ações resultaram a deteção de 1.409 crimes (1.487 no ano anterior) e o levantamento de 21.830 autos de contraordenação, bastante menos do que os 25.171 do ano anterior. Foram detidas 137 pessoas, menos duas do que em 2019. O valor das coimas foi também mais baixo do que no ano anterior, 51,7 milhões de euros contra 83,6 milhões em 2019.
A Linha “SOS Ambiente e Território”, destinada a participar potenciais infrações ambientais e de ordenamento do território e solicitar orientações sobre procedimentos, recebeu 12.185 denúncias e forneceu 5.890 respostas. Os números indicam um aumento de denúncias, mas um menor número de autos (2.286 contra 2.846 em 2019). O número de crimes registados subiu, no entanto, passando de 88 em 2019 para 110 em 2020.
Menos ações de fiscalização
No ano passado houve menos operações para fiscalizar a circulação de plantas e madeiras para controlo da dispersão do nemátodo da madeira do pinheiro (19.469 viaturas controladas contra 28.204 em 2019), e também menos operações no âmbito da proteção da floresta.
Assim, em 2020 houve menos ações de sensibilização e de patrulhamento, menos elementos empenhados, menos quilómetros percorridos e também menos crimes registados e menos detenções. Foram registados 4.892 crimes (5.777 no ano anterior) e feitas 51 detenções (57 em 2019).
Nas operações para detetar transportes irregulares de resíduos houve também menos veículos fiscalizados (2.170 contra 3.105 no ano anterior) mas foram detetadas mais infrações (46, contra 34 em 2019) e passadas mais multas (48 contra 39 em 2019).
No ano que passou também foram feitas menos ações de fiscalização a proprietários de cães de caça potencialmente perigosos e foram participados 1.217 crimes por maus-tratos a animais de companhia e 674 crimes por abandono de animais de companhia. A linha de defesa do animal, destinada a participar situações de maus-tratos a animais, recebeu 2.362 denuncias.