Depois de 18 meses de pausa, os desfiles presenciais recomeçaram na Semana da Moda de Nova Iorque, que teve o seu momento de desfecho oficial esta segunda-feira com a Met Gala. Nomes sonantes voltaram a apresentar coleções em passerelle e novos nomes e outras marcas e jovens designers mostraram em que é que andaram a trabalhar nos últimos meses. Em cinco dias de puro espetáculo de moda, houve momentos marcantes que fizeram valer a espera pelo regresso aos eventos físicos: um deles foi o primeiro desfile de sempre a ter lugar no Empire State Building, com assinatura de LaQuan Smith, e outro foi o último desfile da NYFW que esteve nas mãos de Tom Ford e da coleção que trouxe de volta o glamour às ruas da cidade.

Collina Strada

Hillary Taymour, que assina as criações da marca Collina Strada, optou por apresentar a coleção num terraço do Brooklyn Grange, em Sunset Park, como mote para uma mensagem ambiental, isto porque os jardins de telhados reduzem tanto as emissões de gases com efeito de estufa como o escoamento das águas pluviais. Uns dias antes de apresentar a coleção, Hillary defendia que, depois de um ano de estagnação, todos deveríamos ter a liberdade de nos vestirmos como as rainhas que queremos ser. A abertura oficial da Semana da Moda de Nova Iorque esteve nas suas mãos, naquele que foi um desfile em que se celebrou a família, com avós e netas, mães e filhos a desfilarem na passerelle ajardinada.

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E apesar da habitual metamorfose de animais — veja-se o look de Kim Petras e da própria Taymour na Met Gala — presente nas suas coleções, desta vez a designer conseguiu encontrar um equilíbrio entre o mundo natural e o que nos rodeia, mais citadino. Camadas sobre camadas, cor sobre cor e meia dúzia de padrões vibrantes — foi disto que se fez a coleção da Collina Strada, um manifesto de extravagância campestre para usar na cidade. Calças cargo, saias midi drapeadas, vestidos volumosos, fatos de banho e até peças em crochet, tudo muito ligado à estética Y2K.

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LaQuan Smith

O designer originário de Queens limpou quaisquer dúvidas sobre se uma semana da moda voltaria a ser como dantes — a verdade é que neste regresso a sério aos desfiles presenciais, Smith recebeu as chaves do Empire State Building para servir de pano de fundo à sua apresentação. “Nova Iorque está de volta, querida”, disse o designer à Harper’s Bazaar. “Esta é uma época icónica e quando viemos de um ano de caos e loucura, penso que precisamos de continuar a encontrar formas de celebrar e elevar as pessoas”.

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A Vogue chamou-lhe “o local mais dramático da NYFW” e não mentiu, neste que foi o primeiro desfile do designer nova-iorquino desde que a pandemia começou. Nesta coleção escreveu uma carta de amor à sua cidade com peças que gritam festa e glamour, que gritam regresso à normalidade e à excentricidade de Nova Iorque, um desfile com brilho onde se vislumbraram acessórios de uma futura parceria com a Puma. Na passarelle, houve até uma versão atualizada do vestido que Hailey Bieber usou para se encontrar com o Presidente francês, até porque os espartilhos e vestidos recortados de Smith já se tornaram omnipresentes entre as celebridades. Nesta estação, acabou a introduzir outro tecido, o terrycloth, uma espécie de turco.

Peter Do

“Uma boa Pho é reduzida e editada a uma essência”, escreveu o designer na nota entregue a todos os convidados daquele que era o seu primeiro desfile de sempre. “É reconfortante e parece que está em casa… Bem-vindo à nossa casa”. O vietnamita Peter Do, emigrado já há vários anos nos EUA, lembrou a relação com o seu pai naquele que é um momento que marca a sua carreira e que foi um dos mais esperados da Semana da Moda. Peter Do, que se quer afirmar como asiático-americano, usa a palavra funcionalidade para descrever o seu trabalho de “tornar a vida mais fácil com boa aparência”, cita a Vogue. O minimalismo das suas criações é a peça chave à qual foi acrescentando camadas em alguns casos, e retirando noutros. Na passerelle surgem fatos e vestidos com paletas muito limitadas e suaves, mas com claros laivos de criatividade nos cortes, ajustes e proporções da alfaiataria. As malas exageradas foram o contraponto do minimalismo de uma marca que aponta com toda a força para um renascimento da moda e para as gerações mais jovens.

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Proenza Schouler

Assim que foi possível viajar, a dupla Lazaro Hernandez e Jack McCollough foram diretos para Kauai, uma ilha do Havai, a que chamam de “santuário”, segundo a Vogue. E os resultados acabaram por estar à vista numa coleção cujos tons vieram da natureza e o mergulho e o surf estavam espelhados na veia inspiracional das peças. Para apresentar a coleção escolherem o parque Little Island, um cais de betão com vista para o rio ao pôr do sol, para fazerem desfilar peças ready-to-wear que justificam um regresso ao trabalho em grande, desde os vestido assimétricos, as gabardinas fluídas, os fatos com cortes mais descontraídos e aquela cor tangerina que prendeu a atenção de todos. Muitas peças em preto que vão além do básico e franjas com fartura marcam os modelitos Proenza Schouler. Os mocassins e as sandálias com influência desportiva marcaram a passerelle, sinais de uma pandemia que faz o consumidor pedir cada vez mais por conforto em detrimento da alta moda. “São roupas alegres para sair de novo para o mundo”, remataram.

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Markarian

Graças a Jill Biden, a marca Markarian passou a estar debaixo de muitos mais olhos que dantes. Depois de ter apresentado a sua coleção através de um lookbook na estação passada, a designer Alexandra O’Neill estreou-se finalmente nas passerelles com as criações da sua autoria no Rainbow Room. Numa coleção romântica e delicada, Alexandra procurou apostar mais na roupa de noite que brilha e faz brilhar quem quer que a envergue, com muitas flores e pedras cintilantes que procuram refletir uma extrema feminilidade. O desfile abriu com dois vestidos com contas cor-de-rosa Barbie seguidos de todo o tipo de vestidos de brocado brilhantes, vestidos com espartilhos e outros minis, e alguns conjuntos com casacos, tudo com cortes que assentam na perfeição. O conforto pode estar longe desta visão feminina de O’Neill, mas a particularidade de cada peça dita que não sejam peças para todos os dias.

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Altuzarra

Um dos regressos mais esperados à cena nova-iorquina era o de Joseph Altuzarra, que em 2017 deixou a semana da moda de Nova Iorque para a de Paris. A sua aparição no calendário e a coleção que acabou por mostrar na sua terra natal arrancaram longos aplausos ao criador que definiu como “eclética e até com um toque escapista”. O designer revisitou o aclamado tingimento shibori — que já tinha aparecido na sua coleção em 2016 — com a diferença de que o tingimento foi feito desta vez em malha com peças moldáveis ao corpo e coloridas, numa corrente quase boémia. Acabou por juntar painéis de crochet à já afinada alfaiataria que marca o seu trabalho, como forma de mostrar que os coordenados tanto servem para trabalhar como para momentos de diversão after-work.

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Moschino

A chuva deixou marca num desfile que tinha algum significado para Jeremy Scott, mas acabou por ter a sua metáfora feita sem querer — para ninguém cair na passerelle foram precisos passos de bebé, não fosse este desfile um regresso à infância do designer. O desfile decorreu no Bryant Park, numa homenagem de Scott aos seus primeiros anos em Nova Iorque, nos anos 90, mas também à infância e ao conforto que essa época da vida traz às pessoas, num paralelismo ao conforto necessário após mais de um ano de pandemia. “Há também um piscar de olhos à [sitcom] The Nanny”, disse à Vogue. “Fran Drescher usava tanto Franco Moschino, pequenos fatos icónicos que eram a assinatura da marca e daquele momento”, lembrou Jeremy.

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O desfile marcou o regresso de Gigi Hadid às passerelles — ela que foi mãe recentemente — que abriu e fechou a apresentação de forma peculiar, com um biberon que era na verdade uma mala. A figura de mulher-bebé foi preconizada nestas criações através de uma alfaiataria que jogou com as texturas e os tecidos — desde os tweeds aos acolchoados — em tons neon e pastel com padrões a lembrar os brinquedos infantis, onde os animais ganham vida e formas extravagantes. São peças que, apesar de chamarem os motivos retro de um berçário, são tudo menos brincadeira de criança. O desfile contou também com a presença de Aaron Philip, com deficiência motora, que percorreu a passerelle na sua cadeira de rodas.

Khaite

A obscuridade na qual decorreu o desfile fez lembrar uma quaisquer catacumbas nova-iorquinas, escuras e húmidas — e apesar das críticas que recebeu de convidados e editores de moda que não conseguiam ver bem as peças, foi precisamente essa neblina e mistério que fizeram a magia nesta coleção de Khaite. A apresentação aconteceu nas entranhas de um edifício de apartamentos do Lower East Side, com pouca luz e muitas vinhas verdes selvagens a pender do teto, a subir pelas paredes e a rastejar no chão numa espécie de metáfora da resiliência e regeneração de Nova Iorque, ecoando uma coleção pensada para a mulher resiliente de Nova Iorque. Gigi Hadid abriu o desfile com um casaco acetinado, quase como se fosse um endredon, e a marcha continuou com peças muito vestíveis com couro preto, vestidos de camisa plissados, sacos gigantes, vestidos de malha, mini vestidos, bombers, tudo numa homenagem à bravura da cidade e da mulher.

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Carolina Herrera

Estava montado o salão de baile no que toca ao espaço, faltavam entrar as modelos para compor o cenário pensado para esta apresentação da marca Carolina Herrera, depois de alguns bloqueios pandémicos. O designer Wes Gordon decidiu voltar a focar-se nos vestidos de gala, muito a propósito do 40º aniversário da casa de moda, e só fez bem — de recordar que também Carrie Bradshaw irá usar muito Carolina Herrera no reboot que está por esta altura a ser filmado. Mangas em balão, caudas voluptuosas, vestidos afunilados, contrastes de cor e, claro, a famosa camisa branca da marca reinterpretada em várias criações, são uma amostra de uma Carolina Herrera de sempre, mas com cheiro a novo.

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Tom Ford

A semana da moda não podia ter fechado com maior brilho, em todos os sentidos literais da palavra — o regresso presencial terá até valido para voltarmos a ver Tom Ford a trabalhar o glamour como só ele sabe. Se lá fora as nuvens descarregavam cargas de água, na mezzanine do David H Koch Theater a chuva era de brilho e de cor, unidos para uma coleção exuberante e com uma veia de technicolor saliente. Gigi Hadid deu o mote com um brilhante casaco de cetim oversized e com umas calças e top cintilantes — era o início da chuva de lantejoulas que Tom Ford fez questão de levar ao limite. Trouxe de volta o icónico fato de veludo que desenhou para Gwyneth Paltrow durante a sua passagem na Gucci nos anos 90, desta vez em tons mais vibrantes como magenta e cobalto e um novo corte relaxado.

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O cetim e as lantejoulas foram os reis da noite, que competiram, às tantas, com o casaco de neoprene rosa fluorescente que surgiu na passerelle. “Instagram pode ser realmente o que salva a moda no final”, disse Tom Ford à Harper’s Bazaar, reconhecendo que hoje em dia as pessoas vestem-se com base numa vida curada que é apresentada nas redes sociais. Embora as formas e os cortes apresentados fosse descontraídos,  e até atléticos, estas não são roupas para ficar em casa, ou tampouco para passar despercebidas. Na banda sonora ouviu-se “Let The Sun Shine In” e o espetáculo não podia ter acabado melhor.