O Ministério Público pediu esta quarta-feira que Armando Vara seja condenado a uma pena efetiva entre os dois e os três anos de cadeia pelos dois milhões de euros que colocou em contas na Suíça e que trouxe depois para Portugal. O procurador lembrou que a “impunidade” destes casos tem resultado do “sistema de justiça” e sublinhou que o ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos, e ex-governante, não quis prestar declarações durante o julgamento e nem sequer mostrou arrependimento em tribunal.

“Só as penas de prisão efetivas e a apreensão de bens são dissuasoras da prática criminosa”, disse o procurador Vítor Pinto já em alegações finais, pedindo por isso um pena mais próxima dos três anos, sendo que a pena máxima do crime de branqueamento é de cinco.

Naquela que foi a terceira e última sessão do julgamento, e já depois de ouvidas as testemunhas, o Ministério Público tentou que fossem reproduzidas as declarações que Armando Vara prestou ao juiz de instrução criminal, em 2019, uma vez que recusou prestar declarações neste julgamento relâmpago. O juiz recusou o pedido, lembrando que não é por não serem reproduzidas as declarações de Vara no âmbito da Operação Marquês, da qual nasceu este processo, que elas não são consideradas. A decisão antecipou assim as alegações do caso, que estavam previstas para esta tarde.

Operação Marquês. Como Armando Vara mandou 1,6 milhões de euros em dinheiro vivo para a Suíça

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Já a defesa de Vara lembrou que a pronúncia que senta Armando Vara no banco dos reús nem sequer contém os valores que o seu cliente ficou alegadamente a dever ao Estado. O advogado Tiago Rodrigues Bastos disse, sob atenção de Armando Vara, sentado no centro da sala, que se parte do “pressuposto que há dinheiro colocado na Suíça”, mas não se diz qual o imposto devido, nem o montante — o que constava dos factos da acusação da Operação Marquês, mas que não foi transposto para a pronúncia. “Creio que são indispensáveis para delimitar o objeto do crime que nos ocupamos”, afirmou.

No arranque da sessão de julgamento, o juiz Rui Coelho tinha esclarecido que Vara está acusado de um crime de branqueamento cujo precedente é um crime de fraude fiscal.

Por outro lado, disse ainda a defesa, Vara é acusado de branqueamento de pouco mais de 500 mil euros de uma quantia total de mais de dois milhões que depositou entre várias contas na Suíça, não se percebendo assim se ele estava “ciente ou convencido” que “trazia alguma coisa de ilícito”. Quase que como se só uma parte do dinheiro se tornasse ilícita porque foi trazida para Portugal. Então porque precisou Vara fez fazer circular aquele dinheiro por várias contas offshore criadas em vários paraísos fiscais? O advogado afirma que essa decisão nem sequer era do seu cliente, mas da consultora com quem trabalhava.

Para o advogado, “não estão reunidos os pressupostos para que este tribunal possa condenar o arguido pelo branqueamento”. Tiago Rodrigues Bastos diz mesmo não entender “o que é que este homem [Armando Vara] terá feito que despertou tanto ódio do Ministério Público”. No final, pediu que a ser condenado, que seja a uma pena suspensa.

A decisão será conhecida a 13 de julho.

Como Vara salvou a filha confessando entregas em numerário de quase 1 milhão de euros a uma rede de branqueamento de capitais

Vara sempre pensou no “bem público”

O ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos e ex-governante, preso por tráfico de influência no processo Face Oculta, e que agora enfrenta este julgamento por branqueamento de capitais, sempre pensou no “bem público”. Assim o garantiu em tribunal António Nunes, o antigo inspetor geral da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).

António Nunes foi o segundo de três testemunhas ouvidas esta manhã. A quarta testemunha arrolada, a ex-presidente da câmara de Sintra, Edite Estrela, não compareceu e acabou dispensada. O ex-responsável pela ASAE disse conhecer Vara desde o final da década de 80, era Vara secretário de estado da Administração Interna e ele subinspetor-geral da Proteção Civil. Antes tinham-se cruzado quando Vara estava na Câmara da Amadora. Desde então, “temos cultivado a nossa amizade”, disse.

“Fui 40 anos funcionário publico, e 19 diretor geral. Vara foi dos secretários estados e ministros com quem trabalhei que sempre tiveram uma verticalidade muito grande no interesse público. Discussões eram sempre no sentido da coisa pública estar defendida”, disse. “Dizia muitas vezes que o dinheiro não era nosso, era dos contribuintes”, acrescentou.

Carlos Santos Ferreira, foi presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos entre agosto de 2005 e início de 2008 e Vara integrou o seu conselho de administração. Convidou-o depois para integrar a administração do Banco Comercial Português. “O Dr. Armando Vara era muito bom administrador comercial, motivador das equipas”, disse.

Santos Ferreira explicou também que o conheceu ainda da década de 70 na atividade política no distrito de Bragança, de onde era oriundo. Foi também aí que o ex-deputado Mota Andrade o conheceu. “Quando saiu do governo teve dos maiores jantares em Bragança com todos os partidos, foi sempre um homem bem visto e um lutador”, disse.

Será o julgamento de Armando Vara supersónico?