Várias organizações da sociedade civil internacionais apelaram esta segunda-feira para uma “ação rápida e eficaz” da presidência portuguesa do Conselho da UE para combater a “deterioração do Estado de Direito e dos direitos fundamentais” na Polónia.
Numa carta aberta endereçada aos ministros dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, e do Trabalho, Ana Mendes Godinho, e à secretária de Estado para os Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, bem como ao embaixador de Portugal junto da União Europeia (UE), Nuno Brito, mais de uma centena de organizações apela à presidência portuguesa para que “realize urgentemente uma audição com o governo polaco” no sentido de analisar a situação do Estado de Direito e dos direitos fundamentais naquele país.
Estamos seriamente preocupados com o facto de a falta de ação por parte do Conselho de ter dado poderes ao governo polaco para continuar a prosseguir políticas que minam gravemente o Estado de Direito e afetam os direitos fundamentais das pessoas na Polónia”, sublinham as organizações.
Em causa está a independência judicial, que as organizações assumem estar a “deteriorar-se“, apontando que “os juízes na Polónia têm enfrentado processos disciplinares arbitrários por criticarem reformas judiciais problemáticas e submeterem casos para decisões preliminares ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE)”.
Já no passado dia 31 de março, a Comissão Europeia avançou para o TJUE contra a Polónia por considerar que “a lei polaca sobre o poder judicial mina a independência dos juízes polacos e é incompatível com o direito da UE“.
Na mesma carta, as organizações alertam para as “violações dos direitos da mulher“, lembrando que, em janeiro passado, já “durante a presidência portuguesa” do Conselho da UE, “o governo polaco publicou a decisão do Tribunal Constitucional politicamente comprometido de outubro de 2020, invalidando a constitucionalidade do acesso ao aborto por ‘defeito fetal grave e irreversível ou doença incurável que ameace a vida do feto'”.
A implementação desta lei “corre o risco de prejudicar gravemente os direitos das mulheres e o aceso à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos” e “conduz a violações de direitos protegidos pelo direito internacional e europeu dos direitos humanos“, como “o direito à liberdade da tortura ou tratamento ou punição cruel”, indicam as organizações.
As organizações manifestam-se ainda “preocupadas” com a possibilidade de “o mesmo tribunal politicamente comprometido que invalidou a constitucionalidade do acesso ao aborto” decidir também “a retirada da Polónia da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica (Convenção de Istambul)”, decisão que já foi tomada pela Turquia no mês passado.
Sobre esta questão, o governo polaco garantiu, numa mensagem enviada durante a Conferência da presidência portuguesa sobre a Convenção de Istambul, no passado dia 06, que “não tem estado a desenvolver ações” que visem a sua retirada deste tratado pan-europeu sobre violência contra mulheres.
Face a estas declarações, as organizações pedem ao governo polaco que se comprometa a “não se retirar da Convenção e a implementá-la plenamente“.
“Igualmente preocupante é o facto de o governo polaco continuar a visar organizações e ativistas dos direitos das mulheres, cujo direito ao protesto pacífico sem medo de violência ou represálias tem sido violado através de campanhas difamatórias, negação sistemática de financiamento e brutalidade policial apoiada pelo governo”, lê-se na carta.
Face a “estes desenvolvimentos alarmantes”, as organizações exigem “uma resposta urgente e séria por parte do Conselho” da UE, manifestando-se “profundamente desapontadas pelo facto de o Conselho não ter realizado qualquer audiência sobre o Estado de Direito na UE desde setembro de 2018”, o que pode “conduzir a uma maior erosão dos direitos fundamentais”, alertaram.
Entre as dezenas de organizações internacionais que assinaram esta carta, contam-se 25 portuguesas, entre outras, a Associação para o Planeamento da Família, a Liga Portuguesa dos Direitos Humanos, a Associação ILGA Portugal e a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres.