Constança Braddell, a jovem de 24 anos que sofria de fibrose quística e que alertou o país para os problemas de acesso a um medicamento essencial para quem que sofre desta doença, morreu este domingo, após ter estado internada nos cuidados intensivos em estado muito grave nas últimas três semanas.
Em comunicado nas redes sociais, a família destaca que a jovem viveu “constantemente a sua vida com um admirável positivismo e entrega. Nunca tomou nada por garantido, apreciando cada momento da sua vida como se fosse o seu último”. “Constança Braddell tu és, e serás para sempre, a nossa maior guerreira. Nós amamos-te”, pode ainda ler-se.
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Há cerca de uma semana, a irmã da jovem, Vera Marques, contou ao Correio da Manhã e à SIC que o agravamento do estado de saúde de Constança resultou de um pneumotórax, que acontece quando o ar se escapa e fica entre os pulmões e a parede torácica, pressionando os órgãos e dificultando a respiração. Na altura, a família já tinha dito, nas redes sociais, que o quadro clínico era de “extrema gravidade” — e acabou por se revelar fatal.
Constança Braddell sofria de fibrose quística, uma doença rara e hereditária. Os sintomas da doença começaram a agravar-se desde setembro do ano passado — e, a partir daí, a vida da jovem mudou radicalmente. Num post das redes sociais, desabafou que estava a “morrer lentamente” e que perdeu 13 quilos no “espaço de três meses”, estando ligada a um ventilador não invasivo durante 24 horas. “Uma simples ida à casa de banho parece impossível. Uma simples chamada ao telefone deixa-me exausta”, relatava em março.
Apesar de não ser a “cura” para a doença, o medicamento Kaftrio/Trikafta podia melhorar o seu quadro clínico e dar-lhe mais qualidade de vida. No entanto, na altura, o Infarmed não tinha aprovado a utilização deste medicamento, o que fez Constança lançar um apelo que solidarizou as redes sociais. “Enquanto estiver viva, eu e todos os que realmente zelam por mim e pela minha sobrevivência iremos lutar incessantemente para que as autoridades competentes sejam capazes e tenham a decência de dar resposta”, afirmou.
Talvez aquela que foi a maior batalha da sua vida, e que pode acabar por ajudar 300 doentes que sofrem de fibrose quística em Portugal, acabou por ter um desfecho positivo. O Infarmed autorizou 14 pedidos de autorização especial — incluindo o seu — para a utilização de Kaftrio/Trikafta. No entanto, o medicamento ainda não está aprovado em Portugal, precisando sempre de haver um pedido à autoridade do medicamento.
A Constança mostrou ao mundo o significado de “Acreditar” e tornou-se numa inspiração para todos nós. Ela será e permanecerá sempre uma fonte de inspiração.
Aquela com o sorriso mais contagioso, que radiava energia e uma força de espírito inigualável”, lê-se nas redes sociais.
Inesperadamente, após “uma sucessão de complicações do ponto de vista clínico”, Constança necessitou novamente de ser internada. A fibrose quística, ainda para mais numa paciente que esteve seis meses a ser ventilada, pode deixar repercussões graves, como infeções pulmonares e a falência renal.
No caso da jovem, tratou-se de um pneumotórax, que consiste na inflamação, enfraquecimento e rutura da pleura, a membrana que reveste o espaço entre os pulmões e a parede torácica. Os doentes que sofrem de fibrose quística têm vários fatores de risco que podem levar a desenvolver este quadro clínico. Entre eles, contam-se a pressão mecânica associada à dificuldade em respirar, o ar que fica retido e faz dilatar os alvéolos pulmonares e as pequenas bolhas de ar que se formam entre os pulmões e pleura (e que podem rebentar).
“A evolução de um doente com fibrose quística é sempre imprevisível”, diz o pneumologista Carlos Robalo Cordeiro ao Observador. “O pneumotórax acontece subitamente”, afirma o diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. E o o agravamento da doença também pode ser “súbito e inesperado”, acrescenta. Isto porque, muitos destes doentes têm colónias permanentes de bactérias nos pulmões que, de um momento para o outro, podem causar uma infeção — que também é fator de risco para o pneumotórax.
O que pode explicar o agravamento súbito do estado de saúde de um doente com fibrose quística?
No final, a doença acabou por levar a melhor, mas Constança morreu com a sensação de que nos seus “últimos meses da sua vida feliz e esperançosa” conseguiu viver os “mais extraordinários últimos meses da sua vida”.