Doze clientes lesados pelo BPP estão esta segunda-feira a manifestar-se frente à comissão liquidatária do banco, em Lisboa, contra o arrastar do processo há 11 anos sem serem ressarcidos das perdas e acusando os gestores liquidatários de se quererem perpetuar.

Albina Loureiro foi uma das clientes que fez investimentos que o Banco Privado Português (BPP) designava de Retorno Absoluto. Recebeu parte do dinheiro investido através do ‘megafundo’ que os clientes criaram após a queda do banco, mas conta que nada recebeu da comissão liquidatária (que gere a massa falida do banco).

Em declarações à Lusa, a lesada criticou esta segunda-feira a falta de informação da comissão liquidatária, que desde 2018 não presta contas.

“Criam sempre dificuldades para prestarem contas e não respondem, nem presencialmente, nem a telefonemas, nem a cartas registadas”, afirmou, criticando ainda a postura dos gestores do banco em liquidação.

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“Não é gente competente, nem de boa-fé”, considerou.

Os lesados criticam ainda a falta de intervenção do Banco de Portugal, que foi quem nomeou a comissão liquidatária.

Avelino Carvalho disse à Lusa que tem a receber 700 mil euros e que nem a lista de credores a comissão liquidatária tem atualizada.

Artur Barreto, outros dos clientes lesados, estimou em 50 milhões de euros o valor que a comissão liquidatária já gastou em custos de gestão desde a sua criação e considera que aos gestores lhes interessa perpetuarem-se nos cargos, pois estão “há 11 anos com chorudos ordenados”.

Afirmou ainda que a Associação Privado Clientes, que organiza a manifestações desta segunda-feira, tentou falar com a comissão liquidatária, mas disseram que não os recebiam em dia de manifestação, remetendo para outro dia, ainda não marcado.

Ruy Ribeiro, presidente do Conselho Fiscal da Associação Privado Clientes, disse que depois desta manifestação seguir-se-ao mais protestos até obterem respostas.

Se um banco destes demora tanto tempo, um BES vai demorar 100 ou 200 anos a liquidar“, perguntou.

Segundo a Associação Privado Clientes, tanto quanto sabe, a comissão liquidatária tem em liquidez 700 milhões de euros vindos da massa falida do banco. A associação quer que pelo menos que uma parte do valor seja distribuído aos credores.

O colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas, verificou-se em 2010, já depois do caso BPN e antecedendo outros escândalos na banca portuguesa.

Apesar da sua pequena dimensão, o caso BPP teve importantes repercussões devido a potenciais efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira, emergindo como um caso de supervisão, pondo em causa a ação do Banco de Portugal.

Deu-se então início ao processo de liquidação, que ainda decorre. A Comissão Liquidatária do BPP, nomeada pelo Banco de Portugal, entrou em funções em maio de 2010, sendo então presidida por Luís Máximo dos Santos, o atual vice-governador do Banco de Portugal. Atualmente é presidida por Manuel Mendes Paulo, quadro do Banco de Portugal.

Apesar da intervenção do Estado (450 milhões de euros de garantia), o BPP não deverá significar custos para os cofres públicos uma vez que o Estado tem o estatuto de credor privilegiado.

Outros credores continuam à espera de ser ressarcidos.

Os clientes de retorno absoluto — que através do BPP investiam dinheiro em sociedades, prometendo o banco capital garantido e remuneração (como se fossem depósitos) — recuperaram partes dos investimentos após terem criado um ‘megafundo’ para gerir os seus ativos financeiros e cuja liquidação permitiu devolver-lhes parte do dinheiro.

Contudo, segundo a Associação Privado Clientes, dos 3.000 clientes de retorno absoluto cerca de 300 ainda nao receberam todo o valor investido, esperando a sua parte da massa falida.

Há também outros credores com dinheiro a haver, caso de depositantes acima 100 mil euros, assim como clientes que investiram em fundos de investimento e ‘hedge funds’.

Quanto à parte judicial, vários gestores do BPP têm sido condenados pelos tribunais e com penas pesadas, destacando-se o presidente João Rendeiro.

Em maio deste ano, o tribunal condenou Rendeiro a 10 anos de prisão efetiva. Já anteriormente, em outro processo também relacionado com o BPP, Rendeiro tinha sido condenado a cinco anos e oito meses de prisão efetiva.

Do lado dos supervisores, tanto Banco de Portugal como Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) aplicaram multas ao BPP e seus gestores.