Será que afinal, na era da indústria 4.0 — ou Quarta Revolução Industrial, em que a produção de bens e a oferta de serviços assenta na automatização e na digitalização — há um risco de excesso de robots? A dúvida tem resposta do engenheiro e investigador Germano Veiga.

A robotização industrial “ainda apresenta muitas limitações” e “na maior parte dos cenários a introdução de robots necessita da colaboração de operadores” humanos, explica. “Estamos longe de chegar” a um cenário de robots em excesso. E no entanto é certo que “um dos caminhos a seguir” é o da robotização colaborativa, em que as empresas escolhem quais as tarefas em que o robot é melhor e aquelas em que os trabalhadores são melhores.

Germano Veiga, do Centro de Robótica Industrial e Sistemas Inteligentes do INESC TEC (Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência), no Porto, é um dos participantes do sétimo episódio do programa O Regresso da Indústria, a transmitir pela Rádio Observador na próxima quarta-feira, 20 de outubro. O tema são os níveis ideais de automatização nas fábricas. O outro convidado é o gestor João Xará, da Simoldes Plásticos, empresa com sede em Oliveira de Azeméis e unidades fabris em vários países europeus e da América Latina.

Em análise está o projeto-piloto ScalABLE 4.0, coordenado pelo INESC TEC e relacionado com a “adaptação dinâmica dos níveis de automatização às necessidades de produção”. O ScalABLE 4.0 é exemplo das parcerias possíveis entre a academia e o mundo real do trabalho. Iniciou-se em 2017 e terminou em junho de 2020, com financiamento da Comissão Europeia. Envolveu a Simoldes, como caso de estudo de défice de automatização (ou sub-automatização), e o grupo PSA (conhecido por fabricar automóveis Peugeot e Citroën), como caso de estudo de automatização excessiva, segundo Germano Veiga.

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A automatização excessiva, no caso das linhas de produção de motores na PSA, significava que, como o nível de robotização previa sempre a taxa máxima de produção, mas nem sempre essa taxa máxima se verificava, a empresa tinha necessidade de se adaptar às variações na atividade. “Pretendiam uma linha mais flexível, que permitisse ir introduzindo automatização, conjugando com os trabalhadores, de forma a diminuir o investimento inicial, sem perder produtividade”, explica o engenheiro do INESC TEC.

O caso da Simoldes Plásticos era inverso. O tipo de produção não permitia níveis de robotização muito elevados, pelo que foi necessário introduzir “robots colaborativos”, os quais permitem “otimização dos recursos”. Tratou-se de juntar equipamentos de produção (máquinas de injeção, por exemplo), com robots e operadores.

O tipo de produção da Simoldes Plásticos, diz João Xará, não justificava a introdução de robots tradicionais, muito rápidos e dominadores da produção. No âmbito do ScalABLE 4.0 chegou-se à ideia do “robot colaborativo”, isto é, “dotado de tecnologia, neste caso sensores, que permite desempenhar funções lado a lado com o ser humano, de forma segura”. “Fazem o chamado picking and packing, ou seja, pegar na peça que vem no tapete e colocá-la na embalagem”, pormenoriza.

O representante da Simoldes Plásticos refere-se ao ScalABLE 4.0 como “forma de aprendizagem e de partilha de conhecimentos”. “Estes projetos constituem uma alavanca para continuarmos a evoluir, a estar na vanguarda da nossa indústria e continuarmos a ser competitivos”, resume.

O receio por parte dos trabalhadores de que a introdução de robots leve a uma diminuição das necessidades de mão-de-obra e conduza as pessoas ao desemprego é uma das questões abordadas por João Xará. “Temos de ter sempre uma comunicação muito clara com os nossos colaboradores”, afirma. “Comunicarmos o porquê de o estarmos a fazer e quais as vantagens é importante, para os trabalhadores perceberem que as mudanças são para fazer crescer e evoluir a empresa e não para lhes tirar o posto de trabalho.”

As mudanças que o ScalABLE 4.0 implicou na Simoldes Plásticos começaram por ser um projeto-piloto e estão agora na fase da escalabilidade, ou crescimento. Segundo João Xará, os empregados podem passar para tarefas mais autónomas, relacionadas com a gestão de áreas de produção, e dedicar-se menos a tarefas repetitivas. Noutras áreas de negócio do grupo Simoldes já estão ser replicadas ideias exploradas através do ScalABLE 4.0, sublinha o mesmo responsável.

O Regresso da Indústria é uma série de programas que resulta de uma parceria entre a Rádio Observador e a COTEC Portugal – Associação Empresarial para a Inovação, num projecto co-financiado pelo COMPETE 2020, Portugal 2020 e União Europeia, através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional. Cada episódio é transmitido de 15 em 15 dias, às quartas-feiras, na Rádio Observador (nas frequências 93.7 e 98.7 em Lisboa, 98.4 no Porto e 88.1 em Aveiro) e pode depois ser escutado como podcast. Também às quartas-feiras é publicado quinzenalmente um artigo no Observador com o essencial do programa da semana anterior (com exceção do presente artigo, que diz respeito ao episódio que vai para o ar na próxima quarta, 20 de outubro).