Numa altura em que várias entidades dinamizadoras de centros de vacinação em Portugal, incluindo câmaras municipais, preparam a desativação desses espaços, muitas outras não têm qualquer indicação sobre a hipotética transferência dos esforços de inoculação para os centros de saúde. Algumas, precisamente por não terem qualquer informação por parte das autoridades de saúde ou do Governo, estão mesmo a planear noutros espaços a realização de atividades que por norma decorrem nas infraestruturas transformadas em centros de vacinação.
Kiritkumar Bachu, presidente da Comunidade Hindu em Portugal que disponibilizou o Templo Hindu em Lisboa para o esforço de vacinação, confirmou ao Observador que não recebeu qualquer indicação para o desmantelamento daquele centro. Nem mesmo quando o templo foi colocado ao dispor das autoridades de saúde houve qualquer debate sobre uma data limite para a utilização daquele espaço. Tanto assim é que as atividades da comunidade se têm realizado noutro auditório; e mesmo o Festival de Nove Noites, que decorrerá em outubro em adoração à deusa Durga, está a ser organizado fora do templo e seguindo as regras da Direção-Geral da Saúde.
Na região Norte do país, na Póvoa de Varzim, o autarca Aires Pereira garantiu ao Observador que não recebeu qualquer contacto, seja do Governo ou das autoridades de saúde, para desmantelar o centro de vacinação a cargo da câmara municipal e transferir a responsabilidade para o centro de saúde. O presidente diz estar preparado para continuar a garantir o funcionamento do centro de vacinação se este tiver de continuar ativo para uma eventual distribuição de doses extra da vacina contra a Covid-19. Nem os mais de 250 mil euros gastos até agora em tendas, funcionários, pagamentos de horas extra, segurança e refrigeração para conservação das vacinas traz qualquer inconveniência para Aires Pereira.
Em Tomar, quando o pavilhão que servia as escolas durante o dia e os clubes e associações durante a noite foi transformado num centro de vacinação, a autarquia e as autoridades de saúde nunca discutiram a data em que o espaço voltaria a abrigar as atividades normais. E, desde então, a presidente Anabela Freitas também nunca recebeu qualquer comunicação relativamente à desativação dos centros de vacinação ou à passagem das inoculações para os centros de saúde.
Também Álvaro Azedo disse ao Observador que não tem qualquer “vislumbre do fim do centro de vacinação” em Moura, uma vez que não tem qualquer indicação nesse sentido das autoridades de saúde ou do Governo. O autarca explicou que a Proteção Civil continuará a prestar apoio ao centro de vacinação e que a feira que normalmente decorre naquele espaço em setembro acontecerá apenas ao ar livre, de acordo com as regras impostas pela Direção-Geral da Saúde.
Mas outras autarquias e dinamizadores de centros de vacinação já têm uma data no horizonte para o fim do modelo atual de inoculação e para a passagem do esforço para os centros de saúde: fim de setembro. O pavilhão Multiusos de Gondomar deve regressar à sua atividade regular nessa altura, exceto se alguma decisão acerca da toma da terceira dose obrigar o centro de vacinação a manter-se ativo. Em Matosinhos, após o terceiro fim de semana de setembro (altura em que serão administradas as segundas doses aos mais jovens), o esforço deve passar para os centros de saúde. Ambos os concelhos pertencem à Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte, tal como a Póvoa de Varzim.
Em declarações ao Público, fonte oficial da Câmara Municipal de Coimbra disse que a ARS do Centro — a mesma a que pertence Tomar — indicou o dia 30 de setembro como o último dia de funcionamento do centro de vacinação. A data foi colocada em cima da mesa no início de agosto, mas pode alterar-se (para mais cedo ou para mais tarde) conforme o ritmo de vacinação e quaisquer eventuais atualizações ao esquema vacinal aconselhado. A mesma data foi indicada à Câmara Municipal de Gaia.
“Há planos”, mas não “decisões” sobre o encerramento dos centros de vacinação
Os planos para o futuro dos centros de vacinação e da própria task force para a vacinação contra a Covid-19 entraram na ordem do dia depois de o vice-almirante Henrique Gouveia e Mela ter dito, na quinta-feira passada, que aqueles espaços seriam desmantelados, passando o esforço para as mãos dos centros de saúde, quando Portugal atingisse uma cobertura vacinal de 85%.
Em meados de setembro serão levantados os centros de vacinação e as vacinas passarão a ser administradas em centros de saúde. Assim, apelo aos portugueses para que se vacinem o mais rápido possível, porque o ritmo e a capacidade de vacinação são muito maiores neste momento”, disse o coordenador da task force em entrevista à RTP1.
No dia seguinte, na conferência de imprensa em que o Governo anunciou um alívio das medidas de restrição após o atingimento de 70% de população completamente vacinada em Portugal, a ministra Mariana Vieira da Silva sugeriu que não há certezas sobre o futuro dos centros, nem da task force: “Quando atingirmos os 85% [da população vacinada] e tivermos decisão sobre o futuro, veremos que passos devem ser dados, porque não se sabe qual a dimensão que o processo ainda terá pela frente nesta fase”.
Já esta terça-feira, em declarações aos jornalistas durante uma visita ao centro de vacinação de São João da Madeira, em Aveiro, Henrique Gouveia e Melo procurou esbater a contradição com as palavras da ministra: “há planos” sobre o que ocorrerá com o avanço do processo de vacinação, “mas não são decisões”. A terceira dose não será, no entanto, motivo para manter os centros em funcionamento:
Quando estamos a falar não do reforço geral, mas de coisas muito específicas, estamos a falar de 100 mil pessoas. Não há necessidade de ter toda esta capacidade para vacinar 100 mil pessoas. Isso pode ser feito perfeitamente nos centros de saúde. O que temos de acabar é este processo de emergência.
O Observador tentou contactar a Direção-Geral da Saúde, o Ministério da Saúde e a task force para a vacinação contra a Covid-19 para esclarecer como decorrerá a transferência do esforço vacinal dos centros de vacinação para os centros de saúde, nomeadamente tendo em conta as condições de armazenamento que as vacinas exigem e a logística associada à convocatória de utentes em contexto de centro de saúde sempre que um novo frasco é descongelado, mas não obteve respostas até à publicação deste artigo.