Esperado por muitos, ansiado por alguns, a mudança do PAN — para as mãos de Inês Sousa Real — não foi suficiente para que o partido deixasse de ver filiados, com algum peso, a apresentar cartas de desfiliação. Depois de várias saídas mais mediáticas (onde se contam uma deputada e o único eurodeputado), menos de um mês depois de ter chegado à liderança do partido Sousa Real já enfrentou mais baixas de pessoas com alguma relevância na máquina. Ainda assim, o PAN desvaloriza a saída de antigo membro da direção e acrescenta que desde o início do ano o balanço de desfiliações e novas entradas no partido é positivo.
Ainda que faltem poucos meses para o final do mandato autárquico, Conceição Sobrinho anunciou publicamente que passou a desempenhar o mandato na Assembleia de Freguesia da Penha de França na qualidade de deputada independente. Desfiliou-se do PAN, mas não é a única baixa para o partido este mês.
Hélder Capelo, que fez parte da mesa da anterior Comissão Política Nacional do PAN, também anunciou publicamente a saída do partido. Através de uma publicação no Facebook, Hélder Capelo anunciou a desfiliação frisando que a mesma “tem efeito à data de 13 de junho”.
Além da mesa da Comissão Política Nacional do partido, Hélder Capelo integrou também o comissariado do PAN do Baixo Mondego e ao Observador esclarece que sai do partido depois de lhe ter sido levantado um “processo disciplinar por bullying no final de 2019, início de 2020″.
Questionado sobre as consequências desse processo disciplinar, Hélder Capelo diz que “até ao momento não houve qualquer desfecho do processo disciplinar”. “Há tanta turbulência interna que não há tempo para analisar um processo disciplinar, diziam eles tal era a sua gravidade”, explica ao Observador afirmando que o processo que lhe foi movido está relacionado com o processo de substituição da deputada do PAN na Assembleia Municipal da Amadora que, considera ser “altamente difamatório”. O ex-dirigente do partido alega que tem “todas as provas” de que se tratam de “mentiras e calúnias”.
Mas Hélder Capelo vai mais atrás no tempo e recorda os tempos do PAN de Paulo Borges — líder do PAN de 2011 a 2014, quando também se desfiliou — para explicar que “a história de processos disciplinares no PAN é muito antiga”.
Recorde-se que no último Congresso o partido aprovou alterações aos estatutos que facilitam a suspensão de filiados do PAN, com efeitos imediatos (que precisa de posterior ratificação da direção do partido) através da Comissão Política Nacional.
Hélder Capelo explica ao Observador que deixou a direção do partido na altura em que lhe foi intentado o processo disciplinar e que está desde então à espera da conclusão deste, não descartando a hipótese de seguir com o processo para a Justiça.
Sobre a “turbulência interna”, Hélder Capelo diz que se refere a todos os episódios que culminaram com as saídas do eurodeputado Francisco Guerreiro e Cristina Rodrigues, já em 2020 que acompanhou já fora da condição de membro da Comissão Política Nacional.
O antigo dirigente do partido deixou também muitas críticas ao último Congresso do PAN, que diz ter sido “completamente amputado do debate” por se ter apresentado apenas uma lista à direção do partido.
“O número de pessoas que é necessário para constituir uma lista é enorme e não existem filiados suficientes para constituir várias listas face ao número de efetivos e suplentes que cada lista tem que ter”, diz ao Observador, quando questionado sobre os motivos pelos quais não procurou avançar ou integrar uma lista.
Hélder Capelo acrescenta ainda que o PAN é “uma máquina pequena que só alimenta meia dúzia de pessoas”: “Só serve para manter os mesmos. Quando saem uns são substituídos pelos outros precisamente com a mesma cor política”, diz acrescentando que sente uma grande “mágoa” por sair de “um partido a que deu tantas horas”.
“Por uma discordância de opinião sou expulso à falsa fé, com um processo disciplinar”, aponta o antigo dirigente.
Questionado pelo Observador sobre a desfiliação de Hélder Capelo e de Conceição Sobrinho, o PAN referiu-se apenas a Hélder Capelo, afirmando que o mesmo foi “substituído” na Comissão Política Nacional “ainda antes do VIII Congresso do PAN”, no início de junho, por ter perdido “o mandato por faltas”.
Já Conceição Sobrinho confirmou ao Observador que o facto de faltar pouco tempo para terminar o mandato foi motivo de grande reflexão, mas decidiu avançar para a desfiliação e manter o mandato na condição de independente nos poucos meses que faltam até às eleições autárquicas deste ano.
Na publicação afirma que deixa o PAN por não se “rever no ideal que acreditou quando se filiou” e garante que irá continuar “na defesa das lutas que acredita” e, afirma, “sobretudo na defesa das pessoas,pois são as pessoas que movem as ações, as causas e as lutas do dia a dia”. “Sem as pessoas não existiriam partidos ou movimentos políticos e sociais”, frisa a ex-PAN.
PAN garante que tem “saldo positivo de filiações” desde início do ano
Depois de conhecidas várias desfiliações ao longo do último ano, o Observador questionou o PAN sobre o número de filiações e desfiliações. O partido fez as contas e, sem indicar com o mínimo detalhe quais os movimentos de saída e entrada de filiados, afirma que “à data de hoje [quinta-feira, 24 de junho] desde 1 de janeiro de 2021, entre as pessoas que se filiaram e as que se desfiliaram o PAN tem um saldo positivo de 66 filiações”.
O PAN não parece sentir as ondas de choque das saídas mais mediáticas que vão acontecendo. Recorde-se que há cerca de um ano, em junho, o eurodeputado Francisco Guerreiro anunciou a sua desvinculação do partido tendo optado por se manter na condição de deputado independente. Menos de uma semana depois eram os eleitos do PAN na Madeira a bater com a porta e a deixar o partido sem representação na região autónoma.
Perdeu o único eurodeputado e vários deputados municipais. O que está a acontecer no PAN?
Para a queda seguinte não foi preciso esperar tanto tempo e, logo no dia seguinte ao rombo na Madeira a então deputada do PAN Cristina Rodrigues desfilia-se do partido e passa à condição de não inscrita alegando que o partido a tinha “silenciado” e “afastado”.
Entre estas saídas mais mediáticas o PAN foi perdendo aqui e ali dirigentes de nível nacional e eleitos nas várias autarquias, conquistados em 2017. A deputada municipal em Cascais, e Sandra Marques, mulher de Francisco Guerreiro, também se desfiliou do PAN e, entretanto, já integra o Volt, na distrital de Lisboa. Hugo Rombeiro nos Açores ou Fátima Dâmaso na Moita, são outros exemplos.