A publicação deste direito de resposta e retificação de Heitor Antunes relativo ao artigo “Padre de Vila Real investigado por abuso sexual demite-se do sacerdócio. Papa Francisco já autorizou saída da Igreja” é efetuada por efeito de deliberação do Conselho Regulador da ERC (art.º 27, n.º 4, da lei de Imprensa).

“Tem vindo o Observador a publicar desde pelo menos Fevereiro de 2019 diversas notícias sobre a minha vida privada e familiar, a última das quais em 26 de Fevereiro de 2021 que refere todas as anteriores e que têm sido replicadas em outros órgãos de comunicação social, nomeadamente no jornal A Voz de Trás-os-Montes, Notícias de Vila Real e a Rádio Universidade FM.

Num primeiro impulso o signatário entendeu não dar qualquer resposta ao conjunto de inverdades que constam das referidas publicações dado que as mesmas são fruto de fontes anónimas, umas mais anónimas do que outras, é certo, e de mentes inquinadas e mirradas pela inveja, pelo desejo de vingança e pelo “cheiro a sangue” que sempre proporciona aos “Velhos do Restelo” o anticlericalismo.

Denúncias e fontes “anónimas” e “próximas” valem o que valem, sendo certo que os valores maiores são o pouco ou nenhum carácter e a imensa cobardia do(s) seu(s) autor(es).

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As publicações revelam, por outro lado, falta de rigor e de isenção, inverdades repetidas, imprecisões propositadas para confundir, denegrir, rebaixar e humilhar e um sem número de especulações, o que tudo reduz a cinzas, lamentavelmente, a garantia, o conteúdo e os limites da liberdade de imprensa…

Por isso e também em nome da tolerância que se deve aos fracos (leia-se “fontes anónimas” e “fontes próximas”), entendi rectificar, mais do que responder, prestando os esclarecimentos abaixo especificados. Desse modo também vou ao encontro de princípios que enformam o Estatuto Editorial do Observador, tais como “contribuir para uma opinião pública informada”, “da dignidade humana”, “procura da verdade e subordinação aos factos” partindo das seguintes premissas e facto que sempre assumi e que transmiti oportunamente ao Observador e que considerei suficientes:

“Refuto as acusações sobre abuso sexual conforme ficou comprovado pelo relatório do tribunal. Aliás abomino qualquer tipo de abuso sobre outrem. Em relação a filhos, eu tive uma filha com uma mulher de 24 anos que assumi.”

Apesar de ter transmitido esta minha posição ao Observador, tão curta, quanto clara e concisa, ninguém cuidou de se informar e ninguém quis saber “quem perseguiu quem”, “quem vitimizou quem”, “quem pressionou quem” e, pior, ninguém se importou, nem protegeu a minha filha, filha que assumi mesmo antes de nascer (apoiando a mãe sob todos os aspectos proporcionando-lhe condições de conforto exigidas pela gravidez e não só.) e que registei na Conservatória do Registo Civil como minha, sem condição, sem reservas e no prazo legal…

Preferiu-se imputar factos e comportamentos que jamais foram provados, ou até mesmo considerados como indícios de crime ou crimes. Preferiu-se a calúnia e os títulos bombásticos e falsos. Uma catequista que nunca o foi. Uma menor vítima de abuso sexual que nunca existiu. Uma denúncia anónima que também não o foi. Uma acusação que jamais existiu. Confunde-se cumprimento do dever pastoral com abuso sexual. Confunde-se deliberadamente “investigação” com acusação, para considerar provados factos inventados e denunciados de modo gratuito. Uma “história iniciada em 2002” que, afinal “Mariana” não confirma. Fala-se em “mistérios” e “probabilidades” próprios de quem se deita a adivinhar. Fala-se em prescrição sem saber do que se fala, na tentativa de procurar justificar o fim de uma telenovela de gosto mais do que duvidoso…

Os autores da publicação dizem que consultaram o processo. Não creio. Se o tivessem feito nada destas inverdades e ataques de carácter, difamações e injúrias à minha pessoa teriam sucedido. Se o tivessem feito, tinham forçosamente que escrever o seguinte:

No despacho de arquivamento do inquérito judicial o Digno Magistrado do Ministério Público escreveu: “Os presentes autos tiveram o seu início com denúncia que poderia indiciar a eventual prática por parte de Heitor Eduardo da Silva Antunes de crime de Abuso Sexual de Criança. A investigação esteve a cargo da Polícia Judiciária tendo sido possível apurar que o denunciado é pai de uma menor de idade cuja mãe é maior de idade. A própria denunciante acaba por formalmente não assumir a denúncia inicialmente alvitrada de que Heitor Eduardo da Silva Antunes teria cometido crimes de Abuso Sexual de Criança.

Após várias considerações doutrinais e jurisprudenciais o referido Magistrado escreveu ainda: “Apenas com a sua afirmação pela denunciante e sem a sua confirmação pelas testemunhas apresentadas por aquela ou a sua admissão pelo arguido, e dada a inexistência ou o não oferecimento ou indicação de outros elementos probatórios, impossível se torna considerar indiciada com suficiência a prática do crime participado, nos termos pressupostos no n° 2 do artigo 283° do Código de Processo Penal para a formulação de um despacho acusatório, isto é dizer, em termos de persuadir da culpabilidade do arguido e da probabilidade de uma sua condenação em Juízo. Atento o exposto, não se vendo — com os elementos disponíveis a respeito determino o arquivamento dos autos, nos termos do disposto no n° I do artigo 277° do Código de Processo Penal.”

Por conseguinte, Senhor Director, facilmente se conclui que existe denunciante identificada, que foi ouvida no inquérito, bem como as testemunhas que apresentou e que o inquérito foi arquivado, mas não por prescrição. E perante o arquivamento, ninguém requereu a abertura de instrução, ninguém solicitou a intervenção do superior hierárquico do Ministério Público que proferiu o despacho de arquivamento e ninguém levou ao inquérito novos factos que invalidassem os fundamentos do arquivamento.

Convinha, parece-me, que os autores das notícias deveriam ler, muito bem lido e repetidas vezes, o que dispõe o n° 1 do artigo 277° do Código de Processo Penal…

De nada serve apregoar, muito contentes, que vivemos num Estado de Direito Democrático, se logo a seguir fazemos tábua rasa dos seus princípios fundamentais, nomeadamente os da legalidade, igualdade, proibição de excesso e segurança jurídica.

Apesar de tudo, confiando, penso que as rectificações cuja publicação muito lhe agradeço, são suficientes e claras. E estão documentadas, naturalmente…

Houve uma investigação criminal que foi arquivada; houve uma investigação canónica que também foi arquivada. Em nenhuma fui condenado.

E também não fui condenado, censurado sequer, pelas comunidades a quem tive o privilégio de servir como pároco (Nogueira, Alvações do Corgo, Vilarinho dos Freires, Andrães e Hamilton/Canadá), que sempre me trataram e tratam, com amizade, respeito e carinho e são testemunhas do meu trabalho, dedicação, respeito e comportamento no relacionamento com crianças, jovens, idosos e outras pessoas fragilizadas.

Apesar disso decidi pedir a redução ao estado laical deixando o sacerdócio com a grata satisfação do dever cumprido.

“Last but not least”: sobre estes assuntos da minha vida privada não voltarei a exercer direito de resposta ou de rectificação.”

Nota editorial

Breve anotação ao direito de resposta e de rectificação com o estrito fim de apontar inexactidões e erros de facto.

Em relação à frase “As mesmas [notícias] são fruto de fontes anónimas” (…) Denúncias e fontes “anónimas” e “próximas” valem o que valem”:

O trabalho do Observador sobre este caso não foi feito apenas com base em fontes “anónimas” e “próximas”, ao contrário do que o próprio Heitor Antunes tenta dar como certo. A fonte da principal suspeita — e também a mais grave — está claramente identificada: é o processo no qual o antigo pároco foi investigado, a propósito de uma denúncia que referia um outro caso, que também envolveria a existência de uma criança, mas nascida ainda de uma menor. Nesse processo, enquanto procuravam indícios da denúncia inicial, os inspetores esbarraram na existência de “Mariana”, uma mulher já adulta, mãe de uma criança registada no nome de Heitor Antunes — a tal catequista e alegada vítima da reportagem do Observador. Chamada também pela PJ, essa mulher foi clara: “Questionada, refere que manteve um relacionamento amoroso com Heitor Eduardo da Silva Antunes, à data pároco nas freguesias de Nogueira, Vilarinho dos Freires e Alvações de Corgo. Quando iniciou este relacionamento tinha catorze anos de idade”, escreveu a Polícia Judiciária.

Além disso, o trabalho conta com várias outras fontes identificadas — incluindo da diocese de Vila Real e do próprio bispo.

Em relação à frase “Uma denúncia anónima que também não o foi”:

O processo consultado pelo Observador foi aberto a partir de uma denúncia anónima recebida pela inspetora Sónia Machado. É na sequência dessa queixa que Heitor Antunes é chamado a prestar declarações na PJ. É certo que os investigadores sabiam quem tinha feito a denúncia, mas a queixa foi feita sob anonimato e a sua identidade nunca é referida no processo.

Mais importante do que isso: essa denúncia não se refere à história contada pelo Observador — a de uma relação que o padre terá começado com uma adolescente ainda menor e com quem, já adulta, teve um filho —, mas sim a um outro caso em que Heitor Antunes também teria tido uma criança de outra mulher, mas quando esta era ainda menor. Ao longo do direito de resposta, o ex-padre mistura várias vezes as duas histórias, como se se tratasse do mesmo caso, para, assim, apontar supostos erros dos jornalistas.

Em relação à frase “Uma ‘história iniciada em 2002’ que, afinal ‘Mariana’ não confirma”:

Heitor Antunes tenta fazer crer que a alegada vítima — referida pelo Observador com o nome fictício de “Mariana” — desmentiu a história publicada em fevereiro de 2019, o que não corresponde à verdade. No texto é dito de forma clara que “o Observador tentou falar com Mariana, que recusou prestar quaisquer declarações sobre o caso”. Não falar não é nem confirmar nem desmentir.

Mais à frente, Heitor Antunes cita uma parte do despacho de arquivamento para dizer que “a própria denunciante acaba por formalmente não assumir a denúncia inicialmente alvitrada”. Essa referência do procurador do Ministério Público não diz respeito, porém, a “Mariana”, a alegada vítima, como o ex-padre faz parecer, mas sim à pessoa que, não querendo ser identificada, fez a denúncia que deu origem ao processo (e que era relativa a um outro caso). Apesar de ter comunicado as suas suspeitas, a denunciante, como explica o magistrado, não quis assumir formalmente que o então padre teria abusado sexualmente de uma menor.

Em relação à frase “Existe denunciante identificada, que foi ouvida no inquérito, bem como as testemunhas que apresentou e que o inquérito foi arquivado, mas não por prescrição”:

A mesma confusão entre as duas pessoas e os dois casos diferentes é usada aqui de forma enganadora. Heitor Antunes diz que “facilmente se conclui que existe denunciante identificada, que foi ouvida no inquérito”, mas não há no processo qualquer indicação de que a pessoa que apresentou a denúncia inicial fosse a mulher com quem o ex-padre teve um filho, e que só foi encontrada pela PJ através de um pedido de informações ao Instituto de Registos e Notariado.

Além disso, no trabalho publicado em fevereiro de 2019 o Observador diz duas coisas: que o processo que investigou a denúncia de que Heitor Antunes tinha tido um filho de uma menor foi arquivado por falta de indícios; que o outro caso em que os inspetores esbarraram, ao encontrarem “Mariana”, não seguiu para julgamento porque já tinha prescrito.

Foi isso que efetivamente aconteceu, segundo o processo consultado pelo Observador.

Em relação à frase “Os autores da publicação dizem que consultaram o processo. Não creio”:

A consulta do processo pelos jornalistas do Observador foi feita no dia 7 de fevereiro de 2019, nas instalações do Ministério Público de Vila Real, que acedeu ao pedido de consulta feito por requerimento formal. Isso mesmo se percebe pelas várias referências ao processo que são feitas ao longo do trabalho contestado por Heitor Antunes.

Em relação à frase “Fala-se em ‘mistérios’ e ‘probabilidades’ próprios de quem se deita a adivinhar”:

No trabalho do Observador, em nenhum momento são referidas as palavras “mistério” ou “probabilidade”.

Em relação à frase “Houve uma investigação criminal que foi arquivada; houve uma investigação canónica que também foi arquivada”:

A investigação canónica, feita pela Igreja, foi arquivada, mas essa afirmação precisa de contexto e de informações que são omitidas por Heitor Antunes:

  • A investigação da Igreja foi aberta um dia depois da publicação da reportagem do Observador;
  • Enquanto decorreu essa investigação, e numa altura em que prestava serviço numa paróquia no Canadá, Heitor Antunes foi suspenso por ordem da diocese de Vila Real, que lhe ordenou que regressasse a Portugal;
  • Segundo o bispo de Vila Real, num email enviado ao Observador, o caso “já está concluído porque a pessoa em questão pediu a redução ao estado laical que já foi concedida pelo Papa Francisco”. Ou seja, o processo foi arquivado porque, entretanto, Heitor Antunes pediu para deixar de ser padre, antecipando-se ao fim da investigação, que seguramente determinaria o seu afastamento — é isso que a lei canónica prevê para estes casos de padres que têm filhos.

Esta nota editorial foi objeto de um direito de resposta que pode ler aqui.